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Análises sobre o cenário macroeconômico

Opinião | E se os EUA forem obrigados a elevar os juros? Alta jogaria lenha na fogueira da Selic

Sem medidas compensatórias do lado do gasto público, o Banco Central brasileiro seguirá com o fardo de impedir a aceleração da inflação

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Foto do author Alexandre Schwartsman

Em dezembro do ano passado, os membros do comitê de política monetária do Federal Reserve (Fomc, o equivalente ao Copom) sinalizaram que fariam ainda duas reduções de 0,25 ponto porcentual na taxa básica de juros nos EUA, levando-a, assim, a 4,00% ao ano no final de 2025. Os juros futuros por lá apreçam algo similar, talvez um pouco mais cauteloso. Ainda assim, há, por enquanto, certo consenso de que a taxa de política monetária continuará a cair, como tem feito desde setembro.

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Recentemente, porém, li um artigo interessante de Thanos Papassavas no Financial Times, em que argumentava que o Fomc seria obrigado a elevar os juros, revertendo o processo de afrouxamento iniciado em setembro do ano passado.

Há dois motivos para isso. Em primeiro lugar, a força da economia americana, que segue se expandindo mesmo operando muito próxima, senão além, do pleno emprego, o que causaria pressões inflacionárias. Em segundo, as políticas do presidente Trump: elevação de tarifas sobre as importações, novos estímulos fiscais e a possibilidade (remota a meu ver) de deportações em massa, que agravariam a escassez de trabalho, acirrando a tensões já existentes sobre os preços domésticos.

Se tivéssemos elevação da taxa de juros nos EUA em 2025, dólar ganharia ainda mais força Foto: Jose Luis Magana/AP

Trata-se, acredito, de uma possibilidade real, embora o mercado de renda fixa não reflita tais riscos. Caso este risco se materialize, haverá consequências relevantes, em particular no que se refere ao comportamento das moedas.

Nos meses finais de 2024 já observamos o dólar ganhar terreno considerável contra as demais moedas desenvolvidas, em particular o euro e o iene, na esteira da revisão dos cortes esperados para 2025: eram então quatro (ou seja, 1 ponto porcentual de redução) e caíram a apenas dois, como notado acima.

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Caso, no lugar de tais cortes, tivéssemos elevação da taxa de juros, presumivelmente em algum momento na segunda metade de 2025, o dólar ganharia ainda mais força. Dado que movimentos globais do dólar representam parcela relevante — ainda que não a mais importante — do comportamento do real, isso significa perda adicional do valor da nossa moeda, portanto pressões inflacionárias adicionais.

Desta forma, muito embora a política monetária do BC tenha que refletir a inflação brasileira, e não necessariamente a política monetária americana, me parece claro que a elevação de juros nos EUA joga lenha na fogueira da Selic.

Sem medidas compensatórias do lado do gasto público, o BC seguirá com o fardo de impedir a aceleração da inflação. A maldição do juro alto tem razão de existir.

Opinião por Alexandre Schwartsman

Economista e consultor da Pinnotti & Schwartsman Associados

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