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Pecuarista ajuda a recuperar rio e agricultora reduz uso de químicos

Mayara e Malena, de Mato Grosso do Sul, têm a preservação ambiental como prática diária em suas fazendas

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Atualização:

O que une uma pecuarista de corte e uma produtora de soja em Mato Grosso do Sul, além do amor à terra e à produção agropecuária? É a vontade de ser cada vez mais sustentável e de buscar, a todo momento, caminhos para isso. Mayara Martins de Souza Caldeira, criadora de bezerros da raça nelore na Fazenda Vereda do Buriti, em Camapuã, e Malena May, produtora de grãos nos municípios de Ponta Porã e Coronel Sapucaia, almejam, como diz a primeira, “estar sempre alinhadas com as necessidades de conservação ambiental”. Ao que Malena complementa: “Quando falamos em rentabilidade inevitavelmente esbarramos na sustentabilidade. Não dá para ser rentável sem ser sustentável”, afirma.

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Desde que a família de Mayara adquiriu a fazenda de 700 hectares há dez anos, para criar bezerros de corte, buscou sempre “aliar práticas de conservação ambiental”, garante, embora a degradação já existisse por ali quando foi adquirida, o que vem sendo revertido ano a ano.

Agora, juntamente com o Instituto Taquari Vivo, criado para estancar o severo assoreamento do Rio Taquari, que passa pelo Pantanal, sua família e o instituto estão transformando a Vereda do Buriti em uma fazenda modelo de conservação ambiental – o que, por tabela, contribuirá para resgatar o curso d’água da degradação.

Fazenda-teste

“Nós somos o projeto piloto para salvar o Alto Taquari”, diz a pecuarista. “O que já recebemos de fomento até agora foi a instalação de cercas em volta das nascentes (que impede o acesso do gado, garantindo a intocabilidade dessa área de preservação) e, mais recentemente, o Instituto Taquari Vivo entrou com máquinas para fazer o terraceamento e curvas de nível”, complementa.

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Engenheira agrônoma, Malena May diz que não é possível ser rentável sem ser sustentável Foto: Arquivo pessoal / Malena May

O terraceamento e as curvas de nível são técnicas eficientes para estimular a infiltração da água no solo, abastecendo o lençol freático e impedindo que as chuvas carreguem grandes quantidades de terra para o leito dos cursos d’água.

“O processo de assoreamento está intimamente ligado à erosão”, confirma o diretor do Instituto Taquari Vivo, Renato Roscoe, em vídeo. “Assim, para conter esse processo, e conservar o solo, fazemos bacias de contenção, terraceamento, melhoria e intensificação das pastagens”, continua. “Reduzimos a erosão na cabeceira do Taquari e o assoreamento a jusante.”

Na Vereda do Buriti, fazenda da família de Mayara Caldeira, dos 700 hectares, 25% são de mata nativa, ou 5% a mais do que exige o Código Florestal, conta a criadora. Em Mato Grosso do Sul, Estado que é considerado o “berçário” da pecuária de corte brasileira, pela sua grande produção de bezerros, a família de Mayara vende 200 desses animais por ano, de um rebanho total de 600 bovinos – sendo 400 vacas reprodutoras. “O restante é animal ao pé da vaca e novilhas.”

O projeto do Taquari Vivo chegou à propriedade por intermédio da própria Mayara, que, como jornalista, tomou conhecimento da iniciativa. “A partir daí resolvi falar com meu pai, Antonio Silvério de Souza, e minha mãe, Juceli Maria Martins Silvério de Souza, e eles toparam participar.” O próximo passo após o terraceamento é a recuperação de pastagem, diz. “A parceria com o Taquari Vivo foi essencial para garantir recursos.”

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Desta forma, quando todo o processo de recuperação ambiental se concluir, Mayara espera obter maior rentabilidade, com um pasto melhor, e gestão mais profissional e efetiva dos recursos. “Conseguimos unir o útil ao agradável”, diz ela, finalizando: “O lema da nossa fazenda é Conservar e Produzir”.

