O setor elétrico brasileiro enfrenta desafios cruciais, sendo a renovação das concessões de distribuição a pauta da vez. Originalmente previsto para 2022, o processo foi adiado para 2023 e com certeza irá para 2024. Vinte e uma distribuidoras de energia têm contratos a expirar entre 2025 e 2031.
A renovação das concessões está ocorrendo num contexto de mudança tecnológica, climática e num momento de inferno astral para o setor de distribuição. A Amazonas teve a caducidade da concessão pedida pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e, principalmente, a Enel São Paulo e a Enel Rio estão sendo foco de críticas duras e de pedidos de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) por parte de políticos. As mudanças tecnológicas estão impondo às distribuidoras uma redução de receitas e ampliação de custos. O avanço na regulação e na legislação está propiciando o crescimento do mercado livre e da mini e microgeração distribuída. Além disso, o segmento ainda enfrenta problemas antigos, como a elevação do índice de perdas não técnicas por furto de energia, os populares “gatos”. Tudo isso levou a uma perda de mercado e, consequentemente, da receita das distribuidoras.
Há que ter muito cuidado e bom senso neste momento turbulento e de grande tensão. A crise é uma oportunidade, mas também pode ser má conselheira. Já aparece como solução por parte de prefeitos a cassação de concessões. Não me parece a melhor alternativa, até porque a situação de cada distribuidora é bem diferente, e a culpa também deve ser dividida entre as concessionárias, prefeituras e a Aneel. Entretanto, se a Aneel, ao fiscalizar e auditar, chegar à conclusão de que houve quebra do contrato de concessão, a cassação, a caducidade e mesmo a intervenção devem ser feitas. Cabe à Aneel ser a guardiã do contrato de concessão.
Uma coisa é a Amazonas Energia, outra é a Enel e a Light. Soluções diferentes para empresas diferentes. Qualquer medida precipitada onde prevaleça o aspecto político em detrimento do técnico só trará instabilidade regulatória e insegurança jurídica para o setor e para o Brasil.
As discussões precisam ser aprofundadas através de uma interação entre o governo, a Aneel e o Congresso para garantir ao segmento de distribuição e, por consequência, ao setor elétrico o fundamento jurídico e a base regulatória, que permitam os investimentos necessários nesse novo ciclo de concessão. As leis, resoluções que hoje regem o setor elétrico, envelheceram. Com isso, o setor precisa de um banho de loja que vista as empresas de forma a enfrentar as mudanças tecnológicas e climáticas, e que permita uma maior interação com os agentes públicos, como os Estados e prefeituras.
A solução é urgente, mas todos precisam entender, ao tomar as decisões de renovação das concessões, que o retrovisor é menor do que o para-brisa.
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