A política monetária global segue sem direção única. Enquanto a maioria dos países emergentes avança nos cortes de juros, os bancos centrais das nações desenvolvidas ainda caminham para dar o primeiro passo da flexibilização, no aguardo da movimentação do Federal Reserve (Fed).
Na quarta-feira, 20, o banco central americano manteve os juros no intervalo entre 5,25% e 5,50% ao ano e indicou a realização de três reduções neste ano, mas não sinalizou quando começará o ciclo de afrouxamento. Já o Banco do Japão (BoJ), na contramão da tendência global, subiu os juros pela primeira vez em 17 anos, na terça-feira, 19, e encerrou um período de oito anos de taxas negativas.
Desde o dia 7 de março, quando o Banco Central Europeu (BCE) manteve as taxas de juros inalteradas e preparou o terreno para um corte em junho, os bancos centrais de dez países - Austrália, Brasil, China, Estados Unidos, Japão, México, Noruega, Reino Unido, Suíça e Turquia - já realizaram reuniões de política monetária, com decisões díspares entre si.
Na quinta-feira, 21, por exemplo, o Banco da Suíça (SNB) surpreendeu os analistas e cortou as taxas em 25 pontos-base, em um movimento destacado por analistas como pioneiro dentre desenvolvidos na rodada de flexibilização. A expectativa era de manutenção dos juros, na mesma toada dos países emergentes, ainda que uma redução já estivesse no radar.
Segundo o Rabobank, a decisão foi baseada na trajetória confortável da inflação, a ponto de o SNB reduzir as estimativas para o indicador neste ano, de 1,9% para 1,4%, e no ano que vem, de 1,6% para 1,2%. O banco holandês considerou o corte “inusitado” e passou a projetar novas reduções, com o SNB acompanhando os futuros cortes do BCE.
O movimento do banco central suíço contribuiu para a percepção de que já há espaço para alívio monetário nas economias avançadas, segundo o BMO Capital Markets. “Os formuladores de políticas em Zurique estão reagindo ao ritmo da inflação de uma forma não muito diferente do que é esperado por outros bancos centrais no curto prazo”, diz a instituição canadense, em relatório.
De olho em junho
Apesar das movimentações mundo afora, o Fed, o BCE e o Banco da Inglaterra (BoE) permanecem com posturas cautelosas. Analistas acreditavam, antes da decisão da autoridade monetária europeia, que a instituição estaria aguardando o início da flexibilização nos Estados Unidos. A presidente do BCE, Christine Lagarde, afirmou, no entanto, que muitos dados adicionais serão analisados antes da reunião de junho, o que foi interpretado pelo mercado como uma abertura de portas para o início da flexibilização.
Nos Estados Unidos, a aposta majoritária para o começo dos cortes também recai sobre junho e foi reforçada pela sinalização do Fed de que haverá três reduções neste ano. O presidente da instituição, Jerome Powell, disse que o repique inflacionário de janeiro e fevereiro teve natureza sazonal, o que também foi entendido pelos analistas como uma indicação de que o afrouxamento deverá mesmo começar em junho.
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Na quinta, o Banco da Inglaterra manteve os juros inalterados pela quinta reunião consecutiva. Oito dos nove membros do Comitê de Política Monetária do BoE votaram pela manutenção das taxas. O placar indica que as vozes mais conservadores da instituição abandonaram a defesa de mais aperto monetário e passaram a pregar a estabilidade nos juros.
O presidente do BoE, Andrew Bailey, disse ver “sinais encorajadores” sobre a inflação, que desacelerou à taxa anual de 3,4% em fevereiro - considerando o índice de preços ao consumidor (CPI). No comunicado da instituição, o que chamou a atenção dos investidores foi a afirmação de que a inflação está evoluindo “na direção correta”. A frase foi interpretada como um sinal de que o BoE mantém o corte de juros no radar, apesar da inflação no país seguir mais elevada do que nos EUA e na zona do euro.
