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Análise | Mercado vê pacote de corte de gastos como última chance para governo recuperar confiança na economia

Com cenário internacional mais incerto e aumento do dólar, investidores entendem que ou o governo corta gastos agora ou não haverá outra chance com a proximidade das eleições presidenciais

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Foto do author Alvaro Gribel

Enquanto a cúpula do governo, incluindo o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, participa da reunião do G20 no Rio de Janeiro, o mercado financeiro aguarda com ansiedade o anúncio previsto para esta semana do pacote de corte de gastos. Entre investidores, a visão é de que esta é a última oportunidade para o governo reverter a desconfiança que paira sobre a economia e que se reflete principalmente no mercado de juros futuros e nas projeções para a inflação e a dívida pública.

O número que circulou em Brasília, de R$ 70 bilhões de cortes em 2025 e 2026, ainda carece de explicações. Não ficou claro, nas conversas de Haddad com parlamentares, sobre o que serão esses cortes e se estão incluídas na conta novas medidas de “pente-fino” em programas sociais. Por isso, além do número em si, será preciso analisar a consistência de cada medida, para saber o que é “estrutural”, ou seja, mudança permanente, e o que é apenas “conjuntural”, ações que terão duração curta sobre as contas governo.

O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad.  Foto: WILTON JUNIOR/Estadão

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A demora do anúncio também está pesando contra a equipe econômica. Embora interlocutores da Fazenda aleguem que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediu “ampla discussão” entre os ministérios para que ele fosse bem informado para tomar a decisão, o fato é que houve uma forte valorização do dólar no período - impulsionado também pela eleição de Donald Trump nos EUA - e dificilmente a cotação voltará ao patamar anterior ao início da discussão.

O mesmo vale para outros indicadores, como as expectativas de inflação. Para se ter uma ideia, nas últimas quatro semanas, o Boletim Focus, do Banco Central, subiu as projeções para o IPCA deste ano de 4,5% para 4,64% (acima do teto da meta), e para o do ano que vem, de 3,99% para 4,12%. Ao mesmo tempo, as estimativas para a Selic subiram de 11,25% para 12% ao ano em 2025. Ou seja, mesmo apostando que o BC vai continuar elevando os juros, houve piora nas projeções.

A explicação passa justamente pelo risco fiscal, que coloca o Brasil em uma situação de vulnerabilidade, em cenário internacional mais incerto. A eleição de Trump anulou parte da redução dos juros prevista para acontecer nos EUA. Agora, a expectativa é de que os cortes serão em menor intensidade - por causa das políticas inflacionárias propostas por Trump - e isso irá afetar moedas de países emergentes e com problemas, como o Brasil.

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Desde o início do governo Lula, a dívida bruta saltou de 71,7% do PIB, em dezembro de 2022, para 78,3%, em setembro deste ano - um aumento de quase sete pontos porcentuais. Isso torna mais custoso para o governo fazer a rolagem da sua dívida, via pagamento de juros.

Com o real mais desvalorizado, por culpa desse cenário mais desfavorável e do risco fiscal, a tendência é de que a inflação continue pressionada. E, aí, o Brasil poderá entrar em uma espiral negativa: a desconfiança bate no dólar, pressiona a inflação, impulsiona os juros e diminui o ritmo de atividade. A consequência é uma nova piora na percepção fiscal, realimentando o ciclo.

Num cenário extremo, o Brasil pode entrar no que os economistas chamam de “dominância fiscal”, quando o Banco Central não consegue mais conter a piora das expectativas de inflação simplesmente aumentando a taxa Selic.

Como os anos de 2025 e 2026 são mais próximos das eleições presidenciais, o pacote de agora é visto como uma espécie de “vai ou racha” na política fiscal. A última chance de o governo mostrar que está, de fato, comprometido com as contas públicas, ou se está disposto a seguir um caminho que já deu errado no governo Dilma Rousseff.

Análise por Alvaro Gribel

Repórter especial e colunista do Estadão em Brasília. Há mais de 15 anos acompanha os principais assuntos macroeconômicos no Brasil e no mundo. Foi colunista e coordenador de economia no Globo.

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