SOROCABA - O Brasil vai colher 317,6 milhões de toneladas de grãos na safra deste ano, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). É um recorde, e o número pode ser comemorado hoje, Dia do Agricultor. São 44,9 milhões a mais que na safra de 2022, que também foi recorde. Esse será o maior volume de grãos já colhidos no País – ainda falta terminar a colheita do milho – , mas pode não haver armazém suficiente. No Mato Grosso, maior produtor de grãos do País, há milho estocado a céu aberto ou debaixo de tendas.
De acordo com o presidente da companhia, Edegar Pretto, além da boa produtividade de soja, houve melhor desempenho de milho na segunda safra e aumento na área semeada com trigo, tudo aliado às boas condições climáticas. “A agricultura brasileira tem demonstrando sua força e potencial para alcançar números cada vez mais elevados, com investimentos constantes que permitem aumento de produtividade”, disse ele.
Veja mais
A soja vai atingir produção sem precedentes de 154,6 milhões de toneladas, 23,1% ou 29 milhões de toneladas acima da safra passada. O milho deve chegar a 127,8 milhões de toneladas, incluindo as três safras, com aumento de 12,9% ou 14,6 milhões de toneladas.
“O atraso na colheita da soja em diversas regiões levou a um atraso no plantio do milho, que pegou temperaturas baixas na maturação, mas as lavouras se recuperaram bem. O cenário é muito positivo para o cereal”, disse Fabiano Vasconcelos, gerente de acompanhamento de safras da Conab.
Outras culturas, como algodão, feijão e sorgo, seguiram a tendência de alta na produção, disse Vasconcelos. Já o arroz e alguns cultivos de inverno, como trigo, aveia e centeio, tiveram produção menor, sem prejudicar o volume da safra.
A área plantada total este ano atingiu 78,2 milhões de hectares, adicionando 3,7 milhões (4,9%) à área semeada em 2021/22. Só a soja avançou 2,6 milhões de hectares, com aumento de 6,2%, enquanto o milho cresceu 576 mil hectares (2,7%).
Com o aumento na produção, alinhado à maior demanda internacional, a previsão é de elevação no volume de exportações dos grãos brasileiros. Devido à demanda externa aquecida, em razão da guerra na Ucrânia, grande produtora, 48 milhões de toneladas de milho devem sair do País. Mesmo assim, o estoque interno ficará garantido com aumento de 27,6%, chegando a 10,3 milhões de toneladas.
Para a soja, as exportações devem atingir 95,6 milhões de toneladas, aumento de 21,5% em relação à safra passada. Em decorrência do aumento na produção de biodiesel, os esmagamentos da oleaginosa devem chegar a 52,8 milhões de toneladas.
Muito milho
O cenário surpreendente desta safra, segundo André Debastiani, coordenador do Rally da Safra, que percorreu lavouras de Norte a Sul do País, foi a alta produtividade de milho, em que pese a queda nas cotações do cereal. Em função do ciclo mais longo da soja, prejudicado pelas chuvas na colheita, a semeadura do milho ‘safrinha’ começou com atraso e a cultura ficou exposta a geadas.
“Nossas equipes constataram que, à medida em que as lavouras se consolidaram, os riscos se dissiparam e, apesar da colheita se estender até setembro, o risco de perda é reduzido e com certeza será uma boa safra”, disse. A produtividade média, de 105,5 sacas por hectares, é 14,8% superior à passada.
O Mato Grosso obteve média ainda maior, de 120,1 sacas por hectare. A área plantada no Estado cresceu 8,9%. Houve boa distribuição de chuvas. O produtor Robson Weber, do município de Paranatinga, que no ano passado amargou prejuízo colhendo uma média de 40 sacas de milho por hectare, este ano conseguiu 125 sacas. “Ainda temos áreas que estão sendo colhidas, mas neste ano a produtividade está muito boa. O que está atrapalhando é a queda de preço do milho”, disse.
Em São Paulo, o milho foi plantado com atraso devido às chuvas que retardaram a colheita da soja, segundo o produtor Emílio Kenji Okamura, que preside a Cooperativa Agrícola de Capão Bonito.
“A produção de soja foi muito boa, choveu bem durante todo o ciclo. Tivemos até um excesso de chuva perto da colheita, mas minha produtividade foi de 84 sacas por hectares”, disse. A média nacional é de 65 sacas por hectare.
A colheita do milho, em 550 hectares, deve começar neste fim de semana, segundo ele. “Como a soja atrasou, começamos plantar milho no dia 15 de fevereiro. Tivemos falta de chuva entre o fim de abril a meados de maio, mas as lavouras se recuperaram”, disse. Ele prevê produção de 110 sacas por hectare em áreas de sequeiro (sem irrigação) e de 140 sacas nas áreas irrigadas.
Produtores temem falta de espaço para armazenamento da safra
Os números do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) confirmam o volume histórico da safra de grãos este ano. Os destaques são os recordes na produção de soja, milho e trigo, segundo o gerente do levantamento sistemático da Produção Agrícola, Carlos Barrada. “Os preços elevados das commodities fizeram com que os produtores aumentassem a área de plantio desses produtos. Houve aumento dos investimentos nas lavouras e o clima foi muito benéfico em 2023 em quase todas as áreas de produção, o que explica o recorde da safra brasileira de grãos.”
A grande dúvida enfrentada pelo produtor é se haverá espaço para guardar a safra e esperar eventual reação dos preços do milho. No Mato Grosso, por exemplo, o ritmo da colheita está lento porque não há espaço suficiente nos armazéns, muitos ainda ocupados com soja. Os produtores têm recorrido ao silo bolsa (sacolas enormes para proteger os grãos), de operação mais demorada.
Atualmente, o milho brasileiro é o mais competitivo do mundo, com a China fazendo compras fortes do produto. “A dúvida é se vamos conseguir superar essas dificuldades para fazer a entrega”, diz Barrada.
Enquanto a produção brasileira de grãos tem crescido, em média, de 9 a 10 milhões de toneladas por ano, a capacidade de armazenagem não cresce na mesma proporção. Estimativas do setor indicam que pode faltar armazém para mais de 80 milhões de toneladas de grãos, já que os preços baixos não estimularam a venda antecipada dos produtos.
Leia mais
Plano Safra
Nas principais regiões produtoras do Mato Grosso, como as de Sorriso e Rondonópolis, é comum encontrar milho armazenado a céu aberto ou debaixo de tendas. A disponibilidade de dinheiro para plantar a próxima safra também preocupa os produtores, apesar do Plano Safra 2023/24, de R$ 364 bilhões.
O presidente do Sistema Farsul (Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul), Gedeão Pereira, disse que os números não são relevantes frente ao tamanho da agricultura. “Também nos preocupa não vermos nenhum anúncio de recursos para seguro rural, que nos parece importante, principalmente no Rio Grande do Sul, onde tivemos problemas recentes de perdas agrícolas.”
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.