Americanas: advogados prepararam ações coletivas fora do Brasil

Acionistas estrangeiros querem ressarcimento por prejuízo por problemas nos balanços da varejista; processo levou petroleira a fechar acordo de US$ 2,95 bilhões para encerrar o litígio

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RIO - Advogados se preparam para apresentar ao Judiciário dos Estados Unidos processos coletivos contra a Americanas, cobrando ressarcimento por causa dos problemas nos balanços financeiros anunciados pela companhia na semana passada. Esse tipo de ação judicial, comum no mercado financeiro norte-americano, pode impor perdas bilionárias às empresas envolvidas.

Os escritórios Antonelli Advogados, de Leonardo Antonelli, e a banca americana Katsky & Korins já reúnem acionistas interessados em uma ação coletiva (class action). Em outra frente, o advogado André Almeida está nos Estados Unidos preparando uma ação coletiva para acionistas e debenturistas da Americanas.

Plano de ação na corte de NY

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Os escritórios Antonelli Advogados e a banca americana Katsky & Korins foram procurados por três acionistas estrangeiros com certificados de ações (ADR) listados na Bolsa de Nova York e um banco nacional com larga carteira de clientes afetados pela crise, afirma Leonardo Antonelli.

Após reuniões de dia inteiro desde o fim da semana passada, foi alinhada a estratégia de reclamar compensações financeiras especificamente da auditoria PWC e de membros solventes do Conselho de Administração da Americanas. Entre eles estão o multibilionário Carlos Alberto Sicupira, um dos três sócios de referência, e Paulo Alberto Lemann, filho de Jorge Paulo Lemann, que também integra o trio.

Para Antonelli, frente aos prazos arrastados da “inevitável” recuperação judicial no Brasil, uma ação coletiva diretamente na corte de Nova York é, estatisticamente, o caminho mais “célere e eficaz” para reparação.

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“A recuperação judicial, se bem-sucedida, vai implicar a submissão de todos os credores concursais a um deságio massivo, algo que por vezes supera 90% dos volumes de dívidas, além de um parcelamento que pode se arrastar por décadas. A recuperação judicial por si só vai dar um pirulito e uma banana aos credores”, continua Antonelli, em referência à limitação do instrumento, mais focado em dar sobrevida à empresa do que propriamente ressarcir o investidor.

O advogado aponta os resultados dos processos pelos quais passaram o Grupo X, de Eike Batista, e a empresa de telefonia OI. E, na pior das hipóteses, lembra que se a Americanas for à falência, podemos ter uma “nova Mesbla”, cujo ressarcimento a credores trabalhistas levou 15 anos. Ontem, escritórios como o Almeida Law, gestoras e grupos de debenturistas já se movimentavam nessa direção e, pelo visto até agora, dificilmente Americanas e partes envolvidas escaparão de uma pesada class action nos Estados Unidos.

Quase centenária, Americanas passa por crise que pode levar à recuperação judicial Foto: Reuters


Direito ‘bom’

Hoje advogado dos maiores acionistas privados de Petrobras, Antonelli cita casos de sucesso de ações desse tipo nos quais atuou nos EUA, como os que envolveram a própria estatal, a empreiteira OAS e a Sadia. Desta vez, diz ele, o direito é bom por se tratar necessariamente de erro ou fraude.

“Na prática, é quase irrelevante tratar-se de erro contábil ou fraude. Alguém solvente deverá suportar os prejuízos, seja a auditoria, sejam membros da alta administração”, explica. “A notícia da recuperação judicial é ainda mais surpreendente quando olhamos para a remuneração global dos administradores”.

Em 2022, diz Bernardo Watanabe, que atua no caso como associado no escritório de Antonelli, os acionistas aprovaram pagamento de R$ 65 milhões aos seus altos executivos, boa parte ligados aos acionistas de referência.

