A aguardada The Idol, nova série da HBO, chegou neste domingo, 4, para jogar no chão as expectativas de uma sucessora de qualidade para Succession. Após causar em Cannes e movimentar a crítica especializada, a exibição do primeiro episódio na TV salva apenas pelo desejo de um spin off.
A série é um dos temas mais comentados nas redes sociais no Brasil na manhã desta segunda-feira, 5. O alto interesse dos espectadores é inversamente proporcional à avaliação da maioria deles. A série explosiva se mostrou uma “bomba” (veja posts no final deste texto).
A minissérie de quatro capítulos é a aposta do canal para marcar a estreia do rebranding da plataforma de streaming Max nos EUA, e aponta a inauguração de um temido padrão para os fãs. Ao separar na internet a forte marca ‘HBO’, sinônimo de excelência, do serviço ‘Max’, estaria a rede aberta a conteúdos de menor quilate? Parece que sim.
A história da estrela da música Jocelyn (Lily-Rose Depp) é o pilar da trama - ou talvez sejam os mamilos dela, praticamente mais visíveis que os olhos da atriz na maior parte do tempo. No trajeto para reconquistar o título de maior e mais sexy pop star dos EUA, ela se envolve com Tedros (Abel “The Weeknd” Tesfaye). Isso a leva a um relacionamento turbulento e multissexual em meio ao submundo da música e das boates.
Do nada para lugar nenhum
The Idol quer satirizar a indústria pop, abusando dos clichês, mas faz isso pela via do drama. E não convence. Se sendo um programa de TV buscava entreter, o capítulo de estreia é tão tedioso quanto o mundo das celebridades em si.
O estereótipo da pop star em crise existencial, que perde a linha na balada e tenta se restabelecer na carreia após um colapso no passado é tratado com displicência e trivialidade. Não é poupada sequer uma menção direta a Britney Spears, o que culmina na declaração de alguém da equipe de Jocelyn de que “doença mental é sexy”.
A jovem é toda blasé, como se forçasse desinteresse, ou tivesse receio de se abrir e ser julgada por isso. Essa dualidade é ponto positivo para Lily-Rose. Mas, na piscina, o deboche - espera-se - de uma resposta finalmente arranca um riso de sarcasmo.
Tedros age como um coach barato. O que, na realidade, não está longe do que a personagem é. Dono de uma boate e líder de uma seita de tempos modernos, ele encontra a oportunidade perfeita de, aparentemente, manipular a jovem insegura, rica, talentosa e muito bonita.
A interpretação dele por Abel Tesfaye contrasta com a dedicação de Lily-Rose. Enquanto a herdeira de Johnny Depp faz o melhor que pode com o roteiro fraco, o texto artificial e a desnecessária própria superexposição, ele é caricato e entrega a performance da profundidade de uma piscina infantil.
A caracterização também não ajuda. A impressão é de que miraram Tedros como um magnata excêntrico, com traços de chefe de gangue exótico. Mas acabaram acertando num bicheiro barato. Tesfaye passa por presunçoso - o que respinga na própria imagem por ser ele mesmo um dos criadores do programa e produtor.
Quando ele chega pela primeira vez à casa de Jocelyn, a assistente dela Leia diz a ele para se sentir em casa. “Tem certeza?”, questiona o vigarista numa aura vampiresca, literalmente palitando os dentes. Como aquele que acaba de ser convidado a entrar e sugar a vida ali presente.
‘Nasce uma estrela’ de quinta
A dinâmica estabelecida entre os dois parece uma piada com Nasce Uma Estrela, cuja versão mais recente com Lady Gaga e Bradley Cooper está disponível no HBO Max. Mas ela falha ao retratar o relacionamento de mentor e prodígio em um cenário semipornô que faria os produtores de Emmanuelle se encolherem de constrangimento.
Jocelyn, por outro lado, poderia ser uma personagem interessante. Não fosse o mais puro clichê da gratuita sexualização feminina. É a alegoria perfeita do chamado ‘male gaze’, o olhar masculino sobre as mulheres - e sobre como elas se comportariam de acordo com o que os homens pensam delas.
Não surpreende, portanto, o abandono da primeira diretora, Amy Seimetz, mulher, quando o projeto já estava praticamente todo filmado. Por certo o resultado seria muito diferente com ela no comando, e talvez por isso a troca.
Até existe a tentativa de enquadrar Jocelyn como mulher empoderada e dona do próprio corpo, mas o argumento escorre na má construção do roteiro que deixa tudo muito desnecessário e descortina a única intenção real: tentar chocar.
Até a cena que fez o público de Cannes se escandalizar revela mais sobre o puritanismo dos expectadores que da série em si. Logo no início, uma foto de Jocelyn vaza, mostrando-a com um rastro de esperma no rosto. Apesar de ser o tema central dos primeiros minutos do episódio, a imagem fica uma fração de segundos na tela e, convenhamos, não é nenhuma novidade para o usuário de internet para quem a série parece ser feita.
Aliás, nem esse público ficou lá muito satisfeito. A menção a The Idol amanheceu nesta segunda-feira, 5, como 2º tema nos trending topics do Twitter, puxando cerca de 150 mil tuítes, de acordo com a plataforma Tweetdeck. Mas as reações não eram nem próximas de uma unanimidade elogiosa.
Os agregadores de críticas também não trouxeram ainda reações muito positivas para The Idol. No Rotten Tomatoes, a avaliação da audiência é de 52%, o que não é visto como bom resultado na plataforma. E o ‘tomatômetro’ é de apenas 25% - embora houvesse somente 16 avaliações até o fechamento deste texto.
No IMDb a classificação também não fica longe disso. A produção recebeu 5,1 estrelas de 10, com cerca de 1.500 avaliações concedidas. Havendo um certo equilíbrio polarizado: 36.4% das pessoas deram nota 10 e 33.5% deram nota 1, a mais baixa.
Spin off
A melhor parte da série até agora é de longe a equipe de Jocelyn - com exceção, obviamente, da atuação de Lily-Rose. Personagens muito bem definidos, com personalidades próprias e doses precisas de cinismo, comicidade, fraqueza e diversidade. Definitivamente, mereciam um spin off. Isso sim tem potencial de sucesso.
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