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Líder de mercado na Oliver Wyman, Ana Carla Abrão trabalhou no setor financeiro a maior parte de sua vida, focada em temas relacionados a controle de riscos, crédito, spread bancário, compliance e varejo, tributação e questões tributárias.

O Brasil não sabe educar

Os cursos de pedagogia não atraem os melhores e formam mal aqueles que atraem

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Por Ana Carla Abrão

Educação pública básica gratuita, em um país injusto como o Brasil, é política de redução de desigualdade e, justamente por isso, um imperativo social. Afinal, educação é acesso a oportunidades e à possibilidade de uma vida melhor. Sendo tudo isso, deveria ser prioridade de Estado, e não apenas o slogan bonito de um governo que nasceu morto em 2015. Mas há muitos anos já não é.

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Embora tenhamos avançado na universalização do ensino, garantindo acesso à escola a 94,2% das crianças entre 4 e 17 anos, e tenhamos dobrado a escolaridade média da nossa população entre 1990 e 2016, nossas conquistas não vão muito longe quando se avalia a qualidade dessa educação. Ao contrário, os números olhados com mais profundidade desenham um quadro devastador que nos condena a um futuro de atraso.

Dados compilados pela Todos pela Educação, Oscip (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público) criada com foco em educação básica, expõem a situação precária da educação pública no Brasil. Na matemática, apenas 43% dos alunos que chegam ao final do 5.º ano do ensino fundamental têm aprendizagem adequada. No 9.º ano, esse número cai para 18%, e chega aos vergonhosos 7% na 3.ª série do ensino médio. Ou seja, 93% dos nossos jovens que completam o ensino médio não sabem resolver problemas de porcentagem ou uma equação de 2.º grau.

Da mesma forma, os números do Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes), coordenado pela OCDE, mostram que os nossos resultados não são nada alentadores. Conseguimos avanços até 2009, mas desde então nossa avaliação vem caindo, atingindo um resultado que coloca nossos melhores alunos abaixo dos piores alunos de países como o Vietnã ou a Estônia. Com uma nota média de 396 pontos nas avaliações de leitura e matemática em 2015, estamos abaixo da média da América Latina e em situação muito inferior aos demais países emergentes.

O problema por trás da baixa qualidade da nossa educação é complexo e, como tantos outros que estão presentes no Brasil de hoje, exige enfrentar as questões de frente – e em suas diversas dimensões. Neste caso como em outros, não será aumentando gastos públicos que teremos resultados melhores.

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O Brasil já gasta o equivalente a 5,5% da renda nacional bruta em educação, muito acima da média mundial de pouco mais de 4%, e mais do que gastam Reino Unido, Estados Unidos ou Canadá. Dependemos, por outro lado, da realocação de recursos, revertendo o foco colocado na educação superior, e de mudanças estruturais no sistema atual de gestão da educação.

Há sim questões relativas a melhoras na formação de professores. Como ressalta o Todos pela Educação, nossos cursos de pedagogia têm pouca atratividade e baixíssima efetividade. Não atraem os melhores e formam mal aqueles que atraem. Não preparam para a docência e pouco investem no ensino da arte de ensinar. Indicações políticas e baixa exposição à aprendizagem são outras fontes dos péssimos resultados.

Mas há um outro conjunto relevante de distorções que precisa ser considerado – e alterado. O professor de uma escola pública precisa estar sujeito aos incentivos corretos, à avaliação de resultado, à demissão por baixa performance e à cobrança pelo rendimento do aluno. Há que se indignar com o absenteísmo e com a baixa aprendizagem. Há que se evoluir na gestão, há que se perguntar quantos professores estão fora de sala de aula – e quantos mais há que se contratar por conta disso. Há que se racionalizar o número de escolas e reduzir a ociosidade para que se possa ter no ensino integral a regra, e não a exceção.

Se na escola privada os instrumentos de gestão funcionam para os filhos daqueles que podem pagar, mais ainda deveriam para os que dependem do ensino público para que seus filhos tenham uma vida melhor. 

O futuro das nossas crianças e jovens e, portanto, do Brasil, depende de colocarmos os interesses políticos em segundo plano, alçando ao primeiro as escolhas públicas que tenham no aluno e na qualidade de ensino as reais motivações. Afinal, educar é muito mais do que garantir acesso à escola.

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*ECONOMISTA E SÓCIA DA CONSULTORIA OLIVER WYMAN. O ARTIGO REFLETE EXCLUSIVAMENTE A OPINIÃO DA COLUNISTA

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