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Opinião | Pacote errou ao criar falsa expectativa na política e perder o que restava de confiança na economia

Com PIB em alta e pobreza no menor nível desde 2012, momento era de ajuste nas despesas para tornar sustentáveis os programas sociais do governo

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Foto do author Alvaro Gribel

O ex-ministro Antonio Palocci foi o único petista a entender a importância de o governo conduzir as expectativas do mercado financeiro. Quando isso acontece, tudo fica mais barato para o País, porque há queda nas projeções de inflação e redução dos juros pagos pelo Tesouro ao rolar a sua dívida. O governo atual, ainda que sob enorme boa vontade do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, desconsidera esse princípio fundamental das boas práticas econômicas.

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Lula e o PT enxergam o mercado como inimigo, mas, como explicaram os economistas Marcos Lisboa e Felipe Salto, em live promovida pelo Estadão, os investidores perderam dinheiro nos últimos dois anos porque apostaram a favor do real e na queda da taxa Selic. Ou seja, acreditaram que haveria racionalidade na condução da política fiscal, já que Lula colheu bons indicadores sobre as contas públicas em seus dois primeiros mandatos.

O pacote da última semana foi um erro econômico, mas também político. O erro econômico vem do fato de que houve uma visão de curto prazo, com objetivo de fazer o governo chegar a 2026 sem estrangular as despesas discricionárias, aquelas que o Executivo tem liberdade para cortar, como investimentos e gastos de custeio.

O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante evento no Palácio do Planalto.  Foto: Wilton Junior/Estadão

A prova dessa visão equivocada foi a fala da ministra do Planejamento, Simone Tebet, durante entrevista coletiva, quando afirmou que não valeria a pena estabelecer um teto de 2,5% para o crescimento dos gastos com saúde e educação porque a economia seria nula no curto prazo.

O olhar do estadista, contudo, seria exatamente o oposto: se a economia se dará no futuro, será mais fácil convencer os dois setores de que a medida não é tão dolorosa quanto parece à primeira vista. Resolve-se de uma vez o problema que vai crescer posteriormente e colhe-se de imediato os ganhos de confiança.

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Na política, o erro parece ter sido fruto de improviso. A promessa da isenção do IR até R$ 5 mil foi entendida pela população como algo para agora, e levou inclusive a Comunicação do Palácio do Planalto a soltar uma nota afirmando que o projeto já havia sido enviado ao Congresso, como mostrou o Estadão – o que não era verdade.

Nas redes sociais, o deputado federal André Janones (Avante-MG) postou uma foto ao lado do ministro Haddad afirmando que “ninguém que ganha até R$ 5 mil paga Imposto de Renda mais”. A expectativa foi criada, mas a realidade é que a medida só vai se concretizar, no melhor dos cenários, em 2026.

Na terça-feira, 3, o IBGE divulgou mais um número forte do PIB. Nesta quarta-feira, soube-se que a pobreza caiu ao menor nível desde 2012, fruto da crescimento da economia, do programa Bolsa Família e da política de valorização do salário mínimo. O ajuste fiscal era apenas para desacelerar o crescimento das despesas e tornar esse bom momento sustentável nos próximos anos. Mas o governo e o PT se desesperaram e lançaram mais estímulos na economia.

Opinião por Alvaro Gribel

Repórter especial e colunista do Estadão em Brasília. Há mais de 15 anos acompanha os principais assuntos macroeconômicos no Brasil e no mundo. Foi colunista e coordenador de economia no Globo.

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