Morre Silvio Santos: empresário tentou ser presidente, prefeito e governador de SP, veja trajetória

Durante conturbada empreitada política, apresentador passou por três partidos nas eleições de 1988, 1989, 1990 e 1992, mas não chegou a seguir com a candidatura

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Foto do author André Carlos Zorzi
Atualização:

Entre o fim dos anos 1980 e o início dos 1990, o apresentador Silvio Santos expôs seu desejo de entrar para a política e, em ao menos por quatro ocasiões, por pouco não pôde ser votado pelos brasileiros como candidato em eleições. A tentativa mais conhecida ocorreu na disputa presidencial de 1989, vencida por Fernando Collor, mas o dono do SBT, que morreu na manhã deste sábado, 17, também se aproximou das urnas nas eleições para prefeito em São Paulo, em 1988 e 1992, e para governador de São Paulo, em 1990.

O apresentador de TV e dono do SBT, Silvio Santos, em campanha em 1989 Foto: Luiz Antônio Costa
Silvio Santos ensina aos eleitores de 1989 que, ao marcar o nome e número de Armando Corrêa na cédula, estaria votando em Silvio. Apesar de exibição no horário eleitoral, candidatura não foi para a frente Foto: Reprodução de campanha eleitoral do candidato Silvio Santos (PMB) em 1989

‘Não serei candidato’

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Por muitos anos, Silvio Santos sempre negou a intenção em virar político. Questionado pelo Estadão, em outubro de 1987, se já havia pensado em se tornar candidato a um cargo, Silvio respondeu: “Nunca! O Cunha Bueno até que queria. Ele era federal [entre 1951 e 1955 e entre 1959 e 1969], eu podia ser o estadual. Mas o Manoel da Nóbrega, que foi um pai para mim, tinha sido eleito deputado e aquilo foi uma decepção para ele, que prometeu muito, quis trabalhar, e não deixaram. Ele perdeu a liberdade, a credibilidade, e me deu esse conselho: ‘Nunca se meta em política’. Era meu pai adotivo, eu não tinha ninguém em São Paulo”.

No começo de 1988, em seu programa, abordou a possibilidade: “Deus queira que eu não entre na política e comece a fazer comício e a subir em palanque. Como já disse no jornal, se entrar em mim o demônio da política, vou ter condições de exorcizá-lo. Porque eu vou fazer com meu tempo disponível alguma coisa útil para a comunidade. Quem tem uma estação de televisão tem que fazer alguma coisa pela comunidade, senão, não tem condições de ser dono de televisão”. O discurso não durou muito tempo.

Em 1992, numa de suas filiações ao PFL, explicou que uma carta deixada na janela de sua casa alguns anos antes, aconselhando o apresentador a se dedicar à política, foi um dos motivos da mudança: “Até então, nunca havia pensado em me candidatar a qualquer cargo eletivo. Aquela carta fez alguma coisa mudar dentro de mim”.

Silvio oficializa vida política no PFL

A primeira filiação partidária de Silvio Santos ocorreu em março de 1988. Questionado sobre sua escolha pelo Partido da Frente Liberal, PFL (que mais tarde se tornou Democratas e hoje faz parte do União Brasil), Silvio chegou a responder a um repórter: “Foi o primeiro partido que me procurou. Eu assinaria a ficha de qualquer outro, mesmo que fosse do PT [Partido dos Trabalhadores] ou do PCB [Partido Comunista Brasileiro]”.

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Na ocasião, mostrou a jornalistas uma série de perguntas que teria encaminhado ao partido, muitas questionando fatores políticos, como a escolha de vice e o trato com vereadores e deputados. Entre elas, algumas curiosas como “O prefeito pode ir a Miami quando desejar e deixar o governo nas mãos do vice?”, “O prefeito pode falar sobre o que faz, durante todos os dias, na TV do prefeito? Ou o Ministério das Comunicações não deixa?” e “O partido vai me pedir dinheiro? Porque, se me pedir, eu saio nesta segunda-feira mesmo”.

Em 4 de abril de 1988, apareceu pela primeira vez no programa partidário do PFL exibido na cadeia nacional de rádio e TV. A emissora de Silvio chegou a comprar espaço de anúncio em página inteira de alguns jornais para dizer: “Hoje, às 8 e meia da noite, tem Silvio Santos no SBT, na Globo, na Record, na Bandeirantes, na Cultura e na Manchete.”

De acordo com documentos produzidos pelo SNI [Serviço Nacional de Informações] à época (hoje disponíveis no Arquivo Nacional), na ocasião “Silvio Santos defendeu a implantação de um programa social que abranja as áreas de ‘alimentação, saúde, aluguel e educação’, além de fazer um balanço da atual situação do trabalhador brasileiro, defendendo a melhoria de suas condições de trabalho”. A biografia A Fantástica História de Silvio Santos, de Arlindo Silva, lembra que sua presença dividiu opiniões dentro do partido por conta do grande tempo em que apareceu, além de ter falado mais como empresário do que como filiado ao PFL.

