A carreira de Paolla Oliveira é marcada por personagens fortes. Mesmo quando a atriz deu vida a mocinhas sofredoras - e olha que isso, na maioria das vezes, é pura redundância -, elas podiam ser enganadas, se acabar em lágrimas e soluços, como Paloma, na novela Amor à Vida, mas seguiam em frente. E o que dizer então das mais ousadas, como a prostituta Danny Bond, na minissérie Felizes Para Sempre?, ou das vilãs, como Melissa, no folhetim Além do Tempo? Agora, interpretando Jeiza na novela das 9 A Força do Querer, a personalidade destemida de sua heroína vem acompanhada de força física também.
Para viver a policial e lutadora de MMA na trama de Glória Perez, a atriz paulistana, de 35 anos, se submeteu a uma rotina intensa de treinos, quatro vezes por semana, poucos meses antes de as gravações terem início. “Comecei a treinar no fim de outubro, e fiz minha primeira cena em dezembro. Então, tive pouco tempo de treino. Como lutadora, sou uma ótima atriz (risos)”, brinca Paolla, em entrevista ao Estado, por telefone, do Rio.
A atriz ameniza o que se fala sobre seu corpo e a transformação pelo qual ele teria passado para esse papel. “Sempre fui vista como uma pessoa que tem mais curvas. Sempre tive músculo, e agora meus músculos estão a meu favor. Minha composição corporal, que é mais musculosa, está a meu favor. Aí junta que eu emagreci um pouco, estou treinando bastante. Acho que mais do que tudo foi: o meu corpo se encaixou.”
E o quanto ela conhecia de MMA antes da novela? “Eu conhecia um pouco, gosto muito de esporte. Eu não entendia muito o que era MMA, acho que as dúvidas que muita gente tem eu também tinha”, diz. “Mas eu assistia, sabia o que era UFC, sabia que o MMA era diferente porque juntava muitas técnicas. Não sabia exatamente do que se tratava nem as técnicas que existiam ali. Então, separei na minha cabeça o jiu-jítsu do boxe, do muay thai. Separei elas, aprendi um pouco de cada uma e aí, sim, entendi como funcionam juntas, e aí se transforma no MMA. Não sou uma expert hoje, mas entendi a evolução delas todas.”
No fim de semana passado, a atriz gravou cenas de sua personagem enfrentando no octógono a lutadora (real) Poliana Botelho durante evento de UFC no Rio. Como lutadora, é o ápice para Jeiza. “Luto com a Poliana, são cenas que vão ao ar mais para frente. A Jeiza batalha, treina, até chegar ao UFC. Ela chega a esse posto, nessa posição de estar pela primeira vez no UFC. Foi legal porque a chegada dela foi de verdade.”
Paralelamente aos treinos, Paolla se dedicou ainda à porção policial de sua personagem. Com uma boa dose de vantagem em relação à lutadora: o pai da atriz é policial militar aposentado. E, quando ela soube que sua policial teria um cão como parceiro, era algo com que já estava habituada - e não é só porque ela tem cães e é apaixonada por animais.
“Meu pai comandou o canil de São Paulo. No fim de semana, era um passeio para gente. Eu e meus irmãos íamos lá ver aquelas apresentações”, conta. “A primeira coisa que fiz foi ir para o BAC (Batalhão de Ações com Cães), como se fosse o canil de São Paulo, e eles me receberam bem, tive uma palestra em que, por exemplo, aprendi que a gente não trata por cachorro, a gente trata por cão, a coleira é guia. Peguei termos técnicos lá, levei os termos que eu já conhecia por conta da minha família. Pedi para Glória (Perez) para encaixar esses termos. Ela disse: ‘Está liberado’. Acho que tudo isso dá credibilidade se você quer mostrar uma classe, uma realidade.” Com tanto empenho, Paolla tem agradado não só ao público em geral, mas também à sua audiência mais crítica: o próprio pai. “Ele está feliz de assistir, diz: ‘Está direitinho’. Sem querer, a ajuda, ele me deu durante anos, o que eu ouvia ele falar, eu via ele ser severo e enérgico com todo mundo, mas também era brincalhão. Por sorte, ele está gostando, mas, se não estiver bom, ele fala.”
É esse exemplo do pai policial, que ela cresceu admirando, que a atriz carrega em sua própria caracterização. “A Jeiza é bom caráter, boa filha. É a oportunidade que a gente tem de mostrar um bom caráter que não seja bobo como as pessoas esperam - porque bom caráter virou sinônimo de ser bobo e acho que não é isso. Ela tem sentimentos e é uma boa profissional. Esse policial existe e é essa classe que eu quero representar. Quando eu faço a Jeiza, faço para uma classe, que, como qualquer outra profissão, tem profissionais bons e ruins. A gente resolveu contar a história de um profissional que a gente espera ver na vida.”
Assédio. Assim como outras personagens femininas, como a Ritinha de Isis Valverde e a Bibi de Juliana Paes, a Jeiza de Paolla Oliveira tem crescido dentro da trama. Ela é apaixonada por Zeca (Marco Pigossi), com quem vive às turras, e tem protagonizado cenas importantes, como quando fez o parto de Ritinha (ex-namorada de Zeca) dentro de um táxi, em meio a um tiroteio, enquanto comandava uma operação policial. A cena emocionou o público - e as próprias atrizes. E a trama caminha para um embate futuro entre Jeiza e Bibi, que vai virar criminosa. “Acho que a dramaturgia vai mudando, de acordo com o público, com o movimento da vida. Acho que, de uns tempos para cá, vem se pedindo personagens mais fortes femininos. Teve o momento das mocinhas mais românticas, e agora o público está pedindo novos heróis, e esses novos heróis talvez não tenham só uma cara, por isso que a Jeiza briga com a mãe, é meio desbocada, briga com o Zeca. Aí vem uma Ritinha, que é um personagem bastante delicado.”
Não faz muito tempo, Paolla chamou atenção por outro papel, o da Danny Bond, na minissérie Felizes Para Sempre?, em 2015 - pela atuação cheia de nuances e pela cena da janela, em que aparece de costas, de fio dental. A repercussão na internet foi avassaladora. Ela conta que se assustou “um pouquinho” com aquela reação, mas que depois se divertiu. “A nudez faz parte da gente. No caso da Danny Bond, ela está se exibindo ali, era uma prostituta. A partir do momento que ela (a nudez) conta história, ela não me incomoda. Acho que o nosso corpo está em função do nosso trabalho.”
Paolla Oliveira diz que é feminista e gosta de falar “em igualdade, porque a gente eleva o tema ainda mais”. “O feminismo é igual à igualdade, porém, quando fala em igualdade, a gente pode colocar outras tantas coisas: que seja igual em credo, raça, gênero. Eu realmente não consigo admitir uma pessoa nos tempos de hoje, em que se fala tanto sobre feminismo e em que é tão clara a busca das mulheres, não se colocar nessa posição.”
A atriz conta ainda que nunca foi vítima de assédio sexual. Mas o assunto está em seu radar. Acredita que tudo começa quando “a gente fala, se expõe, torna algo possível de ser resolvido”. “Por isso, é tão importante a gente falar da voz feminina, uma voz que foi calada por um tempo. Como uma coisa pode ser resolvida se ela não se mostra? A caminhada é longa ainda, e passa pelos nossos homens, passa por pais e mães que educam”, observa. “Quando a gente fala de feminismo, é tão abrangente, envolve homens também, educação, muitas coisas. Quando você levanta o debate, você educa para todos os fins, ou se identifica, e vai provavelmente discutir com outras pessoas.”
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.