RIO -A Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) vai pedir a desocupação do antigo Canecão, que há duas semanas abriga cerca de 150 pessoas do movimento Ocupa MinC RJ. O reitor, Roberto Leher, disse que o prédio, de propriedade da instituição, e onde até seis anos atrás funcionava uma das principais casas de show do País, hoje oferece risco de desabamento e de incêndio, não podendo receber atividades culturais. Na quinta-feira, 4, foi realizado um show de protesto que teve como principal atração Chico Buarque.
“Temos laudos que mostram que o prédio não tem condições estruturais e ambientais para receber ninguém. Essas pessoas têm uma visão romântica de que o problema pode ser resolvido com uma limpeza cosmética, mas isso não é verdade. Eles não conhecem a dificuldade que a UFRJ teve de reaver o espaço. Um grupo privado não pode ocupar um bem público”, afirmou Leher ao Estado na noite desta terça-feira, 9. “Vamos solicitar a desocupação de maneira não coercitiva. A UFRJ sempre foi generosa com movimentos sociais. Eles vão compreender. O risco é real.”
Na terça-feira, 9, de manhã, no centro do palco que já recebeu Tom Jobim, Maysa, Elis Regina e dezenas de outros nomes do melhor da música brasileira, um laptop tocava uma playlist de sucessos de Chico. No lugar das cadeiras onde o público se sentava, alinhavam-se as barracas de camping do Ocupa MinC.
Vazio desde que foi restituído à UFRJ, vencida uma batalha judicial de 30 anos com os antigos locatários, que não pagavam o aluguel devido, o espaço de Botafogo voltou a ter vida cultural com a chegada dos ocupantes. Eles foram retirados do Palácio Gustavo Capanema, no centro do Rio, sede do Ministério da Cultura no Rio, no dia 25. A Polícia Federal desocupou o edifício a mando da Justiça, acionada pelo MinC.
Dois dias depois, deixaram o acampamento montado em frente ao Capanema e decidiram seguir a ocupação no ex-Canecão. “Essa nos pareceu a melhor opção para dar visibilidade à luta contra o governo interino de Michel Temer no momento olímpico, por sua localização e pelo simbolismo histórico, ligado à cultura e à educação, dois campos ameaçados por esse governo”, informaram os ocupantes ao Estado, coletivamente.
Segundo o reitor, a ocupação, que tem entre seus integrantes professores e estudantes, foi consentida – mas era para ser temporária. “A ocupação com certeza se mantém até Temer cair”, argumenta o Ocupa MinC, que recebe doações de comida e material de limpeza.
Assim como no Capanema, onde por dois meses foi apoiado por artistas como Caetano Veloso, Frejat, Marieta Severo e Camila Pitanga, o grupo já recebeu endosso não só de Chico Buarque, mas também de Zélia Duncan, Jards Macalé e Julia Lemmertz. “Eu vim aqui declarar oficialmente aberto, e fora Temer, os jogos olímpicos democráticos”, disse Chico na apresentação de quinta, antes de cantar Apesar de Você, canção de 1970 que foi censurada pela ditadura militar e se tornou um hino pela liberdade.
“É um movimento cultural espontâneo e pertinente. Ocupar a cidade é a coisa mais contemporânea que existe. Em meio à Olimpíada, é um acontecimento muito mais importante do que se pensa. A iniciativa privada não conseguiu manter o Canecão, a UFRJ não conseguiu também, e os meninos foram lá e conseguiram”, defendeu Bia Lessa, diretora do show.
A UFRJ tem um projeto de recuperação e reabertura do antigo Canecão. A reitoria quer o palco aberto preferencialmente à produção universitária e a espetáculos que não tenham apelo comercial. Para readequá-lo, espera levantar R$ 35 milhões com a ajuda de leis de incentivo. Os recursos próprios são parcos – a instituição tem R$ 120 milhões em dívidas.
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