Virada no Anhangabaú fica mais segura, mas perde público e se isola no centro

Medo dos arrastões, que marcaram a edição do ano passado, fez com que muitas pessoas optassem por não ir ao evento este ano; público estranha a perda de palcos na região central

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Foto do author Gonçalo Junior
Atualização:

O palco principal da Virada Cultural de São Paulo, no Anhangabaú, na região central, ficou mais seguro – o policiamento ostensivo inibiu os arrastões e diminuiu a sensação de insegurança. Por outro lado, o público rareou nos shows da madrugada, provavelmente como um reflexo da violência do ano passado. E a escolha de uma arena única no centro, isolada por tapumes, impediu a circulação em outras áreas – um dos objetivos da Virada quando foi criada. Em linhas gerais, essa foi percepção – negativa e positiva – de frequentadores do evento entre sábado, 27, e a madrugada de domingo, 28.

Espectador do evento desde 2015, o programador de TI Henrique Trindade, de 33 anos, lembra-se de percorrer vários palcos em edições anteriores da Virada, saindo da Praça da Sé e percorrendo maiores e menores, em diferentes ruas. Isso se perdeu, em sua visão. “Ficou tudo num lugar só, mais restrito.”

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Trindade se refere às edições em que o evento acompanhava o centro desde a Estação da Luz até a Praça da República. Essa é a 18ª edição da Virada e, neste ano, ela contou com apenas um palco com atrações durante a madrugada, o do Vale do Anhangabaú. Já os shows em palcos de regiões mais periféricas começam às 17h de sábado, param às 22h e são retomados às 9h do domingo.

A ideia de promover uma reocupação e ressignificação do centro histórico a partir de espetáculos musicais e culturais teve de se adaptar ao aumento da criminalidade na região central. Neste domingo, o viaduto do Chá, a Praça Ramos de Azevedo e as escadarias da Líbero Badaró estavam cercados com tapumes, isolando o Anhangabaú do entorno, como se ele fosse uma fatia separada da cidade. Para exorcizar o fantasma dos arrastões, a festa foi feita em um cercado, resumiu um fã do rapper MVBill, que se apresentou neste domingo.

Vale do Anhangabaú ficou cercado por tapumes durante a Virada Cultural 2023 em uma tentativa de controlar a violência. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Nesse contexto, a enfermeira Rafaela Belchior, de 35 anos, compara o novo formato do evento a um festival musical, como o Lollapalooza ou o Rock in Rio. Contribuem para essa sensação, em sua opinião, as grades de contenção, a venda de bebida e comida feita majoritariamente por ambulantes credenciados e a entrada feita por um acesso totalmente controlado, com revista.

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Para Trindade, o lado bom de shows mais seguros foi ter conseguido levar o filho, de 4 anos, para sua primeira virada. Para o menino, as grades de contenção significaram liberdade de correr e transformar uma garrafa de água em bola de futebol imaginária. Foi possível ver outras famílias com crianças, principalmente moradoras da região central, curtindo os shows.

Shows esvaziados

Depois do show do grupo BaianaSystem, a principal atração da noite, a plateia do Anhangabaú ficou esvaziada. O cantor argentino Dread Mar-I e a brasileira Luedji Luna, atrações que vieram em seguida, cantaram para um público fiel, mas restrito às proximidades do palco. Nas zonas mais distantes, era possível perceber policiais conversando por volta das 2h30 – no início do evento, eles estavam tensos e de cara fechada.

Até a revista na entrada foi se tornando mais condescendente com a diminuição do público e deixou de lado o detector de metais. As revistas eram bem mais simples. O número de viaturas também caiu pela metade à medida que as horas passavam.

Para se aproximar do palco no show de Dread Mar-I, não era necessário empurrar ninguém ou se esgueirar para fazer uma foto. Dava para chegar sem aperto e com tranquilidade.

O palco principal do evento recebeu menos gente do que nas edições anteriores. Ele até foi maior nas primeiras apresentações, mas a arena nunca ficou lotada. Provavelmente ainda seja um reflexo da sensação de insegurança de quem circula pelo centro ou lembrança dos arrastões do ano passado.

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Isso explica, por exemplo, o fato de apenas o advogado Lucas Brasiliano, de 34 anos, e o recrutador Elivaldo Gomes, de 26 anos, terem ido ao evento de uma turma de seis amigos. Os outros desistiram ao se lembrar da sensação de medo e dos perrengues com os arrastões, furtos e roubos de celulares na última edição da Virada Cultural.

Essa memória da violência também motivou o rapper MV Bill a explicar que a maneira como alguns fãs dançavam a sua música na plateia – a roda de rap pode parecer uma briga em alguns momentos – é apenas a forma de sentir e curtir o som. “Ninguém está brigando. Não se assustem”, pediu para o público duas vezes ao longo da apresentação de pouco mais de uma hora.

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