Unicórnios e dragões como inspiração para a moda de Gloria Coelho

Estilista fala sobre sua carreira e a coleção que apresenta na quinta na SPFW

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Por Maria Rita Alonso
Atualização:
Misticismo. Gloria, em seu ateliê, ao lado de uma modelo com look de seu próximo desfile que é inspirado em vários filmes Foto: JF Diorio/ Estadão

No casamento improvável entre técnica e intuição, habitam as criações de Gloria Coelho. Do alto de seus mais de 45 anos de história na moda brasileira, a estilista ainda encara o ofício com a mesma curiosidade de quando começou. Fã de Game of Thrones, de astrologia e de arquitetura urbana, ela mistura referências díspares em suas roupas, ao mesmo tempo em que mantém uma identidade muito bem construída em cada peça. 

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Para seu próximo desfile do SPFW, marcado para quinta-feira, na Fundação Armando Alvares Penteado (Faap), Gloria parece ter feito um exercício de criatividade ainda mais interessante, partindo de um mix que une criaturas místicas a um passeio por entre os elementos mais simbólicos de cada década da moda. A coleção tem cores vibrantes como o pink - pouco comum em suas últimas apresentações -, estampas florais e texturas que imitam pele de dragão, inspirado no livro Necromane: a conquista do Planeta dos Dragões e o Bestiário das Criaturas por Ricardo Gontijo.

Sua consciência intelectual, aliada a um forte interesse - e entendimento - da cultura pop, aproxima Gloria Coelho do que faz a italiana Miuccia Prada na Prada. Criadoras longevas, ambas são mestras em combinar elementos aparentemente antagônicos, confundindo ao mesmo tempo em que capturam a atenção do espectador. Coisa de quem não briga com os fatos, mas os domina. De quem entende o espírito destes tempos. A seguir, trechos da entrevista ao Estado

Para seu desfile doSPFWGloria Coelho fez um exercício de criatividade interessante, partindo de um mix que une criaturas místicas a um passeio por entre os elementos mais simbólicos de cada década da moda Foto: JF Diorio/ Estadão

Você é uma das poucas estilistas que quase nunca pularam uma edição de SPFW. Como explica essa longevidade e constância na marca?

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Eu pulei só uma edição. Eu amo o que eu faço. E quando a gente ama o que faz, não para de fazer. 

Lá fora e aqui, há um questionamento sobre a importância das semanas de moda hoje. Como você vê isso?

Para mim, um desfile representa a organização dos meus seis meses. Um cronograma para que os lojistas façam o pedido, para chamar os clientes, dar informação para todos os veículos. É importante também para saber o que vai ter no mercado. 

Você vê uma mudança nesse formato no futuro?

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É difícil falar, mas acho que haverá mudança em tudo, inclusive, nas roupas. Acho que vamos ter roupas holográficas. Tem gente também fazendo construções enormes na impressora digital, não só roupa. Para mim, criar uma apresentação ainda é gostoso demais, mas você vai ter novas maneiras de fazer isso.

Muito se fala sobre a importância de o desfile ser um show, e você desfila há anos em um palco [no teatro da Faap, em São Paulo]. Como faz essa relação?

Todo mundo gosta de desfile. Às vezes vejo desfiles de marcas que são muito ricas, cheios de luzes, de quadros, e fica horrível. O importante é a roupa. Você tem que limpar tudo e mostrar a roupa. Quanto mais você mostrar de que maneira você pode usar aquela roupa, o que está propondo com aquilo, melhor fica.

A busca por peças mais duráveis, em um movimento antifast fashion, acabou resgatando a moda dos anos 1990, que era minimalista e de certa forma espelha muito a sua criação. Como vê isso?

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A turma de estilistas que eu gosto fez desfiles superesquisitos, retrô. E eu não gosto de ser retrô. Nesta coleção, a gente misturou todas as décadas, 60, 70, 80, 90 e 2000, para criar uma coisa nova. Pegou as características de cada década e jogou num liquidificador. Por exemplo, um vestido com cauda dos anos 70, mas ombro da década de 80, que resulta numa estética 2000. Agora, a gente está criando 2020. Então eu não acredito em fazer algo retrô. 2020 não é retrô, já tem uma cara nova. A data 2020 remete a uma ideia de futurismo. Em Guerra nas Estrelas dos anos 1980, a princesa Leia tinha um blush marcado, aquele penteado. Nos novos filmes, a protagonista usa uma camiseta assimétrica, uma bermuda e nada de maquiagem. Um naturalismo absurdo. Matrix tinha razão. Você está na matriz, mas você faz parte de um sistema todo lesado, com roupas simples, naturais, um primitivismo. O cinema mostra muito isso.

Você segue correntes distintas. Mistura não só as décadas como costuma combinar referências díspares, como do universo da ficção científica, do misticismo... 

Tenho paixão por unicórnio, por todos os filmes de dragões. Harry Potter, Game of Thrones, Pokémon. Nessa coleção, as estampas são imagens do livro infantil Necromane, de Ricardo Gontijo, sobre dragão. As joias também são inspiradas em dragões. Também quisemos recriar a pele de dragão, como em telas ou em dois echarpes de matelassê.

Como é seu processo criativo?

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Quando acaba o desfile, a gente tem um mês para fazer lookbook, catálogo, conteúdo para Instagram. Mas a gente nunca para, porque tem coisas que já está pensando para as próximas. O cinema também estimula muito, essas coisas fantasiosas. Game of Thrones foi superimportante para a moda, as roupas são muito fortes, características de 2020. Essas histórias com dragão, eu queria que fossem verdade. É um absurdo que não exista dragão, eu queria ter um dragão. 

Um modo de produção mais sustentável é pauta urgente na moda. Como você trabalha isso na sua marca?

Não tem mais volta, é uma obrigação ser sustentável. Tudo o que a gente faz é pouco ainda. A pessoa vai continuar casando, sendo madrinha. Mas o tecido vai ser o que menos agride o planeta, você vai desenhar seu molde e a roupa vai sair sem resíduo extra. Mas é preciso começar de algum lugar. Eu li que o dono da Zara disse que até 2025 todas as suas coleções vão ser totalmente sustentáveis. E se ele fizer, toda a cadeia vai fazer.

COLABOROU NATÁLIA GUADADNUCCI

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