Na área de grãos, o exemplo de sustentabilidade vem da engenheira agrônoma e produtora rural Malena May, que cuida da parte técnica da empresa familiar, o Grupo Agro JMay. Em cerca de 900 hectares, nas Fazendas Valo Forte, em Ponta Porã, e Guatambu, em Coronel Sapucaia, ela cultiva soja no verão e milho no inverno, em sistema de rotação de culturas, respeitando e mantendo uma área de reserva legal de acordo com o que exige a lei.

Biológicos

Além de todos os cuidados no manejo do solo, com plantio da soja, seguido do milho com braquiária – esta para formar adubo verde e manter o solo coberto –, Malena destaca o uso de defensivos biológicos na lavoura para combater doenças e pragas. “Fazemos a produção de bioinsumos, em parceria com a empresa Solubio, dentro da própria fazenda, com custo baixo e alta qualidade”, destaca.

Cerca para proteção de nascente e mata ciliar na fazenda Veredas do Buriti, pertencente à pecuarista Mayara Martins de Souza Caldeira Foto: Renato Medeiros

Com o uso de biológicos, além da menor agressão ao meio ambiente, a produtora diz que reduziu em cerca de 40% o custo total por safra, “mantendo a produtividade”, assinala, comentando que o manejo biológico chegou a ser bastante criticado por causa do menor rendimento. “Mas nós tivemos boa produtividade, com 65 sacas de soja por hectare”, diz.

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Em relação à ferrugem da soja, a doença mais séria da cultura, Malena diz que há “coletores de esporos” do fungo causador instalados na lavoura. “São canos de PVC com lâminas que ficam sete dias ‘coletando’ eventuais esporos da ferrugem”, descreve. “Caso haja incidência, analisamos as folhas da soja para ver se há incidência do fungo nas plantas. Se houver, ainda avaliamos se as condições climáticas são favoráveis ou não à disseminação da doença e, só se forem, entramos com tratamento químico”, explica.

Pragas e doenças

Quanto às pragas, é possível controlar, via biológicos, “lagartas de amplo espectro, além de percevejos”, conta. Já com o milho, a produtora usa defensivos biológicos para prevenção das mais importantes doenças foliares da cultura e no controle de pragas como a cigarrinha, percevejos e lagartas.

“Na atual safra, o nosso objetivo é cobrir 100% da área de soja com inseticidas biológicos”, diz a agricultora, acrescentando que faz aplicação de produtos químicos apenas como curativo em caso de alta incidência de doenças, mas, na medida do possível, consorciado com o biológico, para reduzir custos e o impacto ambiental.

Ela diz que, com esse manejo, as plantas ficam mais resistentes a variações climáticas. “Na nossa região o clima é muito instável”, diz. “Tivemos anos muito secos, mas conseguimos manter o rendimento porque usamos biológicos”, garante ela, explicando que, quando se aplicam pesticidas na lavoura, a planta se ressente também e fica mais vulnerável às variações climáticas. “Ela sofre um estresse para absorver a molécula química, o que não ocorre com biológicos.”

Outra prática conservacionista que Malena pretende adotar na próxima safra é a diversificação de culturas de inverno. Atualmente, 100% da área de soja recebe o milho em seguida. “Na próxima safra queremos reservar 30% da área para testes com trigo, aveia ou plantas de cobertura, tanto para melhorar o solo como para servir de adubo verde”, diz. “A partir daí pretendemos rotacionar, toda safra, pelo menos 30% da área.” Isso contribuirá para reduzir os riscos climáticos do milho de inverno. “Nossa região é muito quente no verão e muito fria no inverno, o que pode afetar o milho”, justifica. “Queremos eliminar o risco de quebra da safrinha plantando aveia e trigo.”

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