Nos grandes eventos de origem climática ocorrem dois tipos de danos. Os danos causados pelo evento e os danos de responsabilidade civil, que são danos causados por alguém a outro alguém, em função de sua ação ou omissão, depois da ocorrência do fenômeno natural.
As quedas de árvores, enchentes, desmoronamentos, rompimento de fiação de energia e comunicação são danos diretamente decorrentes do evento climático que se abate sobre uma determinada região. São danos materiais inevitáveis em função da severidade do evento.
Não há como impedir a queda de uma árvore submetida à pressão de ventos de mais de cem quilômetros por hora. Não há como impedir a enchente de uma zona de baixada com 100 milímetros de chuvas. Não há como impedir o deslizamento de terra quando o terreno já está encharcado e a precipitação é de mais de 100 milímetros. E assim sucessivamente. Tanto faz os Estados Unidos ou o Brasil, diante de um evento de grandes proporções, não há força humana capaz de conter os danos. Eles acontecem e pronto. A natureza é mais forte.
Daí serem chamados de “força maior” ou “atos de Deus”. E as indenizações decorrentes deles são de danos materiais. Não há responsabilidade humana diretamente envolvida. O máximo que podemos fazer é adotar medidas que mitiguem as perdas, não mais do que isso. Que o digam os furacões nos Estados Unidos ou as chuvas no Rio Grade do Sul.
De outro lado, há os danos decorrentes das ações ou omissões culposas dos responsáveis pelas medidas para minimizar os prejuízos e restabelecer os serviços afetados. Não existe uma tabela cientificamente elaborada para determinar qual o momento em que o serviço passa a ser defeituoso, mas existem critérios de razoabilidade aplicáveis a cada caso e que servem de parâmetros para determinar o que é um serviço defeituoso, ou seja, uma ação ou omissão culposa do agente encarregado da prestação do serviço.
O Código de Defesa do Consumidor tem regras impositivas que determinam a responsabilidade civil objetiva do prestador de serviços que deixa de cumprir sua obrigação. Para o Código, basta a falha na prestação para a responsabilização do agente. Evidentemente, na prática, diante de um evento como a tempestade que se abateu sobre São Paulo no dia 11 de outubro, não há como se aplicar a regra da responsabilidade civil objetiva da concessionária do serviço no caso do não restabelecimento da energia elétrica em 24 horas.
Mas o princípio da razoabilidade impõe um limite para que a energia seja restabelecida e, com certeza, ele é de menos de cinco dias. A concessionária de serviço público tem que conhecer o serviço que presta e estar aparelhada para fazer frente a toda sorte de imprevistos que possam ocorrer e afetar sua operação. Se a concessionária subdimensiona sua capacidade de reação, ela responde pelos danos decorrentes da sua incapacidade operacional. De outro lado, é importante frisar que cabe ao Estado fiscalizar a capacidade operacional da concessionária, e que não fazer isso corretamente implica em responsabilidade civil dele também.
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