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Análise | Banco Central cobra ‘transparência’ na política fiscal e alerta para risco de juros ainda mais altos

Copom diz que política fiscal ‘expansionista’ pressiona inflação e aumenta juros neutros; para órgão, é preciso haver ‘regras previsíveis’ sobre os resultados das contas públicas

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Foto do author Alvaro Gribel

O Banco Central reforçou que continuará subindo os juros na próxima reunião, mas não quis adiantar se manterá o ritmo de alta de 0,25 ponto porcentual ou se irá acelerar para 0,5 no próximo encontro, em novembro. O mais importante da ata do Copom divulgada na manhã desta terça-feira, 24, contudo, foram os recados dados em relação à política fiscal. Na última semana, o BC subiu a Selic de 10,5% para 10,75% de forma unânime.

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Segundo o BC, a política fiscal no governo Lula está “expansionista” e isso tem dificultado o trabalho de controle da inflação. Além disso, num tom mais duro até então sobre as contas públicas, o BC cobrou “regras previsíveis” e disse que “transparência nos resultados” são elementos fundamentais para o controle das expectativas.

“Uma política fiscal crível, embasada em regras previsíveis e transparência em seus resultados, em conjunto com a persecução de estratégias fiscais que sinalizem e reforcem o compromisso com o arcabouço fiscal nos próximos anos são importantes elementos para a ancoragem das expectativas de inflação e para a redução dos prêmios de riscos dos ativos financeiros, consequentemente impactando a política monetária”, diz trecho da ata.

Membros do Copom, do Banco Central; autoridade monetária decidiu aumentar os juros em 0,25 ponto porcentual na semana passada Foto: Raphael Ribeiro/BC

Nas últimas semanas, vem crescendo as críticas no mercado financeiro sobre a condução da política fiscal. Dois projetos elaborados pelo Ministério de Minas e Energia (MME), mas que contaram com a assinatura do Ministério da Fazenda, chamaram atenção.

Um deles tentava aumentar os gastos com o Auxílio-Gás, mas por meio de uma triangulação envolvendo a Caixa, sem que essa despesa entrasse no Orçamento. Além disso, foram concedidos benefícios fiscais para um projeto de navios-tanques, com depreciação acelerada, mas sem as devidas contrapartidas. A medida foi suspensa pelo Tribunal de Contas da União, como mostrou o Estadão.

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‘Juro neutro mais alto’

O Banco Central também afirmou que há risco de aumento dos juros neutros da economia — taxa Selic que não tem efeito sobre a inflação — em caso de “esmorecimento” de reformas e disciplina fiscal, aumento do crédito direcionado e estabilização da dívida pública.

“O comitê reforçou a visão de que o esmorecimento no esforço de reformas estruturais e disciplina fiscal, o aumento de crédito direcionado e as incertezas sobre a estabilização da dívida pública têm o potencial de elevar a taxa de juros neutra da economia, com impactos deletérios sobre a potência da política monetária e, consequentemente, sobre o custo de desinflação em termos de atividade.”

O BC, por outro lado, também apontou que “incorpora em seus cenários” a desaceleração no ritmo de crescimento dos gastos, em um sinal de apoio à equipe econômica.

Ritmo de alta em aberto

Na ata, o BC explicou que todos os membros do Copom votaram para que o aumento dos juros tivesse início com uma alta de 0,25 ponto. Por isso, a Selic subiu de 10,5% para 10,75% na reunião da semana passada.

Para frente, no entanto, os membros do colegiado preferiram não dar “indicação futura” sobre os próximos passos.

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“O comitê debateu o ritmo e a magnitude do ajuste da taxa de juros, bem como sua comunicação. Em virtude das incertezas envolvidas, o comitê preferiu uma comunicação que reforça a importância do acompanhamento dos cenários ao longo do tempo, sem conferir indicação futura de seus próximos passos, insistindo, entretanto, no seu firme compromisso de convergência da inflação à meta”, afirma o documento.

A reunião deste mês foi a primeira após a indicação do economista Gabriel Galípolo para a presidência do Banco. Hoje, ele ocupa a diretoria de Política Monetária. Seu voto, assim como os dos outros três diretores já indicados por Lula, foram iguais aos dos cinco diretores herdados do governo Bolsonaro, incluindo o presidente Roberto Campos Neto.

Análise por Alvaro Gribel

Repórter especial e colunista do Estadão em Brasília. Há mais de 15 anos acompanha os principais assuntos macroeconômicos no Brasil e no mundo. Foi colunista e coordenador de economia no Globo.

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