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‘O Profeta’: Artista paulistano resgata no palco livro de Khalil Gibran que marcou sua juventude

Sami Bordokan, filho de imigrantes libaneses, tem quatro décadas de carreira musical, mas nunca havia se arriscado no teatro até ser escolhido pelo diretor Luiz Antônio Rocha para viver o protagonista da adaptação

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O cantor e instrumentista paulistano Sami Bordokan, de 50 anos, leu o livro O Profeta, do escritor libanês Khalil Gibran (1883-1931), ainda na adolescência e recorreu a ele diversas vezes em busca de novas reflexões para seus conflitos pessoais e para os da humanidade.

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O que o artista, filho de pai e mãe libaneses que chegaram ao Brasil na década de 1960, jamais imaginaria é que, um dia, ele próprio seria a voz para transmitir as palavras de Gibran a um grande público em uma peça teatral.

Desde junho de 2022 é assim. Diante de plateias lotadas, Bordokan protagoniza o espetáculo O Profeta, que estreou em Fortaleza, passou por Belém, Belo Horizonte, Rio de Janeiro e, pela segunda vez, cumpre temporada em São Paulo, agora no Teatro Bravos, em Pinheiros.

Peça 'O Profeta', com Sami Bordokan, fica em cartaz em SP até 4 de fevereiro. Foto: Jow Coutinho/Divulgação

Com dramaturgia da filósofa Lúcia Helena Galvão e direção de Luiz Antônio Rocha, a montagem é estruturada em 12 estágios poéticos em que são pregadas a simplicidade e a discussão em torno do amor, do trabalho, da aceitação e do processo de liberdade e autoconhecimento.

Na trama, All Mustafa está prestes a retornar à sua terra natal depois de oito anos de exílio em Orphalese e, pouco antes do embarque no navio, os habitantes da cidade começam a perguntar seus posicionamentos sobre a condição humana. O profeta, claro, não foge dos questionamentos.

“Nunca imaginei que uma história que conheci na adolescência fosse tão importante para esse diálogo contemporâneo em que vivemos”, comenta o artista, que, no palco, é acompanhado pelo multi-instrumentista William Bordokan, seu irmão.

Afinal, não é descartada a ideia de que de possamos enfrentar uma terceira guerra mundial, e a gente precisa entender como se equilibrar em meio a tantas disputas de poder.

Sami Bordokan

Bordokan é músico, toca alaúde desde os seis anos e passou a se apresentar publicamente aos 12, em uma rotina de estudos que consomem de quatro a oito horas diárias até hoje. O alaúde é o primeiro instrumento de cordas criado pelo homem nas antigas civilizações.

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Começou com quatro cordas, cada uma representando um elemento da natureza – terra, ar, fogo e água – e, no século 10, teve uma quinta incorporada ao conjunto para significar a alma.

Entre os 17 e os 29 anos, Bordokan morou no Líbano, formou-se em musicologia oriental e jamais pensou em ser ator. “Eu fui para lá conhecer minhas raízes, vivenciar a minha língua, o árabe, e me descobri como ser humano”, diz.

Sami Bordokan vive All Mustafa na peça 'O Profeta'. Foto: João Caldas Filho/Divulgação

Em 2013, assinou a trilha sonora do espetáculo Salamaleque, protagonizado pela atriz Valéria Arbex, e, quatro anos depois, interpretou um personagem pela primeira vez. Ele viveu o imigrante libanês Talib na minissérie Dois Irmãos, dirigida por Luiz Fernando Carvalho para a Rede Globo com base no romance de Milton Hatoum, que tinha Luiz Antônio Rocha como diretor de elenco.

“Eu resisti muito em aceitar o convite e me vi na obrigação de estudar com profundidade dramaturgia e técnicas corporais, acabando apaixonado pela arte da interpretação”, justifica. “O trabalho de ator revelou-se uma experiência que expandiu o meu inconsciente e nunca pensei que poderia viver algo assim depois dos 40 anos.”

Sami Bordokan leu o livro 'O Profeta', de Khalil Gibran, ainda na adolescência. Foto: João Athaíde/Divulgação

Luiz Antônio Rocha, porém, confessa que Bordokan foi a sua quarta opção como protagonista de O Profeta, projeto que nasceu durante a pandemia. Conversou com ator libanês Mounir Maasri e chegou a sondar José Mayer e Jonas Bloch.

“Tinha uma intuição forte de que deveria ser um árabe, mas duvidei pelo fato de Bordokan não ser um ator experiente para enfrentar um monólogo”, revela o diretor. Rocha, no entanto, se impressiona com o resultado e acredita que ter trazido a música para o palco valorizou a encenação.

Além disso, Bordokan conhecia o livro de ponta a cabeça, aquilo faz parte de sua história de vida.

Luiz Antônio Rocha

Nas últimas temporadas, Rocha tem demonstrado uma sensibilidade rara não apenas para escalar elencos, mas para entender o que o público desejar ver nos palcos. Além de O Profeta, o diretor está na cidade com o solo Helena Blavatsky, A Voz do Silêncio, interpretado por Beth Zalcman, em cartaz no Teatro B32.

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Ele promete estrear no fim de fevereiro mais duas montagens, Frida Kahlo, A Deusa Tehuana e Violeta Parra em Dez Cantos, ambas com a atriz Rose Germano, no Teatro Itália Bandeirantes. Todas os espetáculos, assim como O Profeta, promovem uma ponte entre a filosofia e a reflexão existencial.

'O Profeta' está em cartaz no Teatro Bravos, em Pinheiros, zona oeste de SP. Foto: Leekyung Kim/Divulgação

“Vivemos um tempo sem norte, de incertezas e, apesar da conexão da tecnologia, as pessoas perderam contato com o seu interior, buscam algo que as alimentem e o teatro traz essa simplicidade e o sagrado”, diz.

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