BRASÍLIA - Quatro decisões políticas tomadas entre o período de transição e o primeiro ano do novo governo Lula podem gerar despesas adicionais entre R$ 2,3 trilhões e R$ 3 trilhões num período de dez anos, estimou a Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão ligado ao Senado, em seu Relatório de Acompanhamento Fiscal (RAF) de novembro, divulgado nesta quinta-feira, 21, por esse órgão vinculado ao Senado, criado em 2016 com o objetivo de aumentar a transparência das contas públicas do País.
A expansão fiscal contabiliza a incorporação do aumento do Bolsa Família para o patamar pago ao longo da pandemia, a retomada da vinculação das despesas de educação e saúde às receitas, a correção do salário mínimo acima da inflação e sua manutenção como indexador, e a criação dos fundos orçamentários previstos na reforma tributária.
“A magnitude da expansão fiscal e a rigidez do Orçamento formam a percepção de que medidas conjunturais não serão suficientes para reverter o quadro de insustentabilidade do limite de gastos do arcabouço fiscal, podendo apenas adiar a necessidade de alteração do normativo a médio prazo”, diz Eduardo Nogueira, analista da IFI.
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Bolsa Família
Nogueira lembra que ainda durante a negociação da PEC da Transição o governo optou por manter o valor do benefício básico do Bolsa Família no patamar de R$ 600, medida que representa um acréscimo permanente de R$ 59,8 bilhões, em valores reais, ao ano.
“Assim, o impacto fiscal de médio prazo (10 anos) da ampliação permanente dos gastos com o Programa Bolsa Família é de R$ 598 bilhões, sem que fossem apresentadas medidas de compensação por meio de aumento permanente de receitas ou da redução permanente de outras despesas do orçamento”, frisa.
Mínimos de saúde e educação
Na apresentação do arcabouço fiscal, que garantiria o equilíbrio das contas públicas, o governo optou por retomar a vinculação dos mínimos constitucionais de saúde e educação ao desempenho, respectivamente, da Receita Corrente Líquida (RCL) e da Receita Líquida de Impostos (RLI), em substituição à regra do teto de gastos.
A IFI calcula que, no cenário-base, o impacto fiscal dessa medida é de R$ 459 bilhões, podendo atingir R$ 574 bilhões no cenário pessimista ou R$ 478 bilhões no otimista.
Salário mínimo
A nova política de valorização do salário mínimo - que garante correção da inflação acrescida da variação do PIB de dois anos antes - tem impacto que varia entre R$ 1,2 trilhão, R$ 1,4 trilhão e R$ 835 bilhões, respectivamente, para os cenários base, otimista e pessimista. O governo discute agora uma nova fórmula de cálculo do salário mínimo, mais alinhada às regras do arcabouço.
Fundos da reforma tributária
Por fim, a criação do Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR) e do Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais ou Financeiro-Fiscais (FCBF), que constam da reforma tributária, deve provocar um impacto de R$ 336,9 bilhões, a preços de 2024, no período entre 2029 e 2034.
Para piorar o cenário, o analista lembra que a proposta de Orçamento de 2023 já era desequilibrada e os agentes econômicos esperavam ajustes na condução da política fiscal desde então. Ainda assim, foram escolhidas medidas permanentes de aumento de despesa que pressionam ainda mais o quadro fiscal, também em função da sustentabilidade da trajetória da dívida ante o PIB.
Ele ainda citou outras medidas que pressionam ainda mais o governo, já que em vez de cortar gastos está criando novas despesas, como a ampliação do auxílio-gás, e a alteração das metas de superávit primário com a busca do resultado no limite inferior da banda.
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Esse quadro resultou na deterioração das expectativas. Em reação, o governo promete anunciar um pacote robusto de revisão de gastos, mas tem constantemente postergado o anúncio das medidas, sua abrangência e impacto fiscal.
“Caso as medidas de revisão de gastos a serem anunciadas sejam apenas conjunturais, servindo apenas para cumprir o limite de despesas do arcabouço fiscal até o término do governo atual, é possível que não ocorra a reversão das expectativas e que a condução da política fiscal continue a pautar o debate econômico, mantendo a pressão, principalmente, sobre as taxas de câmbio e de juros, com crescente impacto sobre o endividamento público”, alerta.
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