O agronegócio brasileiro enfrenta um desafio para os próximos anos: o País precisa produzir ainda mais alimentos, sem aumentar o desmatamento. Essa equação passa pelos 100 milhões de hectares de pastagens degradadas. É pela recuperação dessa área que o País pode aumentar a sua produção sem desmatar e reduzir a pegada de carbono, seja pelo uso pela pecuária, seja pela conversão para a agricultura, seja pela integração das atividades.
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Dos 161 milhões de hectares ocupados por pastagem no Brasil, 63% apresentam algum grau de degradação, sobretudo na Amazônia e no Cerrado, segundo dados mais recentes do Laboratório de Processamento de Imagens e Geoprocessamento (Lapig) da Universidade Federal de Goiás (UFG), referentes a 2021. A recuperação das áreas vem ocorrendo, mas há muito para avançar. Hoje, o País converte organicamente de 1 milhão a 2 milhões de hectares de áreas degradadas em áreas agricultáveis por ano, por iniciativa própria dos produtores. Atualmente, o financiamento para conversão de pastagens ocorre por meio do RenovaAgro (antigo Plano ABC+), no Plano Safra.
Meta ambiciosa
Agora, o governo federal quer acelerar esse movimento para até 4 milhões de hectares por ano. O objetivo é recuperar 40 milhões de hectares em dez anos, sendo parte destinada novamente à pecuária e outra parte convertida para a agricultura, conforme a aptidão de cada área. “Enquanto muitos países começam a recuar na produção de alimentos, nós vamos intensificar porque sabemos fazer isso com sustentabilidade e respeito ao meio ambiente”, disse o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, recentemente. “Quando convertemos pastagem degradada que é emissora de gás carbônico em pastagem com tecnologia e grande área foliar há sequestro de carbono.”
O custo médio estimado pelo ministério para conversão de pastagens é em torno de US$ 3 mil por hectare, o que geraria um investimento total de, no máximo, US$ 120 bilhões (equivalente a R$ 600 bilhões), considerando a meta de recuperação de 40 milhões de hectares em dez anos. Para tal, o governo quer oferecer linhas de crédito direcionadas à conversão para os produtores rurais.
Segundo Carlos Ernesto Augustin, assessor especial do ministro da Agricultura, o objetivo do governo é captar recursos estrangeiros voltados à segurança alimentar com produção de baixo carbono e buscar parcerias com a iniciativa privada para fomentar o programa, sobretudo de fundos soberanos, bancos de investimento e multinacionais do agro. “Há inúmeros interessados em aderir ao programa. A trading Cofco, a Agência de Cooperação Internacional do Japão (Jica), o Korea Export Import Bankem, fundos da Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos já manifestaram intenção de integrar o projeto”, afirmou.
A ideia é de que a captação de capital estrangeiro ocorra por meio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) como uma espécie de fundo garantidor. Esses recursos serão ofertados aos produtores com taxas de juros mais competitivas e maior limite individual do que o crédito convencional, em nível ainda a ser definido, diz Augustin. A expectativa é a de que o programa seja lançado em 22 de novembro.
Para o presidente do Instituto Mato-Grossense da Carne (Imac), Caio Penido, além do acesso a crédito ao pecuarista, o processo de recuperação das áreas exige também profissionalização. “O produtor está disposto a intensificar, mas precisa de um financiamento casado com os prazos da pecuária e assistência técnica para que a recuperação seja bem-sucedida. Intensificar e recuperar exige profissionalização, mudança de paradigma e investimento. Não é um processo simples”, observou Penido.
Oportunidade
Penido lembra que somente em Mato Grosso, maior produtor de grãos e carne bovina do País, mais de 14 milhões de hectares apresentam algum estágio de degradação. “Há o potencial de intensificar essas áreas para produzir mais alimento, fixando carbono no solo. É uma grande oportunidade para o Brasil atender às demandas globais de segurança alimentar e de segurança climática”, apontou. O Imac estuda, ainda, a criação de clusters de produtores próximos às indústrias para acelerar a recuperação dos pastos degradados.
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