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Opinião | Limites da queda dos juros

Em semana pautada pelos juros, Lula fortaleceu à projeção de uma taxa Selic de 10,5% ao final de ciclo de cortes

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Ao jogar uma “pá de cal” na esperança de que teríamos um déficit zero em 2024, Lula deu mais força à projeção de uma taxa Selic de 10,5%, ou mais, ao final do atual ciclo de cortes. A essa nova informação se soma a outra força que também opera na direção de exigir uma taxa terminal mais alta. Embora não haja uma ligação direta entre a taxa neutra de juros no Brasil e nos EUA, através dos fluxos de capitais e do diferencial entre as taxas de juros, uma taxa mais elevada nos EUA limita à redução da nossa taxa de juros.

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Há uma aguerrida controvérsia sobre se após a pausa de novembro o Federal Reserve ainda deverá elevar a taxa dos Fed Funds, mas não há controvérsias nem sobre o grau de aquecimento da economia americana, nem sobre os efeitos da política fiscal expansionista sobre sua taxa neutra real de juros. Como não há perspectiva de mudança na expansão fiscal do governo Biden, o Fed nos informa que, na melhor hipótese, a taxa de juros nos EUA deverá se manter “mais alta por mais tempo”.

Para avaliar como uma taxa neutra mais alta nos EUA impõe limitações ao nosso ciclo de queda, vale a pena olhar para o ocorrido entre junho de 2019 e maio de 2020, quando o Banco Central cortou exageradamente a taxa Selic, levando-a de 6,5% a 2% ao ano. Tal corte superou em muito o ocorrido nos Estados Unidos, acarretando uma fuga de capitais superior a US$ 50 bilhões. Para evitar uma depreciação cambial ainda maior do que a observada, o Banco Central, que desde 2012 só realizava intervenções no mercado futuro de câmbio, foi obrigado a vender perto de US$ 50 bilhões de nossas reservas e, ainda assim, não evitou os efeitos do câmbio sobre a inflação.

Semana foi pautada pela super quarta, com decisões sobre os juros no Brasil e nos Estados Unidos.  Foto: Jason Reed/Reuters

No comunicado da última reunião do COPOM, o Banco Central informa que “nas próximas reuniões” deverá manter o atual pace de corte de 50 pontos base, mas a partir daí terá que escolher entre manter o ritmo atual ou reduzi-lo, visando uma convergência suave para a taxa de 10,5%. Terá que decidir se vale a pena sacrificar o crescimento econômico para obter uma inflação próxima da meta ou se, devido ao esfarelamento do compromisso com as metas de resultado primário, cederá às pressões para “dar uma ajuda” ao Tesouro, aceitando uma inflação mais elevada para tentar obter um crescimento do PIB que eleve a arrecadação.

Ao descumprir as metas de resultado primário o governo eliminou a esperança de que poderia participar de um “jogo cooperativo” com o Banco Central. Ao contrário, buscará forçá-lo a reduzir a taxa de juros ainda que à custa de atingir uma meta de inflação superior à oficial, agravando a desancoragem de expectativas.

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Opinião por Affonso Celso Pastore

Ex-presidente do Banco Central e sócio da A.C. Pastore e Associados

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