Que outro jornalista teria o privilégio de ser interpretado por dois astros como Jason Robards e Tom Hanks? Só mesmo Ben Bradlee, personagem de Todos os Homens do Presidente, de Alan Pakula, e do recente The Post - A Guerra Secreta, que concorre ao Oscar no dia 4 de março. Benjamin Crowninshield Bradlee (1921-2014) foi mesmo uma figuraça, como se pode comprovar no documentário O Homem do Jornal: A Vida de Ben Bradlee, de John Maggio (na HBO).
+++ 'The Post' é defesa da liberdade, da ética e do poder feminino De família e porte aristocráticos, o jovem Bradlee foi formado na cultura puritana de Boston. Ele mesmo diz que se casou com a primeira moça que namorou. Teve poliomielite na infância, superou-se, virou atleta, esteve na guerra, acumulou experiência e retornou são e salvo aos Estados Unidos. Então tirou a sorte grande ao ser convidado como correspondente da revista Newsweek em Paris.+++ Casa Branca homenageia ex-editor do 'Post'
Paris é sempre uma festa de civilização para quem sabe aproveitá-la. Ainda mais a Paris do pós-guerra, quando Sartre, Simone de Beauvoir e Marcel Camus podiam ser encontrados nos cabarés ouvindo Juliette Gréco. O jovem Bradlee voltou da Europa mais culto e mais aberto. Regressou também com esposa nova, que conhecera nos embalos tanto da Rive Gauche quanto da Rive Droite. +++ Meryl Streep e Tom Hanks falam sobre 'The Post - A Guerra Secreta' O filme o mostra na vida mundana e deliciosa dos anos de ouro, em festas, flertando com as damas e cultivando amizade íntima com os Kennedys. Mesmo depois de John Kennedy ser eleito, a intimidade continuou, apesar de o priápico presidente dar em cima da esposa do amigo de um jeito que, hoje, lhe custaria processo por assédio. +++ Em 'The Post', Meryl Streep é a Mulher-Maravilha de Steven Spielberg
A celebridade de Bradlee vem de duas coberturas sensacionais bancadas por ele no tempo em que era editor do The Washington Post. A divulgação dos Papéis do Pentágono abalou o governo de Richard Nixon e o Caso Watergate acabou por derrubá-lo. Os casos são narrados pelo próprio Bradlee e também por seus protagonistas, os repórteres vedetes Bob Woodward e Carl Berstein. O próprio Henry Kissinger, então secretário de Estado, vem dar seu pitaco.
O documentário aborda as diversas facetas de Bradlee, do sedutor ao implacável homem de jornal, em estado permanente de “busca da verdade”. Ouvimos tudo de sua própria voz: do seu grande êxito nos dois momentos maiores de sua carreira ao ponto mais baixo, quando o Post publicou uma série de reportagens indicada para o Pulitzer que, comprovou-se, haviam sido forjadas pela repórter. Do limão azedo, o Post fez uma limonada pouco usual na imprensa: assumiu o engano em matéria de capa seguida de quatro páginas internas. Um exemplo de transparência.
No sucesso como na queda, Bradlee comportou-se com elegância, como parece dizer este belo documentário sobre um jornalista old school que, soldado exemplar, fez muito mais do que exigia o seu dever.
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