Ainda na quinta, o Norges Bank, da Noruega, também não mexeu nas taxas e afirmou que pretende mantê-las inalteradas “por algum tempo”, já que o forte avanço dos salários e a depreciação da coroa norueguesa no ano passado bloqueiam uma queda acelerada da inflação. Apesar do cenário não tão favorável, a Capital Economics acredita que o Norges Bank também iniciará a flexibilização em junho.
O Banco da Reserva da Austrália (RBA), que seguiu a tendência e manteve os juros inalterados nesta semana, deverá ser o último da fila dos países desenvolvidos a cortar as taxas, segundo a Oxford Economics - ainda que a consultoria considere a decisão mais recente menos agressiva do que as anteriores. Ainda de acordo com a Oxford Economics, a inflação na Austrália deverá permanecer “teimosamente resistente” neste ano, o que elimina a chance de redução dos juros em junho.
Emergentes indicam abrandamento de cortes
No Brasil, o Banco Central anunciou na quarta um corte de 50 pontos-base na taxa Selic, mesmo nível adotado em todas as reuniões desde o início da flexibilização, em agosto. A instituição sinalizou, no entanto, que poderá desacelerar o ritmo das reduções a partir de junho. Analistas acreditam que cortes de 25 pontos-base entraram no radar da instituição.
Já o Banco do México (Banxico) cortou as taxas em 25 pontos-base na quinta, mas a decisão não foi unânime. Dos cinco dirigentes da instituição, uma votou pela manutenção dos juros. O comunicado do banco central mexicano diz que os riscos para a trajetória da inflação “se mantêm inclinados para uma alta”, o que o mercado encarou como uma sinalização para um ciclo de afrouxamento mais brando. Mesmo assim, a S&P Global espera que o Banxico realize cortes da mesma magnitude em todas as reuniões até o fim do ano, apesar do “elevado grau de incerteza” sobre a inflação no país.
A China, por sua vez, manteve as principais taxas inalteradas na reunião desta semana, depois de ter reduzido os juros de referência pra empréstimos (LPRs) de 5 anos em fevereiro. Segundo a Pantheon, como o primeiro corte de juros do Federal Reserve (Fed) deve ocorrer apenas em junho, é provável que haja menos espaço de manobra para o Banco do Povo da China (PBoC) reduzir antecipadamente as taxas, “uma vez que a estabilidade do yuan continua a ser a principal prioridade” da instituição. O governo chinês deverá usar a política fiscal como principal ferramenta de estímulo econômico, com a política monetária como apoio.
Mesmo assim, a Pantheon prevê mais duas flexibilizações das taxas da linha de empréstimo de médio prazo (MLF) de 1 ano e também da LPR de 1 ano em 2024. A LPR de 5 anos, porém, deverá ter apenas mais um corte neste ano, de 10 pontos-base, em agosto, segundo a consultoria.
Japão e Turquia sobem juros, mas Japão deve seguir cauteloso
Já o Banco Central da Turquia pendeu para o lado conservador, com o anúncio da elevação da taxa em 500 pontos-base, na quinta. A fixação dos juros em 50% ao ano faz parte do esforço para conter a inflação galopante no país. A decisão foi inesperada, visto que o consenso era de manutenção, mas uma reaceleração dos preços em fevereiro fez a instituição elevar os juros e sinalizar que mais apertos podem vir em um futuro próximo. Segundo o BBH, a decisão é parte da tentativa do banco central de recuperar o atraso, já que manteve as taxas inalteradas por muito tempo em meio à escalada da inflação.
Enquanto isso, a postura do Banco do Japão foi considerada mais flexível, a despeito da primeira alta de juros em 17 anos, anunciada no início da semana. O BoJ elevou a taxa de depósitos de -0,1% para a faixa de 0% a 0,1%, mas informou que manterá a política acomodatícia. Para a Fitch, ainda que a inflação no Japão esteja mais forte do que nos últimos anos, há espaço limitado para mais aceleração dos preços no médio prazo, sobretudo porque o iene deve se fortalecer entre 2024 e 2025.