A Fazenda Santa Brígida, em Ipameri (GO), tinha um cenário de pastagens degradadas e de baixa produtividade de gado quando Marize Porto Costa, com apoio da Embrapa, iniciou o sistema lavoura-pecuária em área de 800 hectares. Ela conta que a primeira safra de soja e de milho pagou apenas as contas, mas o ganho estava no belo pasto que se formou já no primeiro ano do projeto. Dois anos depois, ela entrou com o plantio de eucalipto, o que representou mais sombra e conforto para o gado e menos emissão de carbono na atmosfera, além de um novo incremento financeiro para a propriedade.
Em pouco mais de dez anos do início do projeto, a produtividade de soja passou de 45 sacas para média de 80 sacas por hectare e a de milho deu um salto, de 90 para 200 sacas por hectare. O principal avanço foi na pecuária, segundo a dentista que se tornou pecuarista e produtora rural. “Em 80 hectares da área mais produtiva da soja, fizemos um sistema de pasto rotacionado dividido em piquetes, em regime de semiconfinamento. Com isso, passamos de pouco mais de um bovino por hectare para 12 cabeças por hectare. O gado que saiu do sistema intensivo se adaptou e ganhou peso de forma excelente”, disse.
Após três anos, o rotacionado vai para outra área da fazenda e, nessa, volta o cultivo da soja. “Por ser uma área muito trabalhada na integração lavoura-pecuária, nossa expectativa é de que a soja produza 100 sacas por hectare. Isso prova que a intensificação sustentável é possível”, disse. O sistema de integração inclui o eucalipto que, além de dar sombra e abrigo para o gado, ajuda a cobrir os custos da fazenda. “Vamos fazer agora a colheita seletiva das árvores, até para redesenhar a floresta, melhorando a integração com a soja e o gado.”
Milho, soja e nelore mocho
Durante décadas, o pecuarista Carlos Viacava se tornou referência nacional em melhoramento genético de bovinos da raça Nelore Mocho, mas lutava contra a baixa produtividade das pastagens, localizadas em terrenos de solo arenoso. Em 2013, ele passou a adotar o ILP, na Fazenda Campinas, em Caiuá, no oeste paulista, modelo estendido a outras propriedades do grupo na região.
A fazenda intercala dois anos de agricultura e dois de pecuária. No primeiro ano, a soja é cultivada na safra e o milho para silagem na safrinha, consorciado com forrageiras como a braquiária, que são pastejadas no outono e inverno. No segundo ano, repete-se o cultivo da soja e do milho, mas em consórcio com o brizanta, outra variedade da braquiária. A pastagem permanece nos dois anos seguintes. Desde o início do sistema, a produtividade de milho para silagem quase dobrou, e a da soja aumentou mais do que duas vezes.
Também houve aumento na eficiência da pecuária, com a taxa de lotação – quantidade de bois por hectares – crescendo quase 60%. Também se observou um aumento no ganho de peso diário. Machos e fêmeas passaram a ser desmamados com maior peso e as novilhas passaram a reproduzir a partir dos 12 meses, e não mais aos 24 meses. A fazenda se tornou uma unidade de referência tecnológica de ILP em solos arenosos.
Soja com eucalipto
Quando comprou a primeira parcela da atual Fazenda Esperança, em Santa Carmen (MT), na década de 1980, o pecuarista Invaldo Weis pensava em trabalhar apenas com pecuária de corte. No final dos anos 90, após arrendar parte da propriedade para agricultores, decidiu também plantar soja e milho. O passo seguinte, sempre apoiado pela Embrapa, foi integrar lavoura e pecuária e, mais adiante, lavoura, pecuária e floresta.
Na safra 2021/22, Weis cultivou 2.680 hectares de soja e, desses, 2 mil foram plantados com milho de segunda safra. Outros 180 receberam plantas de cobertura e, dos outros 500, cerca de 60 hectares foram integrados também com floresta de eucalipto. Conforme o produtor, o novo sistema mudou o perfil do sistema de cria, permitindo a inversão da estação de monta. “O nascimento dos bezerros da estação invertida começa em meados de março e termina no final de julho, época mais propícia, evitando a perda de bezerros.”
Com o uso de calcário e a adubação dos pastos, ele conseguiu que as vacas fossem desmamadas com bom peso, acima de 500 quilos, o que antes era difícil. Weis cria a raça espanhola asturiana cruzada com nelore. A fazenda conta também com um confinamento para a terminação dos animais – o local é sombreado pelos eucaliptos para o conforto térmico do gado. “Antes de usar a integração, estação de monta invertida e terminação em confinamento, o gado ia para abate com 36 meses. Agora, são 26 meses no máximo”, disse.
Superpopulação
Dados do IBGE de 2022 apontam que o Brasil tem mais boi do que gente. São 203 milhões de habitantes, enquanto nossos pastos são povoados por 234 milhões de bovinos. O País é também o maior exportador de carne bovina do mundo. Incluindo outras carnes, o ramo pecuário fechou o ano passado com valor de produção de R$ 116,3 bilhões, crescendo 17,5% em relação ao ano anterior. O foco do Ministério da Agricultura e Pecuária, além de melhorar a pecuária e aumentar a produção, é tornar o setor mais sustentável.
Com esse objetivo, o Plano de Agricultura de Baixo Carbono (ABC) funcionou entre 2010 e 2020, contribuindo para reduzir o efeito estufa no campo por meio práticas e tecnologias sustentáveis. Em 2021 foi lançado o Plano ABC+, com duração até 2030, para reduzir os impactos da mudança climática. Conforme o coordenador de Mudanças Climáticas, Florestas Plantadas e Agropecuária Conservacionista do Ministério, Adriano Oliveira, o Plano ABC reduziu as emissões de gás de efeito estufa em quase 200 milhões de toneladas.
O ABC+ pretende, até o final da década, ampliar em 30 milhões de hectares as áreas destinadas à adoção de práticas para recuperação de pastagens degradadas.
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