O cenário do saneamento básico no Brasil em pleno século 21 é, no mínimo, vergonhoso. De acordo com os dados do Ministério do Desenvolvimento Regional, no Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS 2018), cerca de 35 milhões de brasileiros não tem acesso à água tratada, mais de 100 milhões não têm coleta de esgoto e apenas 46% dos esgotos gerados são tratados. Significa que jogamos, todos os dias, mais de 5700 piscinas olímpicas de esgotos na natureza trazendo doenças, internações, afastamentos da escola, perdas de dias de trabalho. Em 2016, nas 100 maiores cidades do Brasil, 72% da população que habita nas áreas irregulares não tinha acesso nem à água nem ao esgotamento sanitário.
Não ter acesso aos serviços faz com que a saúde da população fique precária e vulnerável, especialmente num momento de pandemia como esse. Em 2018, mais de 230 mil brasileiros foram internados por doenças da água poluída. Como esses casos continuam ocorrendo, é certo que essas pessoas com doenças de veiculação hídrica correm mais riscos e atualmente disputem leitos com os acometidos pela covid-19.
Estudos do Instituto Trata Brasil mostram que, caso o Brasil conseguisse universalizar o saneamento básico em 20 anos, o Sistema de Saúde Único (SUS) poderia economizar até R$ 6 bilhões com essas internações. Em resumo, o estudo mostra que os ganhos econômicos e sociais trazidos pela expansão do saneamento seriam de até até R$ 1,1 trilhão, juntando economia nos gastos de saúde, melhoria da educação, turismo, renda, produtividade, valor das moradias, impostos e empregos. Isso mostra que investir em saneamento básico será fundamental para melhorar também a economia do país, o que será fundamental no momento de retomada das atividades do país, pós pandemia.
O complicado é que os investimentos em saneamento estão bem abaixo do mínimo necessário para a tão sonhada universalização. Temos investido cerca de R$ 12 bilhões por ano, quando precisaríamos em torno de R$ 25 bilhões a R$ 30 bilhões, pelo menos, pensando em 20 anos para que toda a população tivesse acesso à mais elementar das infraestruturas. Atingir investimentos desta ordem, de acordo com o próprio Ministério da Economia, poderá se concretizar com a aprovação do Novo Marco Regulatório do Saneamento. Ele proporcionará mais segurança jurídica e espaço para que o setor ganhe escala, atraia mais investimentos públicos e privados e deixe de ser um setor ineficiente num modelo que não dá mais conta do tamanho do problema.
*PRESIDENTE EXECUTIVO DO TRATA BRASIL
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