“Um dos mais populares - senão o mais popular - animador do rádio e da TV de São Paulo chama-se Silvio Santos. O rapaz tem uma enorme afinidade com as grandes plateias, que sempre prestigiaram e continuam prestigiando os seus programas”. O trecho poderia ser recente, mas remete à reportagem “São Paulo tem campeão de simpatia: Silvio Santos”, publicada na Revista do Rádio nº 807, de 6 de março de 1965.
Nas fotos ilustrando a matéria, o “rapaz”, então com 34 anos, aparecia sempre sorrindo, usando terno e com o microfone (ainda em modelo antigo) acoplado ao paletó. Numa das fotos, simulava ser o operador de câmera, na outra, aparecia ao lado de uma moça sorridente e, por fim, ao lado de três homens cortando o cabelo no palco, em quadro descrito como “raspagem do couro cabeludo de artistas”.
Uma mostra de como, ao longo das décadas, Silvio Santos fez história na TV brasileira, seja por fazer o ‘mesmo de sempre’ com maestria ou por suas apostas certeiras.
Silvio Santos e a TV brasileira
Após trabalhar na rádio e ter feito sua estreia na TV em 1961, no programa Vamos Brincar de Forca, o apresentador conquistou sua própria atração em 3 de junho de 1963, ocasião em que o Programa Silvio Santos foi ao ar pela primeira vez. À época, aproveitou um espaço vazio na programação de domingo da TV Paulista, amparado pelas publicidades de seu Baú da Felicidade. Mora aí um de seus grandes diferenciais: a conciliação entre a carreira em frente às câmeras com o seu lado empresário.
O ponto mais revolucionário da carreira de Silvio Santos se deu quando se tornou dono da própria emissora de televisão, hoje o SBT. Em geral, quando se pensava em quem comandava os canais, de fato, remetia-se sempre a nomes dos bastidores, como Assis Chateaubriand (Tupi), Roberto Marinho (Globo) e Paulo Machado de Carvalho (Record). Com Silvio, a pessoa que estava ali, diante do público num auditório lotado e conversando diretamente com o telespectador, era também quem dava as cartas.
A TV concedida ao artista
Foi durante a ditadura militar (1964-1985) que fez suas primeiras tentativas para conquistar uma concessão de emissora. No início dos anos 1970, buscou a que pertencia à TV Excelsior, de São Paulo, cassada em 1970. “Não ganhei a concorrência, mas acredito que muita gente do governo, que conheceu o nosso projeto, e que não entendia muito bem o Silvio Santos, passou a perceber que, além de um animador de auditório, eu era um empresário muito bem estruturado”, dizia, à época, conforme sua biografia.
Foi após algumas mudanças no governo federal em 1974 (saiu Médici para a entrada de Geisel, assim como o ministério das Comunicações passou das mãos de Higino Corsetti para Euclides Quandt de Oliveira) que o apresentador tentaria nova investida. Em 22 de outubro de 1975 foi assinado o decreto nº 76.488, que outorgava a concessão à TV Studios Silvio Santos Ltda. como canal 11 do Rio de Janeiro.
“Demonstrei ao pessoal do governo que, no palco, sou um animador, mas que minha verdadeira personalidade não sofre qualquer tipo de influência do personagem vivido em cena. No palco sou um ator, que vive as circunstâncias que envolvem o artista, mas quando acaba o palco sou um empresário como outro qualquer. Acho que eles se surpreenderam comigo como homem de negócios, e aí passaram a acreditar que eu poderia ter um canal de televisão”, opinava Silvio.
Manoel de Nóbrega, comunicador e amigo de longa data de Silvio, foi apontado como superintendente da nova emissora. Já em estado de saúde bastante debilitado (morreria dali a três meses), tratava-se um cargo simbólico, mas que lhe permitiu participar da cerimônia que oficializou as assinaturas da concessão em dezembro daquele ano. Foi de seu discurso a frase mais emblemática daquele dia: “É a primeira vez na história brasileira que um canal de televisão é dado a um punhado de artistas brasileiros”.
As apostas de Silvio Santos
Ao longo dos anos, Silvio também proporcionou formatos considerados inovadores na TV brasileira - ainda que muitos deles já fizessem sucesso lá fora - ou fez apostas que outras emissoras hesitaram em bancar.
Para ficar apenas em alguns exemplos: em 1984, com a aquisição dos direitos de exibir o seriado Chaves, que marcou gerações e ficou décadas indo ao ar pelo canal.
Em 1987, permitiu ao humorista Jô Soares que investisse num programa de entrevistas formato late show, que rendeu o bem-sucedido Jô Soares Onze e Meia (posteriormente continuado pelo Programa do Jô, na Globo).
Em um capítulo que revela seus lados de artista e de empresário, lançou em 2001 o primeiro reality show de sucesso no Brasil, a Casa dos Artistas. O programa chegou a ter sua exibição impedida por liminar na Justiça, após acusações de plágio do formato do Big Brother Brasil, licenciado pela Globo, e vitórias na audiência sobre o Fantástico.
Correções
Diferentemente do informado na versão original do texto, a exibição da Casa dos Artistas foi em 2001
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