Quando um museu torna-se ponto turístico, pode a arte manter para o público, a sua função e seus objetivos? Podem os artistas e a sua arte transmitir mais do que se fossem uma publicidade de si próprios?
A glória era de Deus e não dos homens
No Ocidente, exceto durante um curto lapso de notoriedade individual na Grécia do século V a.C., os artistas foram fundamentalmente incógnitos até o fim da Idade Média. E nesses períodos - quando a arte era usada originalmente para a mágica e o ritual- a posição social do artista era a de artesão. A arte medieval não precisava de artistas individuais que almejassem a fama: a glória do que se conquistava era de Deus e não dos homens.
Em certas cidades italianas do século XIV já se pensava, no entanto, de forma diferente. Ali, juntar fortunas pessoais poderia representar uma glória muito maior, e o desejo de identificar e discutir o artista era, então, uma consequência natural. Grosso modo, foi essa a postura adotada pelos intelectuais do Renascimento, que estavam justamente providenciando os tijolos para a construção da ideologia do capitalismo.
Em vez de liberação, o anonimato tornou-se alienação
A progressão constante do artista meio-divino-meio-gênio culminou com o expressionismo na primeira metade do século XX e adquiriu uma feição de reprise tragicômica no neoexpressionismo dos anos 1980. Entre os dois expressionismos, o século passado viu a ascensão do intelectualismo na prática da arte. As primeiras manifestações podiam ser relacionadas à política de massa e as seguintes à cultura de massa. A diferença foi imensa.
Sabemos que o sistema capitalista sempre encontrou meios para impor a cultura "da conveniência e do espetáculo", de cima. De lá para cá, passando pela especulação no mundo financeiro, infelizmente, o anonimato, entre outras coisas, é mais um fator de alienação do que de liberação. No presente, o sistema da arte não funciona sem estrelas e o turismo também não.
Até a próxima que agora é hoje e se as instituições se derem a concessões perigosas como essa, será difícil continuarmos a repensar os objetivos da arte, seus valores em termos mais profundos e imateriais; ou, pelo menos, compreendê-la como uma resposta mais plausível à nossa nova época! Não basta trazer o público à arte, para efeito de bilheteria. É preciso primeiro, por meio da educação, levar a arte às pessoas, o que não ocorre automaticamente, por captação e bugigangas "atraindo turistas". Transmitir sem angariar: penso que é este o papel e o dever da instituição.
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