BRASÍLIA - Em uma indicação de que a estratégia de manutenção da taxa Selic por um tempo prolongado estaria no caminho correto para levar a inflação para o “redor da meta”, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central destacou, na ata da sua reunião de outubro divulgada nesta terça-feira, 1.º, os impactos “já perceptíveis” do maior ciclo de alta de juros da sua história no crédito e na atividade econômica. O Comitê ainda considerou que o ritmo de crescimento da economia perdeu força e deve continuar nessa direção nos próximos meses, com menor efeito do estímulo fiscal já concedido e maior impacto do ciclo “intenso e tempestivo” da Selic.
No encontro de setembro, ao manter a taxa Selic em 13,75% ao ano, o Copom decretou o fim do mais longo ciclo de alta de juros da sua história e o mais forte desde 1999, com um aumento acumulado de 11,75 pontos porcentuais. Na semana passada, o comitê optou pela estabilidade da taxa pela segunda vez consecutiva e voltou a dizer que se manterá “vigilante” para avaliar se a estratégia de manutenção do juro básico por um período “suficientemente prolongado” será capaz de garantir a convergência da inflação. No mercado, a expectativa é de que o primeiro corte da taxa ocorra em junho de 2023.
“O Comitê debateu os impactos, já perceptíveis, da política monetária nos dados de crédito e atividade econômica”, disse o Copom na ata. Segundo o BC, se observa um impacto na composição das concessões de crédito para as famílias e no aumento moderado da inadimplência, “em parte associados a uma dinâmica na renda real disponível que sugere retração”.
Os dados do próprio Banco Central mostram que o ritmo de concessões de novos empréstimos caiu bastante no crédito livre. O crescimento de novas operações ainda é de 25,2% nos últimos 12 meses até setembro, mas avançou apenas 0,9% no terceiro trimestre deste ano - período no qual a Selic atingiu seu patamar atual. Nas divulgações mensais, o órgão tem ainda destacado o crescimento de linhas emergenciais, como o cheque especial e o rotativo do cartão de crédito, modalidades com taxas de juros de três dígitos.
Os impactos na inadimplência são ainda mais perceptíveis. Em fevereiro do ano passado, antes do início do ciclo de alta nos juros, a inadimplência total no crédito livre estava em 2,9%, saltando para 4,0% em setembro de 2022, no maior nível desde maio de 2020. Nessa comparação, a inadimplência das famílias aumentou ainda mais, de 4,1% para 5,7%. Esse é o maior índice de atrasos superiores a 90 dias desde agosto de 2017.
Mesmo com a moderação nas concessões, o Banco Central segue apostando em novo crescimento significativo do estoque do crédito livre em 2023, com alta total de 9,6% e avanços de 10,0% e 9,0% para pessoas físicas e jurídicas, respectivamente. As projeções foram divulgadas no Relatório Trimestral de Inflação (RTI) de setembro.
Nível de atividade
Em relação à atividade econômica no geral, o BC citou uma nova redução na estimativa de hiato do produto frente à sua última atualização, mas ponderou que prevê aumento da ociosidade ao longo dos próximos anos, em função do forte aumento de juros já empreendido. “O impacto da política monetária e suas defasagens aponta para uma redução do ritmo da atividade econômica, que tende a se acentuar nos próximos trimestres”, disse o BC, na ata.
A autoridade monetária ainda admitiu que a reabertura econômica do setor de serviços e que os estímulos fiscais ainda impulsionam o consumo. Mas espera que esses incentivos percam força, embora destaque a incerteza sobre o aumento de gastos permanentes a partir do próximo ano. Eleito presidente no último domingo, 30, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) prometeu na campanha a manutenção do Auxílio Brasil em R$ 600, além de um adicional por criança, e o retorno da valorização real do salário mínimo - medidas que incentivam o consumo.
Como o BC voltou a indicar na ata, é preciso ver a evolução da inflação de serviços, mais sensível ao ciclo econômico e à política monetária, para avaliar se o freio na atividade está fazendo efeito e quando o Copom deve iniciar o ciclo de corte de juros. Por ora, o BC avalia que as projeções de inflação seguem “compatíveis com a estratégia de atingir o redor da meta ao longo do horizonte relevante”, apesar da alta recente para 2023 e 2024. Para o ano que vem, a projeção é de 4,8%, marginalmente acima do teto da meta de 4,75%, e, para 2024, de 2,9%, aquém do alvo central de 3,0%.
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