Silvio Santos em propaganda eleitoral de 1989 Foto: Acervo Estadão

Apoio de Jânio Quadros

Durante a exibição de seu programa, em 1988, Silvio Santos falou com o então prefeito de São Paulo, Jânio Quadros, ao vivo, por telefone. Questionando o ex-presidente sobre a possibilidade de se tornar candidato, ouviu como resposta: “Pouca gente deve conhecer essa cidade como o senhor. O senhor não é um político partidário, um político profissional. Isso vai representar um grande apelo ao povo, que está cansado dos políticos profissionais”.

O apresentador retribuiu os elogios a Jânio: “Um homem que respeito não porque é prefeito, não porque foi presidente, porque se ele não tivesse sido prefeito ou presidente da República, eu, se o conhecesse, o teria contratado para comentarista ou artista de televisão. Porque, na minha opinião, ele é um gênio”.

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1988 - Silvio Santos em busca da Prefeitura

Em 9 de maio, Silvio recebeu um pedido de Inocêncio Erbella, então presidente do diretório paulista do PFL para que participasse da convenção do partido no intuito de se tornar candidato a prefeito de São Paulo. O tempo passou e a indefinição de Silvio na disputa passou a chamar atenção. Em entrevista publicada em 12 de julho de 1988, Erbella comentou ao Estadão: “Silvio Santos sequer tem intenção de se lançar candidato a prefeito. Se quisesse mesmo, já teria, a essa altura, manifestado sua intenção ao partido”.

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Já Arthur Alves Pinto, então deputado estadual e dono de votações expressivas, à época tendo como aliados cerca de 80% dos delegados da convenção do PFL, se opunha fortemente à candidatura de Silvio. “É inviável para o partido, pois não conhece nada, nem a sede. Se for mesmo candidato, o PFL passa a ser apenas um cartório. Até acho que o Silvio poderia ser candidato do partido, mas ele tem atitudes atípicas para um candidato. Chego até mesmo a pensar que o que ele realmente quer é se candidatar a presidente da República”, explicava.

Arlindo Silva, assessor de Silvio Santos, dava o lado de seu patrão em meio à disputa: “Ele mandou carta ao PFL no dia 13 de junho onde deixava claro a sua intenção de se candidatar. Não mudou até agora. Continua reiterando os termos desta carta. É um candidato mais que excelente e já está eleito. Não precisa de grandes custos na campanha nem de verbas importantes, porque o público o conhece há 30 anos. Sua definição ainda é a mesma: ir à convenção e disputar”.

Mais tarde, naquele mesmo dia 12 de julho, Silvio Santos leu, ao vivo, em seu auditório, uma carta que tinha enviado ao PFL pouco antes: “Meus caros Inocêncio e Arthur, não faço concessões ou acordos que favoreçam interesses pessoais, políticos ou partidários. Faço acordos ou concessões que favoreçam o interesse do povo”.

“Para ler em meu programa uma bonita carta ‘estritamente sigilosa’, pediram que eu me filiasse ao partido e, 40 minutos depois, sem me consultar, lançaram-me candidato a prefeito de São Paulo pelo PFL. Fiquei surpreso, porque não era esta a minha intenção. Nunca me passou pela cabeça ser político. A princípio, fiquei entusiasmado, mas depois vi que na prefeitura de São Paulo eu não poderia trabalhar para dar melhores condições de alimentação, habitação, saúde e educação ao povo do Brasil”.

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“Meus amigos, minha mulher e minhas filhas, meus colegas e funcionários acham que eu deveria dizer não ao PFL, mas a minha intuição, a necessidade que sinto de ser grato ao povo que tem tido tanto carinho por mim, me obriga a dizer ao nobre deputado Inocêncio Erbella que aceito participar da convenção do partido e, se eleito democraticamente, pedirei a Deus que me ajude a ser um bom prefeito, principalmente para os mais carentes e os menos favorecidos”.

Erbella, porém, teria devolvido a carta em que Silvio propunha sua candidatura, por, segundo ele, conter “equívocos e inverdades”. Ele também afirmava que a carta havia sido entregue à sua esposa, quando não estava em casa, e não à sede do partido, como mandava o protocolo. Silvio fez uma viagem para os Estados Unidos, onde permaneceu por cerca de um mês, acompanhando a situação política de longe. O Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE) fez uma advertência a Silvio por “usar irregularmente o SBT, de sua propriedade, na campanha à Prefeitura de São Paulo”.

Com o PFL inclinado a apoiar a candidatura de Orestes Quércia, então no PMDB, não sobrava muito espaço para a candidatura do apresentador ser aprovada em convenção – somente dois importantes nomes do partido o apoiavam àquela altura, Miguel Colasuonno e Raphael Baldacci Filho. Diante da situação incerta e da necessidade de passar por tratamento devido a um problema nas cordas vocais, Silvio desistiu da candidatura.

