'Arte de Jim Henson não envelhece', diz diretor Louis Leterrier

Responsável pela série ‘O Cristal Encantado – A Era da Resistência’, Leterrier acredita que mensagem e técnicas de filme ainda tocam público

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Foto do author Thaís Ferraz

Escalado para dirigir a série O Cristal Encantado: A Era da Resistência, o francês Louis Leterrier (O Incrível Hulk) afirma que o filme O Cristal Encantado, de 1982, mudou sua vida. “É um filme que nunca envelhece, porque ele sempre pode ser trazido de volta”, diz em entrevista por telefone ao Estado. “E a cada vez as pessoas verão coisas diferentes”.

Cena do filme O Cristal Encantado (1982) Foto: The Jim Henson Company

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O diretor afirma que O Cristal Encantado foi o trabalho mais inovador da carreira de Jim Henson, que criou, entre outros, os programas Muppet Show, Vila Sésamo e Labirinto. “Se analisarmos os bonecos, a maquiagem, a caracterização dos monstros e a animatrônica, percebemos que aquela foi a tecnologia de marionetes mais inventiva já feita.”

Para Leterrier, dirigir a série da Netflix foi um desafio. “Sabia que havia um mundo maior, já criado, e usei tudo dele”, conta. “Mas também fiz o exercício de pensar o que eu, Louis, poderia adicionar àquele universo”.

Confira a entrevista:

‘O Cristal Encantado foi o filme mais inovador de Jim Henson’

O diretor francês Louis Leterrier Foto: Mario Anzuoni

Por que trazer O Cristal Encantado de volta agora? Eu não costumava usar O Cristal Encantado como referência nos filmes que dirigi, mas sempre me inspirei nele. É um filme atemporal, eterno. Você pode trazê-lo de volta e explorar seus elementos, em cada década, e a cada vez as pessoas verão coisas diferentes.

A equipe da série inclui os artistas Brian e Wendy Froud, que também trabalharam no filme de 1982. Qual é o papel deles na produção de A Era da Resistência? Eles desempenharam exatamente o mesmo trabalho que fizeram no primeiro filme. Foram criadores, supervisionaram a produção dos bonecos, a composição dos sets de filmagem. São artistas excepcionais, e ficaram responsáveis por um ‘olhar geral’ que conectasse tudo.

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O interessante é que, na série, recebemos mais um membro da família Froud, Toby (nascido dois anos após o lançamento do filme). Ele havia interpretado o bebê do filme Labirinto (outro trabalho dos Frouds com Jim Henson, de 1986).

Foi muito interessante ter todos os Frouds na equipe, porque cada um tem um trabalho bastante único. Brian é um artista conceitual, Wendy traz humanidade às coisas e Toby torna tudo possível tecnologicamente. É o que nós chamamos de ‘água dos Froud’. É uma espécie de suco que torna tudo sujo, e lindo. Uma feiúra que é bela.

Como se desenrolou o processo de pesquisa para produção da série? Vocês encontraram desenhos, personagens ou ideias inéditas, que foram produzidas para o filme original, mas não usadas anteriormente?

Eu sabia que, como em todo filme, os produtores haviam imaginado um mundo muito maior, e não tinham usado tudo por questões de orçamento. Então meu primeiro passo foi ver o que poderíamos aproveitar do filme de 1982. Eu posso dizer que tudo o que estava lá foi aproveitado na série. É claro, precisamos criar novos elementos, porque o filme tinha uma hora e meia e a série tem dez, mas cada desenho, cada conceito, cada ideia que Jim Henson teve para o filme original e não pôde fazer, nós usamos agora.

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O que há de tão único em O Cristal Encantado, de 1982?

Eu acho que foi o trabalho mais inovador de Jim Henson. Foi a tecnologia de fantoches mais inventiva jamais feita. Os personagens eram mais animatrônicos, menos fantoches. Eles não eram fofos, não pareciam os muppets. O público precisava sentir medo deles, então houve um cuidado especial com a composição e maquiagem dos bonecos.

Mas, para mim, o principal é que Jim Henson fez um filme sério de fantoches. Por conta da história, os bonecos precisavam transmitir sentimentos de tristeza, medo. Eles precisavam morrer. Essas são coisas que não tinham sido vistas antes. Talvez no cinema russo, de forma muito diferente, mas não nos Estados Unidos, não no cinema ocidental, não na TV.

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O Cristal Encantado também quebrou algumas barreiras do storytelling, ao ser o primeiro filme produzido 100% com fantoches, sem seres humanos. E ele era tão louco que, originalmente, foi gravado em uma linguagem inventada. Era um poema visual, um aterrorizante poema visual em que ninguém entendia nada.

Qual é o legado de Jim Henson em termos de técnica, narrativa e arte? O principal legado técnico de Henson e sua equipe foi desenvolver a tecnologia para fantoches. Eles conseguiram fazer com que tudo fosse tão real que você acabava esquecendo o que estava vendo. Os marionetistas fizeram com que as marionetes ‘desaparecessem’. Você não via fantoches, via criaturas.

Mas, além disso, ele tinha uma alma gentil. Ele queria que o mundo desse as mãos e se reunisse em torno da TV, que as famílias fizessem isso. Ele queria assustar as crianças, mas de um jeito que...como se fosse um pesadelo que te faz acordar e descobrir a verdade. O planeta de Thra fica muito, muito longe da Terra, mas ainda assim os problemas ali retratados são tão similares aos nossos. ‘Não acredite nos políticos’, ‘é tudo maquiavélico’, ‘tudo está conectado’...ele passou essa mensagem de uma forma muito orgânica e mágica. Jim Henson mudou a minha vida, e eu não sabia o quão universal esse sentimento era.

E a série transmitirá isso para as novas gerações? Definitivamente. A Era da Resistência evolui o legado de Jim Henson. Eu tenho muita certeza de que boa parte da nossa audiência será mais nova e nunca terá visto um show de bonecos antes. Nós vimos, quando crianças, fantoches na TV, nos teatros, nos filmes, mas hoje a norma é apostar em tecnologias de CG e animação. As pessoas vão estranhar um pouco. Essa foi a reação que percebemos quando divulgamos o primeiro trailer. As pessoas tentavam entender o que, exatamente, era aquilo.

Confira o making of da série O Cristal Encantado: A Era da Resistência

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