Incapazes de admitir sua parcela de culpa (100%) pela piora do ambiente econômico, que se materializa na perda de valor do real, o governo e seus minions atribuem o problema a um “ataque especulativo” contra a moeda nacional e aproveitam para exigir do Banco Central (BC) que enfrente o suposto ataque intervindo no mercado de câmbio.
Trata-se de uma tolice inacreditável. Ataques especulativos contra uma moeda surgem apenas no contexto de um regime em que o BC tente manter a paridade desta moeda relativamente ao dólar em patamar que é percebido como insustentável (por exemplo, a libra em 1992, ou o próprio real em 1999).
Como, para manter o câmbio fixo, o BC tem que se dispor a vender dólares para o mercado a um dado preço, especuladores conseguem comprá-los relativamente baratos, até que as reservas caiam a níveis que forcem o BC a abandonar a paridade, o dólar suba, e especuladores realizem um lucro extraordinário,
No Brasil, porém, o câmbio é flutuante. O BC não tem, a priori, compromisso de vender dólares a certo preço. Quem quer comprá-los, à vista ou no mercado futuro, empurra a cotação da moeda para cima, sem a “molezinha” de uma oferta a preço camarada do BC. Quanto mais compra, mais caro fica, o que eleva o risco para o comprador, em particular aquele que chega mais tarde.
Neste contexto, a intervenção do BC só dá ao mercado a oportunidade de comprar mais em conta do que comprariam sem a intervenção, ou seja, favorece o especulador.
É mais do que óbvio que a elevação do dólar reflete três fenômenos, nenhum deles afetado pela ação do BC no câmbio: o fortalecimento global da moeda norte-americana, a incapacidade de promover um ajuste fiscal que impeça a elevação persistente da dívida pública e, por fim, o palavrório do presidente sobre a “mudança de filosofia” no BC, quando Sua Sumidade puder indicar o novo presidente da autarquia.
Não é necessário gênio para entender que a mudança filosófica se traduziria, na prática, pela redução de juros sem maior compromisso com a inflação. Inflação mais alta e juros mais baixos implicam dólar mais caro à frente. Como ninguém espera até que o dólar suba sob nova direção, já compram agora, seguindo a dinâmica tradicional dos mercados financeiros.
Há um ataque por trás da alta do dólar, mas não um ataque especulativo do mercado e sim um ataque oportunista do presidente ao BC, alimentado por pesquisas sugerindo que retórica inflamada pode ajudá-lo a ganhar uns trocados de popularidade, embora apenas até a mudança no BC.
Um clássico caso de língua solta.
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