NOVA YORK* - Danny Rand tinha tudo para se transformar em um Homem de Ferro ou Batman. Sozinho, órfão, milionário. Enquanto Tony Stark decidiu criar uma armadura tecnológica para lutar contra os bandidos e Bruce Wayne treinou corpo e mente ao máximo e criou as bat-bugigangas para auxiliá-lo no combate ao crime, Danny Rand preferiu usar o termo “fazer justiça com as próprias mãos” de forma literal.
O novo herói a ganhar uma série da parceria entre Netflix e Marvel é especialista em kung fu, criado nos anos 1970, quando os filmes orientais do gênero ganharam alguma popularidade nos Estados Unidos. E, por mais que exista um caráter fantasioso no personagem – afinal, ele é capaz de reunir uma energia chamada de chi em seus punhos para desferir golpes poderosíssimos –, é o mundo real, que nós conhecemos, que importa em Punho de Ferro, cuja estreia mundial ocorre no dia 17 de março, daqui a duas semanas.
Trata-se da quarta parte de um projeto ambicioso criado pelas duas empresas. A Marvel via nesses personagens não tão “supers” em termos de poderes especiais, como Demolidor, Jessica Jones, Luke Cage, e muito mais urbanos, uma oportunidade de testar um terreno mais sombrio. Distante das cores vibrantes da armadura do Homem de Ferro, do escudo do Capitão América ou da capa esvoaçante de Thor, ela queria tentar inserir os heróis no mundo real. A Netflix surgiu como a plataforma disposta a experimentar sem a necessidade e a urgência exigidas por uma emissora de TV, aberta ou fechada, por audiência.
Demolidor foi o primeiro a entrar no jogo, em 2015. Cenas noturnas, um personagem que bate, mas também apanha (e muito!), sangue. O bairro nova-iorquino Hell’s Kitchen acabava se tornando parte importante da trama. Enquanto os Vingadores (grupo formado pelos citados Homem de Ferro, Capitão América, Thor, Hulk, entre outros) se preocupam em salvar o planeta, Demolidor deu início à jornada dos heróis locais, que atuam no bairro onde vivem, cujos dramas são reais, não interplanetários. Vieram Jessica Jones e Luke Cage, também bem-sucedidos. Com Punho de Ferro e sua “magia”, o quarteto estará completo. “Tudo é questão de acreditar”, explica Finn Jones, que vive o herói na tela. “A partir daí, ele se conecta com todos os outros heróis.”
Pouco conhecido,Punho de Ferro nasceu no boom dos filmes de kung fu, nos anos 1970
Um pôster de Bruce Lee, ícone do cinema de artes marciais, pendurado na parede do quarto dos adolescentes era comum durante os anos 1970. Por uma daquelas coincidências trágicas, o astro do kung fu morreu um mês antes da estreia do seu último filme, o bem-sucedido Operação Dragão, em 1973. Tornou-se um ícone de um gênero que crescia nas salas de cinema dos Estados Unidos, os filmes de artes marciais. Crianças queriam praticar kung fu, caratê, judô. David Carradine reinou absoluto na TV como o monge Kwai Chang Caine, na série Kung Fu, sucesso entre 1972 e 1975. O cantor jamaicano Carl Douglas chegou ao topo das paradas musicais com Kung Fu Fighting.
E o que dizia Douglas era verdade: nos anos 1970, todos queriam lutar kung fu. As revistas em quadrinhos não poderiam ficar fora dessa nova onda cultural que vinha do Oriente. Nesse rompante que nasceram personagens como Mestre do Kung Fu (sim, esse foi o nome dado ao herói Shang-Chi) e Punho de Ferro. Shang-Chi não teve vida muito ativa nas HQs, enquanto Punho de Ferro, nome adotado pelo milionário Danny Rand quando veste a máscara amarela, se tornou um personagem cultuado, mesmo que nunca tenha tido a popularidade de outros da editora Marvel, como Homem de Ferro, Capitão América ou Homem-Aranha.
“Mas, ainda assim, acho que ele tem fãs muito fiéis”, defende Finn Jones, ator cujo rostinho já foi chamado de “o mais belo de Westeros” em outra série extremamente popular, Game of Thrones, quando interpretou Loras Tyrell. “Entendo que ele não é tão popular quanto outros personagens da editora. Tenho sentido, no entanto, um nível de responsabilidade alto ao interpretar esse personagem para fãs fervorosos.”
Ainda assim, Jones diz entender que a popularidade diminuta do lutador de kung fu capaz de reunir energia nos punhos para desferir golpes poderosos lhe permite dar uma visão mais pessoal para Danny Rand, o milionário que perde os pais e volta a Nova York já crescido e treinado nas artes marciais. Uma liberdade impossível, por exemplo, para o Demolidor, o herói extremamente popular que estreou a parceria entre a editora Marvel e a Netflix – saiba mais sobre todos os personagens que integram esse universo urbano no serviço de TV por internet no quadro ao lado.
Sentado durante a entrevista ao Estado ao lado de Jessica Henwick, outra atriz de Game of Thrones (ela interpreta Nymeria Sand), Jones explica que aprendeu com a série da HBO a “deixar de se preocupar com os elogios e a boa audiência”. “Ou você vai perder o foco no lado criativo do trabalho”, ele explica. Jessica completa, rindo: “Com Game of Thrones aprendi como conviver com dragões”.
*O repórter viajou a convite a convite do estúdio
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