Montagem de peça de Bernard Shaw traz sátira sobre poder masculino e truques femininos

‘O Dilema do Médico’, que está em cartaz no Auditório do Masp montado pela Cia. Círculo de Atores, é uma sátira do dramaturgo irlandês

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Por Dirceu Alves Jr.

À frente da Cia. Círculo de Atores, o ator Sergio Mastropasqua aprofunda uma investigação em torno da obra do dramaturgo irlandês Bernard Shaw (1856-1950) pelo menos desde 2015, ano da estreia de O Homem do Destino.

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Na sequência vieram as montagens de A Milionária, A Profissão da Senhora Warren e 4004 a.C. - A Origem. E, antes de tudo isso, o começo de sua paixão pelo autor, o espetáculo Cândida, de 2008. “Shaw mexe com a hipocrisia social e bota o dedo em um senso de classe que está nos ossos das pessoas e do qual elas não conseguem se livrar”, justifica ele, que, em 2023, completa quatro décadas de carreira.

Por isso, o doutor Sir Colenso Ridgeon, um profissional que acredita ter descoberto a cura da tuberculose, é novo veículo para Mastropasqua levar ao espectador a chance de, pelo riso, refletir sobre uma sociedade mesquinha. Ele é o protagonista de O Dilema do Médico, tragicomédia escrita por Shaw em 1906 e nunca montada no Brasil - que, sob a direção de Clara Carvalho, estreou na sexta, dia 20, no Auditório do Masp. Além de Mastropasqua, o elenco conta com Iuri Saraiva, Bruna Guerin, Rogério Brito, Oswaldo Mendes e Renato Caldas, entre outros.

Bruna Garin e Sergio Mastropasqua como Jennifer e Ridgeon em ‘O Dilema do Médico’, de Bernard Shaw. Foto: Ronaldo Gutierrez

Impasse

Na Londres do começo do século passado, o doutor Colenso Ridgeon enfrenta o impasse de só poder aceitar mais um paciente na clínica em que testa um experimento contra a tuberculose. Na luta pela vaga aparecem Louis Dubedat (papel de Saraiva), um artista plástico de grande talento e caráter duvidoso, e o íntegro doutor Blenkinsop (Luti Angelelli), médico conhecido de Ridgeon, que nunca evoluiu na carreira. “Com essa discussão, vem à tona o desafio trágico de todo médico, que sempre pode perder para a morte, enquanto a arte, representada pelo pintor amoral, é eterna e sobrevive ao criador”, explica Clara sobre a peça, que define como “uma sátira médica divertida e oportuna”.

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Empoderada

Conhecido por personagens femininas empoderadas, Shaw, desta vez, apresenta a jovem e bela Jennifer (Bruna Guerin), mulher de Dubedat e patrocinadora do seu trabalho - uma marchande que até sofre com o temperamento do marido, mas sabe que seu talento pode aliviar seus defeitos. Tamanha assertividade logo encanta Ridgeon, que, na maturidade, repensa o pouco espaço que deu à vida sentimental. “Jennifer é uma personagem que me toca, porque tem a consciência de sua beleza, mas se sobrepõe ao marido pela inteligência e ausência de preconceitos”, diz a diretora.

Voz e rosto conhecidos do teatro musical, Bruna Guerin começa a marcar presença nas peças dramáticas e considera a mensagem de Jennifer tão contemporânea que nem parece ser parte de um texto que tem mais de um século. “Ela desafia o controle masculino e vai muito além, é uma empreendedora”, observa Bruna.

Nesse duelo entre a soberba dos médicos e o ego dos artistas, o espetáculo promete cativar o público. “Shaw desmascara as idealizações”, afirma Mastropasqua. Clara endossa: Ridgeon e Dubedat se acham “os donos da verdade”. O artista nem parece preocupar-se com a morte. “Sabe que seus quadros o manterão vivo para sempre”, finaliza.

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