A notícia de que a Americanas encontrou um rombo de R$ 20 bilhões no seu balanço financeiro, descoberto pela gestão do agora ex-presidente Sérgio Rial, e nesta quinta-feira, 19, entrou com um pedido de recuperação judicial introduziu no dia a dia dos brasileiros novos verbetes do dicionário de “economês”. Termos como “risco sacado” e “forfait” foram parar nas discussões na internet sobre o caso diante do rombo de R$ 43 bilhões no caixa da varejista.
De acordo com o Google Trends, as buscas na ferramenta de pesquisa por “forfait o que é”, “forfait significa” e “risco sacado como funciona” tiveram um aumento repentino na última quinta-feira, 12, em meio às primeiras notícias envolvendo a Americanas.
Recuperação judicial
A analista de investimentos da Empiricus Larissa Quaresma conta que esses termos são utilizados para nomear um tipo de operação de crédito comum em negócios do mercado varejista e atacadistas, principalmente nas empresas que carregam um elevado nível de estoque, a exemplo da Americanas e seu serviço de e-commerce.
Para entender essa operação, é preciso destacar todos os agentes envolvidos na negociação: o fornecedor, a empresa e o banco. Se usarmos o exemplo da Americanas, é possível dizer que a varejista compra a prazo de um fornecedor e para adiantar o pagamento pede emprestado a um banco. “O banco é chamado de ‘sacado’, porque precisou emprestar do seu caixa para honrar o acordo comercial entre as partes”, afirma.
Neste contexto, para receber antes do prazo contratual, o fornecedor aceita receber o valor do negócio com um desconto, enquanto para garantir esse pagamento adiantado a companhia recorre ao sistema bancário.
“Nessa operação, então, o ‘risco sacado’ está no banco, que enfrenta o risco de a Americanas não pagar o prometido e assim o banco ‘perderia’ dinheiro”, explica a analista. “Os bancos pagam os fornecedores da empresa no lugar da companhia. E a empresa passava a dever ao banco em um prazo maior, o que incorre a um custo financeiro.”
Leia também
A analista da Empiricus explica a operação com um exemplo hipotético: imaginemos que a Americanas comprou dez produtos de uma fornecedora a R$ 10 cada um, totalizando R$ 100, com prazo de 30 dias para pagar. Essa fornecedora quer receber antes desses 30 dias, mas a Americanas quer um prazo maior. A solução é contratar uma operação de crédito de “risco sacado” com um banco.
Ocorreria, portanto, a seguinte operação:
- O banco antecipa o pagamento à fornecedora cobrando dela um juro de antecipação de R$ 20. Ela paga, então, R$ 80 pela compra.
- A Americanas, por sua vez, paga R$ 110 para o banco apenas no final do prazo contratado e, por isso, paga R$ 10 de juros pela operação.
- O banco é chamado de “sacado” porque precisou emprestar R$ 80 do seu caixa para honrar o acordo comercial entre as partes.
- A fornecedora é chamada de “cedente”, porque cedeu ao banco o seu direito de receber R$ 100 vindos da Americanas.
- A Americanas é o devedor final, pois vai amortizar o empréstimo de R$ 100 + juros contratados.
O problema dessa operação, segundo Danielle Lopes, sócia e analista da Nord Research, é que, por se tratar de uma operação de crédito, essa movimentação precisa ser discriminada no balanço como dívida, levando-se em consideração a questão dos juros bancários, algo que não teria sido feito pela Americanas.
“Você acaba distorcendo a situação financeira, porque há uma dívida com o banco”, afirma. “Outro problema é que os bancos olham essa questão para decidir se liberam mais linhas de crédito. A situação dele afeta o relacionamento com o sistema bancário”, complementa a analista.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.