Depois de muitos anos, o Linha Direta voltou, e fazendo barulho. Até agora, foram três episódios.
A estreia relembrou o Caso Eloá, sequestro com intensa cobertura midiática à época, evocando críticas nas redes sociais às apresentadoras Sonia Abrão e Ana Hickmann pela condução do caso ao vivo.
Mais recentemente, o caso Henry Borel, que mesmo envolvendo um vereador acusado de assassinar uma criança, conseguiu chamar atenção por uma disputa judicial: no dia da exibição, o STF derrubou liminar de uma juíza que impedia a exibição alegando que o Linha Direta poderia “influenciar a opinião pública”, uma vez que o caso vai a júri popular.
Entre eles, um caso que talvez tenha tido menor repercussão à época, mas é igualmente pesado, sobre a barbárie de Queimadas, que retratou uma festa de aniversário no interior da Paraíba que desembocou numa sessão de estupro coletivo e mortes.
Novo Linha Direta veio para ficar?
Ainda que com uma fórmula de ‘mais do mesmo’, o novo Linha Direta até o momento tem tudo para dar certo. Pedro Bial ‘casou’ com o estilo do programa, e sabe conduzir bem as entrevistas e narrações. A tecnologia depois de 2007 parece permitir uma maior quantidade de informações: imagens gravadas em celular, histórico de troca de mensagens, e por aí vai.
A imprensa aponta dados de audiência que parecem satisfatórios, mas mais do que olhar apenas para estes números, é importante reparar em como o programa tem movimentado as redes sociais e trazido temas importantes novamente à tona.
Com apenas três episódios até agora, talvez seja cedo para cravar qualquer coisa. Mas, se fosse para apostar, o programa parece mais propenso a ter uma série de novas temporadas, tal como ocorreu com a Escolinha do Professor Raimundo, do que de ser um projeto de uma só temporada, como foram os ‘novos’ Trapalhões.
As diferenças do novo Linha Direta
Já há material para comparar o novo Linha Direta com a versão anterior do programa - desconsiderando aqui a original, exibida entre março e julho de 1990, conduzida por Helio Costa. Isso porque a mais ‘fresca’ na mente dos telespectadores foi aquela exibida entre maio de 1999 e dezembro de 2007, comandada por nomes como Marcelo Rezende, Carlos Dornelles e Domingos Meirelles.
Desta vez, Pedro Bial ficou a cargo da apresentação, além de participar da redação final do programa. Sua condução tem algumas particularidades: num grande galpão, age como se estivesse elaborando uma investigação, com fotos e informações escritas em papel penduradas com alfinetes num painel. O ambiente tenta lembrar mais o escritório de um detetive do que um programa de TV propriamente dito, como costumava ser.
Algumas nomes que são peças-chave de cada caso são entrevistados pelo próprio Bial, algo que Rezende e Meirelles faziam mais em outros jornalísticos do que no Linha Direta. O apresentador busca uma abordagem humana e respeitosa ao falar dos crimes, e faz também a maior parte das narrações - antes, era comum um locutor profissional (como Márcio Seixas) fazendo essa parte, além do apresentador no estúdio.
Atenção redobrada
Outro ponto chama atenção é a necessidade de atenção do espectador. Além da ‘batalha’ de versões, que nos obriga a ficar atento em quem defende cada advogado entrevistado, é preciso ler a legenda que passa durante as simulações para entender a que ela se refere: é a versão de quem acusa, de quem está sendo acusado, de uma testemunha, do Ministério Público... Não há muito o que se fazer sobre isso, mas em tempos de espectadores que usam “duas telas” simultaneamente, muitas vezes assistindo na TV e fazendo outra coisa no celular, computador ou tablet, é algo que pode causar confusão.
Apesar da pose dar a entender isso de vez em quando, o Linha Direta não se vende como um produto jornalístico da emissora. Tanto que conta com trilha sonora envolvente, ainda que menos enfática que a da versão anterior. Talvez para afugentar algum ar de sensacionalismo. Como disse Bial na estreia: “Nos comprometemos com o rigor, cuidado e honestidade a fazer o melhor para honrar sua confiança”.
No geral é perceptível como o programa e o apresentador buscam ser respeitosos, mas algumas frases de efeito como “Tudo começou com uma festa de aniversário, mas, quando as luzes da casa se apagaram... Não era o Parabéns a Você” soam como os antigos policialescos à la Gil Gomes.
Podcast deixa a desejar
De negativo, fica uma boa ideia, mas com má aplicação: Linha Direta - O Podcast.
A Globo prometeu um podcast “que traz conteúdo extra, com impressões de Pedro Bial e depoimentos de bastidores vivenciados por roteiristas, pesquisadores e pela produção”. Já Bial garantiu que “o podcast não vai ser simplesmente uma versão em áudio do programa que foi ao ar na televisão”.
Ao ouvir o do caso Henry Borel, por exemplo, é interessante tomar conhecimento de que Lionel, pai do jovem que morreu, chegou à produção por intermédio da autora de novelas Gloria Perez (que também perdeu uma filha assassinada, Daniella Perez, em 1992) e pediu que o caso fosse abordado. Uma informação interessante e complementar.
Na sequência, porém, ouve-se trechos que são simplesmente a reprodução do programa que foi ao ar na TV. O ideal seria que houvesse o material especial separado, para quem acompanha na televisão ou no Globoplay não precise ficar ouvindo material repetido e abandonando o podcast no meio do caminho. Se a ideia é atingir dois tipos de público, poderiam ser feitos dois tipos de podcast, um deles mais resumido.
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