Estrelada por Gianecchini, peça 'Brilho Eterno' discute o amor pós-pandêmico

Espetáculo inspirado em uma desilusão amorosa mostra como o sentimento só se sustenta na liberdade

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Foto do author Ubiratan Brasil

Uma desilusão amorosa foi a inspiração para o diretor Jorge Farjalla criar seu mais atual projeto, a peça Brilho Eterno, em cartaz no Teatro Procópio Ferreira.

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“Foi algo dolorido e meu desejo na época, 2018, era apagar todas as lembranças que envolviam aquela pessoa”, conta ele, lembrando-se do filme Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças, dirigido por Michel Gondry em 2005.

No longa, Joel (Jim Carrey) e Clementine (Kate Winslet) vivem seus conflitos. Para resolvê-los, a moça resolve recorrer aos serviços de um profissional que apaga as lembranças dolorosas dos clientes. Desesperado, Joel procura fazer o mesmo, de modo a “deletar” Clementine de sua mente.

Cena da peça Brilho Eterno, dirigida por Jorge Farjalla. Foto: Priscila Prade

Na peça, Reynaldo Gianecchini vive Jesse, que gosta de Celine (Tainá Müller), mas a relação entre eles é marcada por intensidades diferentes, o que gera a descoberta de uma incompatibilidade – a necessidade de continuar sendo o mote da relação do casal, mas não a do amor dependente. “O conceito básico é semelhante ao do filme, ou seja, como se faz para apagar um grande amor, mas, à medida que o projeto se desenvolvia, novas questões foram surgindo”, conta o encenador, apontando a importância de Tainá nesse caminho mais esclarecedor.

Atualização

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Ao longo da preparação do espetáculo, a atriz trouxe questionamentos sobre relações humanas, sobretudo no mundo pós-pandemia. “O filme é de 2005 e traz o domínio da voz masculina”, observa ela. “Clementine é quase uma musa, um desejo de culto e sua principal característica libertária é o fato de ser uma mulher que bebe. Ou seja, um conceito feminino de liberdade que não se encaixa mais.”

As observações de Tainá produziram efeito – afinal, as relações afetivas atuais apontam para uma nova masculinidade, além de uma fluidez de gêneros e questões sobre a monogamia. “A pergunta é: o amor se sustenta na liberdade?”, questiona a atriz, no que é seguida pelo seu colega de palco. “O texto da peça trata do desgaste das relações, especialmente nesta fase pós-pandemia, ou seja, depois de um período de intimidade intensa que tanto provocou como dissolveu casamentos”, observa Gianecchini, que também é produtor do espetáculo.

Reynaldo Gianecchini e TaináMüller. Foto: Priscila Prade

A pandemia, aliás, serviu para Farjalla maturar o projeto – depois da decepção amorosa, ele começou a rascunhar o espetáculo, mas o trabalho foi interrompido pela mudança radical provocada no mundo pelo vírus da covid-19. “Quando a situação começou a melhorar e o Reynaldo me procurou em busca de uma nova peça, apresentei essa ideia e ele, para minha surpresa, aceitou de imediato.” Farjalla é um encanador inquieto, que busca sempre acrescentar elementos originais a seus espetáculos. Em Brilho Eterno, ele abandona momentaneamente o estilo barroco que marcou trabalhos anteriores (como Dorotéia, de 2017, Senhora dos Afogados, 2028, e O Mistério de Irma Vap, de 2019) para ressaltar a arte teatral. “Rompi, aqui, com as estruturas e criei um espetáculo que não é inteiramente realista.” De fato, ainda que a concepção de figurinos casuais (criados por ele) e objetos de cena remontem a um olhar mais realista, o diretor baseou-se na Caixa de Pandora para dar forma às suas criações. “Dali, saem desgraças, mas também sobra esperança”, comenta ele, apoiado pela cenografia de Rogério Falcão, que trava um diálogo com a luz desenhada por César Pivetti e a música original de Dan Maia.

A peça segue no Teatro Procópio Ferreira. Foto: Priscila Prade

Em sua disposição de homenagear o fazer teatral (“Especialmente nesse momento delicado, em que os artistas buscam se recompor depois da pandemia”), Farjalla expõe as entranhas do teatro, abolindo os bastidores. Também os atores manipulam o cenário, “fazendo a ação acontecer”. “O texto não é apresentado de forma cronológica e há momentos, como a dança cósmica, em que o som revela sua importância para narrar a história.” O filme de Michel Gondry passou a ser uma referência citada pelos personagens. “Mas a essência do longa está ali: um quebra-cabeça para ser montado pelo espectador seguindo sua sensibilidade”, diz Gianecchini. “Ao final, Jesse e Celine revelam-se duas pessoas machucadas e se encontram na carência”, define Tainá. 

SERVIÇO

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Brilho Eterno Teatro Procópio Ferreira. R. Augusta, 2.823. 6ª, 21h. Sáb., 17h e 21h. Dom., 18h. R$ 70 / R$ 180. Até 12/6

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