Pelo PMB, Silvio Santos quis ser presidente em 1989

No ano seguinte, Silvio Santos almejou um voo mais alto: ser presidente do Brasil. Com a definição de Aureliano Chaves como candidato do PFL, o jeito foi pedir sua desfiliação do partido e migrar para o antigo PMB (Partido Municipalista Brasileiro), um dos partidos que se interessaram em abrigar o apresentador, em 31 de outubro de 1989. Faltando pouco mais de duas semanas para a eleição, ele ocuparia o lugar de Armando Corrêa, candidato da sigla que já vinha em campanha e tinha, inclusive, seu nome impresso nas cédulas de votação. O paraibano Marcondes Gadelha foi escolhido como vice na chapa.

O dono do SBT chegou a liderar algumas pesquisas de intenção de voto e tinha grandes chances de disputar o segundo turno contra Collor. Em 9 de novembro de 1989, o TSE analisou 17 pedidos de impugnação da candidatura de Silvio recebidos pelo tribunal – entre eles, um do PRN, sigla de Collor, que afirmava que o registro eleitoral do PMB estaria vencido desde o dia 15 de outubro daquele ano. Aristides Junqueira Alvarenga, procurador-geral da Justiça Eleitoral, apontava que o candidato não poderia concorrer pelo fato de ser dono de uma rede de televisão. A chapa foi indeferida e as intenções de Silvio adiadas novamente.

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Filiação ao PST e o governo do Estado

Pelo terceiro ano seguido, o dono do SBT foi atrás de sua entrada na política, visando disputar as eleições para um novo cargo: governador do Estado de São Paulo. Para tal, se filiou ao PST (Partido Social Trabalhista) em 2 de abril de 1990. Bem cotado em pesquisas de intenção de voto, o dono do SBT preferiu não se afastar de seus programas de TV, que representavam boa parte do faturamento da emissora.

Conforme consta em versão dada por sua assessoria de imprensa ao Jornal da Tarde em 20 de junho de 1990, “Silvio Santos absolutamente não é candidato, porque quer continuar fazendo seus programas na TV e não deve abandonar as suas empresas. Este não é um ano bom para ele fazer política. As empresas do Grupo têm 15 mil pessoas e ele não deve abandoná-las para ser candidato a governador”.

Retorno ao PFL e nova confusão para 1992

Em 18 de março de 1992, Silvio Santos se filiou novamente ao PFL, por influência de Marcondes Gadelha (ex-senador paraibano e seu vice na chapa de 1989), Hugo Napoleão (piauiense, então presidente do partido) e Edison Lobão (então governador do Maranhão). À época, especulava-se que ele poderia lançar-se como candidato a prefeito de São Paulo nas eleições de 1992. A possibilidade dividia opiniões.

“Se o PFL lançar candidato, não tem sentido mantermos o acordo que existe desde antes da minha eleição”, indicava o então governador paulista, Luiz Antônio Fleury, do PMDB, ao Estadão. Conforme consta na Nota Nº 00047/G1/CAC, elaborada pelo governo em 1992: “O presidente nacional do PDS, Paulo Maluf, ficou bastante aborrecido diante da possibilidade de Silvio Santos vir a ser o candidato do PFL à Prefeitura de São Paulo”. O documento ainda analisava: “Se levada a efeito, poderá dividir os votos do eleitorado contido no espectro político-ideológico de centro-direita, favorecendo a candidatura do senador Eduardo Suplicy, do PT”.

Dentro do partido também não havia uma unanimidade. Enquanto a direção nacional apoiava a candidatura de Silvio, o diretório regional de São Paulo buscava impedir que o apresentador concorresse, e alguns nomes do partido chegaram a recomendar que delegados da sigla parassem de se reunir com o apresentador. Em determinado momento, fez-se uma intervenção na seção regional do partido, abrindo-se uma disputa jurídica, e uma liminar obtida junto ao TRE anulou a legalidade de uma convenção realizada. Ao fim das contas, o partido acabou sem candidato na capital paulista nas eleições de 1992.

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Conforme consta no Estadão de 25 de junho de 1992: “A convenção do PFL para a escolha do candidato a prefeito da Capital, ontem, marcada pelos interventores, virou um festival de cadeiradas e pancadarias, recolheu feridos leves e vai acabar mesmo na Justiça. Tudo começou quando o advogado dos interventores, Ernani Gurgel, anunciou que os eleitores seriam os mesmos da primeira convenção, realizada dia 31 de maio e que indicou o deputado federal Arnaldo Faria de Sá como candidato. Gurgel acatou a liminar do TRE garantindo o posto aos mesmos delegados, mas eles teriam de votar em apenas uma chapa inscrita e nela constava, unicamente, o nome do empresário e animador Silvio Santos”.

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