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Opinião|Se o BC subiu juros e recuperou a confiança, equipe econômica liberou gastos e gerou pessimismo

Decisão dos Ministérios do Planejamento e da Fazenda de reduzir a contenção de despesas aumentou a desconfiança, enquanto o Banco Central recuperou prestígio ao iniciar novo ciclo de alta da Selic

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Foto do author Alvaro Gribel

A decisão da equipe econômica de liberar recursos do Orçamento, mesmo com as contas públicas no piso da meta fiscal, significa o mesmo que o Banco Central reduzir a Selic com a inflação no teto da meta de inflação. Na última semana, a autoridade monetária aumentou os juros e recuperou a confiança. Já os Ministérios do Planejamento e da Fazenda reduziram a contenção de gastos, e isso desencadeou uma nova onda de pessimismo na economia.

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Secretários das duas pastas estão incomodados com as críticas. Alegam que as projeções no início do ano apontavam para um déficit em torno de 1% do PIB, e agora o governo se aproxima do piso da meta, que permite um déficit de 0,25% do PIB. Houve, na visão deles, um enorme esforço fiscal que não está sendo reconhecido pelo mercado financeiro.

Um dos problemas, como vêm apontando exaustivamente analistas em contas públicas, é que resultado fiscal desconsidera R$ 40 bilhões em despesas, que não são contabilizados para fins de cumprimento da meta, ao mesmo tempo em que incorpora qualquer tipo de receita atípica, ainda que ela aconteça uma única vez.

Secretários da Fazenda e do Planejamento, durante divulgação do quarto relatório bimestral de receitas e despesas de 2024. Foto: Washington Costa/Ministério da Fazenda

Pela contabilidade da Fazenda e do Planejamento, dinheiro novo entra no caixa e serve para cumprimento da meta. Já as despesas imprevistas saem da conta – como precatórios e gastos com efeitos das mudanças climáticas. Ainda que tudo esteja dentro da lei, já que houve autorização do Congresso, do ponto de vista econômico, trata-se claramente de dois pesos e duas medidas.

Com a dívida bruta se aproximando de 80% do PIB, o risco é que a economia entre em um cenário de “dominância fiscal”, quando o Banco Central se vê impedido de elevar a taxa Selic. Isso porque o aumento dos juros teria um impacto tão grande sobre a dívida, que os investidores entenderiam o seu custo como impagável. A consequência seria uma forte desvalorização do real, com aumento da inflação. Exatamente o oposto do objetivo pretendido.

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A encruzilhada da economia depende de o ministro Fernando Haddad conseguir convencer o presidente Lula a enfrentar a indexação dos gastos obrigatórios. O tempo está passando sem que essa agenda avance.

Ao contrário: Lula continua a repetir convicções sem sentido na área econômica, o que só aumenta as incertezas. Sem essas medidas, o resultado fiscal melhor de 2024 será apenas um ponto fora da curva, que não mudará em nada as estimativas sombrias para os próximos anos.

Opinião por Alvaro Gribel

Repórter especial e colunista do Estadão em Brasília. Há mais de 15 anos acompanha os principais assuntos macroeconômicos no Brasil e no mundo. Foi colunista e coordenador de economia no Globo.

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