O cantor e instrumentista paulistano Sami Bordokan, de 50 anos, leu o livro O Profeta, do escritor libanês Khalil Gibran (1883-1931), ainda na adolescência e recorreu a ele diversas vezes em busca de novas reflexões para seus conflitos pessoais e para os da humanidade.
O que o artista, filho de pai e mãe libaneses que chegaram ao Brasil na década de 1960, jamais imaginaria é que, um dia, ele próprio seria a voz para transmitir as palavras de Gibran a um grande público em uma peça teatral.
Desde junho de 2022 é assim. Diante de plateias lotadas, Bordokan protagoniza o espetáculo O Profeta, que estreou em Fortaleza, passou por Belém, Belo Horizonte, Rio de Janeiro e, pela segunda vez, cumpre temporada em São Paulo, agora no Teatro Bravos, em Pinheiros.
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Com dramaturgia da filósofa Lúcia Helena Galvão e direção de Luiz Antônio Rocha, a montagem é estruturada em 12 estágios poéticos em que são pregadas a simplicidade e a discussão em torno do amor, do trabalho, da aceitação e do processo de liberdade e autoconhecimento.
Na trama, All Mustafa está prestes a retornar à sua terra natal depois de oito anos de exílio em Orphalese e, pouco antes do embarque no navio, os habitantes da cidade começam a perguntar seus posicionamentos sobre a condição humana. O profeta, claro, não foge dos questionamentos.
“Nunca imaginei que uma história que conheci na adolescência fosse tão importante para esse diálogo contemporâneo em que vivemos”, comenta o artista, que, no palco, é acompanhado pelo multi-instrumentista William Bordokan, seu irmão.
Afinal, não é descartada a ideia de que de possamos enfrentar uma terceira guerra mundial, e a gente precisa entender como se equilibrar em meio a tantas disputas de poder.
Sami Bordokan
Bordokan é músico, toca alaúde desde os seis anos e passou a se apresentar publicamente aos 12, em uma rotina de estudos que consomem de quatro a oito horas diárias até hoje. O alaúde é o primeiro instrumento de cordas criado pelo homem nas antigas civilizações.
Começou com quatro cordas, cada uma representando um elemento da natureza – terra, ar, fogo e água – e, no século 10, teve uma quinta incorporada ao conjunto para significar a alma.
Entre os 17 e os 29 anos, Bordokan morou no Líbano, formou-se em musicologia oriental e jamais pensou em ser ator. “Eu fui para lá conhecer minhas raízes, vivenciar a minha língua, o árabe, e me descobri como ser humano”, diz.
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Em 2013, assinou a trilha sonora do espetáculo Salamaleque, protagonizado pela atriz Valéria Arbex, e, quatro anos depois, interpretou um personagem pela primeira vez. Ele viveu o imigrante libanês Talib na minissérie Dois Irmãos, dirigida por Luiz Fernando Carvalho para a Rede Globo com base no romance de Milton Hatoum, que tinha Luiz Antônio Rocha como diretor de elenco.
“Eu resisti muito em aceitar o convite e me vi na obrigação de estudar com profundidade dramaturgia e técnicas corporais, acabando apaixonado pela arte da interpretação”, justifica. “O trabalho de ator revelou-se uma experiência que expandiu o meu inconsciente e nunca pensei que poderia viver algo assim depois dos 40 anos.”
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Luiz Antônio Rocha, porém, confessa que Bordokan foi a sua quarta opção como protagonista de O Profeta, projeto que nasceu durante a pandemia. Conversou com ator libanês Mounir Maasri e chegou a sondar José Mayer e Jonas Bloch.
“Tinha uma intuição forte de que deveria ser um árabe, mas duvidei pelo fato de Bordokan não ser um ator experiente para enfrentar um monólogo”, revela o diretor. Rocha, no entanto, se impressiona com o resultado e acredita que ter trazido a música para o palco valorizou a encenação.
Além disso, Bordokan conhecia o livro de ponta a cabeça, aquilo faz parte de sua história de vida.
Luiz Antônio Rocha
Nas últimas temporadas, Rocha tem demonstrado uma sensibilidade rara não apenas para escalar elencos, mas para entender o que o público desejar ver nos palcos. Além de O Profeta, o diretor está na cidade com o solo Helena Blavatsky, A Voz do Silêncio, interpretado por Beth Zalcman, em cartaz no Teatro B32.
Ele promete estrear no fim de fevereiro mais duas montagens, Frida Kahlo, A Deusa Tehuana e Violeta Parra em Dez Cantos, ambas com a atriz Rose Germano, no Teatro Itália Bandeirantes. Todas os espetáculos, assim como O Profeta, promovem uma ponte entre a filosofia e a reflexão existencial.
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“Vivemos um tempo sem norte, de incertezas e, apesar da conexão da tecnologia, as pessoas perderam contato com o seu interior, buscam algo que as alimentem e o teatro traz essa simplicidade e o sagrado”, diz.
Serviço
- O Profeta, Teatro Bravos
- Endereço: Rua Coropé, 88, Pinheiros
- Quando: Sábado, 20h; domingo, 17h
- Quanto: R$ 70 a R$ 160
- Em cartaz: até 4 de fevereiro