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Análises sobre o cenário macroeconômico

Opinião|Como a ‘lição de Esparta’ se encaixa no debate sobre o ajuste fiscal no País

Todos sabem o que é necessário ser feito. O que nos falta são espartanos dispostos a fazer a coisa certa

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Foto do author Alexandre Schwartsman

Conta a lenda que, em determinado festival na Grécia Antiga, um velho procurava lugar para se sentar, sem que ninguém se dispusesse a ceder seu assento, até que, ao passar pela delegação espartana, todos se levantaram, devidamente aplaudidos pelos demais. O velho teria virado para os espectadores e bradado: “Todos os gregos sabem o que é certo; mas apenas os espartanos escolhem fazê-lo”.

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Lembrei-me dela acompanhando o debate sobre o ajuste fiscal no País. Não é preciso gênio para entender qual o tamanho do ajuste necessário, ou mesmo saber que medidas teriam maior chance de sucesso na empreitada, muito pelo contrário.

Dado o atual patamar da dívida, equivalente a cerca de 80% do PIB, uma conta simples, que considera tanto seu custo como o crescimento sustentável do PIB, indica que o setor público precisaria gerar uma “economia” (o superávit primário) da ordem de 2,5% do PIB. Tal valor impediria que a dívida crescesse sem limites, fenômeno que costuma levar a crises econômicas sérias.

Tudo indica que o conjunto de medidas sob estudo do governo é muito aquém do necessário Foto: Wilton Junior/Estadão

Por outro lado, as estimativas da Instituição Fiscal Independente, órgão de pesquisa sobre as contas públicas ligado ao Senado, o resultado do governo, uma vez limpo de receitas e despesas não recorrentes, assim como dos ganhos de arrecadação provenientes de uma economia superaquecida, resultariam em déficit da ordem de 1% do PIB.

Teríamos, portanto, de sair de -1% do PIB para +2,5% do PIB, ajuste de 3,5% do PIB, ou perto de R$ 400 bilhões. Isto é obviamente inexequível num único ano, mas também ninguém em sã consciência sugere que seja feito em intervalo tão curto.

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Caso seja um processo que se estenda por quatro ou cinco anos, mas amparado em medidas técnica e politicamente sólidas, já teria efeitos no sentido de dissipar os temores de insustentabilidade da dívida. Poderia, aliás, até reduzir seu custo, como ocorreu após a aprovação do teto de gastos em 2016, facilitando a tarefa.

Tudo indica, porém, que o conjunto de medidas sob estudo (e debate interno) do governo é muito aquém do necessário. Estudo recente sobre as contas públicas de Gabriel Leal de Barros e Johann Soares sugere que a economia de gasto poderia chegar a 0,5% do PIB, mas só em 2034! Sugere também que reajustar o salário mínimo apenas pela inflação, sem ganhos reais, poderia ter efeito muito maior, mas trata-se de área vetada pelo comando político, ainda mais em período que antecede eleições.

Todos sabem o que é necessário ser feito. O que nos falta são espartanos dispostos a fazer a coisa certa.

Opinião por Alexandre Schwartsman

Economista e consultor da A.C. Pastore

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