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“É um aumento significativo, de 75%, em relação aos R$ 37 milhões aprovados e pagos em 2021″, observa. Houve, ainda, a distribuição de R$ 516 milhões na forma de juros sobre capital próprio, deixando apenas R$ 27 milhões para a constituição de reserva legal. Não bastasse, o Ministério Público de São Paulo apura possível caso de “insider trading”, visto que executivos da Americanas venderam mais de R$ 200 milhões em ações da companhia desde meados do ano passado.

Tudo isso deve encorpar os argumentos das class actions na justiça americana e complicar a vida da defesa em um ambiente jurídico notabilizado por condenações duras, que costumam empurrar as partes para acordos robustos. É também nisso que Antonelli aposta. Ele destaca a tendência histórica da PWC em fechar acordos para evitar julgamento. Num dos casos mais simbólicos, a falência do banco MF Global, a PWC optou por fazer acordo sigiloso para encerrar o litígio de US$ 3 bilhões sem assunção de culpa.

Antonelli afirma que eventual decisão favorável da Justiça americana também alcançaria acionistas e debenturistas brasileiros.

“A Justiça (dos EUA) pode obrigar os culpados a ressarcir integralmente os prejuízos dos investidores, tenham eles investido nos EUA ou no Brasil”, diz.

Na leitura de um magistrado brasileiro ouvido na condição de anonimato, o argumento é factível, mas sua realização não é trivial. Isso porque se trata de uma ação coletiva capaz de gerar uma decisão genérica, mas que depois deve ser executada por cada beneficiário junto à Justiça local. Isso impõe a brasileiros dificuldades práticas maiores, ainda que não insuperáveis.

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Lava Jato

André Almeida está nos Estados Unidos preparando uma ação coletiva para acionistas e debenturistas da Americanas, como fez em relação à Petrobras durante a Operação Lava Jato, informou ao Estadão/Broadcast o presidente da Associação Brasileira de Investidores (Abradin), Aurélio Valporto.

Em 2018, a Petrobras fechou um acordo para pagar US$ 2,95 bilhões para encerrar uma ação nos EUA por causa da corrupção revelada pela Operação Lava Jato. No caso da Americanas, a ação deve ser dirigida também a debenturistas, segundo Valporto. Ele tenta evitar que no caso da Americanas os acionistas brasileiros fiquem de fora do ressarcimento, como ocorreu com os acionistas da Petrobras. A ideia é fazer uma ação coletiva também no Brasil.

“Estamos com o mesmo escritório do André Almeida e o escritório Wolf Popper de Nova York, que fez a maior ação do mundo (Petrobras). A Americanas tem ADRs (certificados de ações) e tem uma classe de debenturistas, que é um volume representativo”, disse Valporto, sem saber precisar ainda o número de possíveis clientes.

Segundo ele, a preocupação desta vez é de que os acionistas brasileiros tenham os mesmos direitos que os norte-americanos. “Podemos entrar também com arbitragem coletiva. O estatuto da empresa tem cláusulas de arbitragem”, afirmou.

Valporto criticou a posição do BTG Pactual de querer receber seus créditos antes dos demais prejudicados pela Americanas. Ele afirmou que a empresa deve ser preservada, já sua que quebra não prejudicaria apenas os acionistas, mas toda a economia brasileira.

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“A Americanas tem capacidade de gerar caixa, o problema é o fluxo de caixa, tem que continuar, não só pelos acionistas, mas por afetar empregos e a economia”, disse.

De acordo com a advogada Andrea Seco, sócia de André no Almeida Advogados, no momento estão sendo preparadas as estratégias e conversas com gestores de fundos, bancos e debenturistas nos Estados Unidos .

“A ‘class action’ está sendo preparada, estamos conversando com o mercado, acredito que nos próximos 15 a 30 dias teremos muitas novidades”, explicou Seco, referindo-se ao prazo que a Justiça deu à empresa para decretar Recuperação Judicial. O escritório mantém em seu site um formulário para acionistas interessados em participar da ação.

“Os próximos dias são muito importantes para termos um quadro mais claro para montar nossa estratégia”, afirmou.

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