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Análise|BC alerta sobre risco fiscal, aumenta a taxa de juros neutra e não descarta voltar a subir a Selic

Ata do Copom indica um cenário mais desafiador para a política monetária, após a decisão unânime de interromper os cortes da Selic em 10,5%

Foto do author Alvaro Gribel
Atualização:

O Banco Central deu vários recados ao governo brasileiro na Ata do Copom divulgada na manhã desta terça-feira, após interromper o corte da Selic em 10,5%, em decisão unânime, na última semana. Por ora, não há sinais de novas reduções iminentes da taxa Selic, o que só voltará a ocorrer após “firme compromisso de convergência da inflação à meta”.

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Como a Ata abandonou o chamado “guidance”, ou indicação clara sobre o que o BC fará no futuro, isso abre as portas até para um possível aumento da Selic, caso haja uma piora significativa do cenário nos próximos meses. O Copom, como sintetizou um analista de mercado, está “dependente” dos dados para definir os seus próximos passos.

A condução da política monetária ficou mais desafiadora, com o aumento da estimativa feita pelo Banco Central sobre a taxa neutra de juros, de 4,5% para 4,75%. Isso quer dizer que a economia brasileira perdeu dinamismo - ou está com PIB potencial mais baixo - e precisará agora de uma taxa Selic mais alta para se conseguir levar a inflação para a meta de 3%.

Brasília, 31/01/2024 - Reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central do Brasil. Foto: Raphael Ribeiro/BCB Foto: Raphael Ribeiro/BC

Há várias causas para isso apontadas pelo Banco Central, entre elas, a incerteza sobre a dívida pública e o “esmorecimento no esforço de reformas estruturais”, recados que servem tanto para o Executivo quanto para o Legislativo do país.

“O Comitê reforçou a visão de que o esmorecimento no esforço de reformas estruturais e disciplina fiscal, o aumento de crédito direcionado e as incertezas sobre a estabilização da dívida pública têm o potencial de elevar a taxa de juros neutra da economia, com impactos deletérios sobre a potência da política monetária e, consequentemente, sobre o custo de desinflação em termos de atividade”, disse a Ata.

Três causas para fim do corte

O Banco Central deu três motivos principais para parar de cortar os juros na última reunião: cenário externo mais incerto, atividade mais forte no País – com ênfase para o mercado de trabalho e o consumo das famílias – e a piora das expectativas de inflação. Esses três componentes demandam “maior cautela” na condução da política monetária e motivaram que a decisão fosse unânime.

Por tudo isso, a indicação é de que a Selic deve se manter “contracionista” por tempo suficiente, até que o cenário melhore.

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“A política monetária deve se manter contracionista por tempo suficiente em patamar que consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas. O Comitê se manterá vigilante e relembra, como usual, que eventuais ajustes futuros na taxa de juros serão ditados pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta”, disse o BC.

O Banco Central classificou o mercado de trabalho como “apertado”, o que sugere pressões principalmente sobre a inflação de serviços. Segundo o BC, os serviços foram tema de “muito escrutínio” por parte dos nove diretores do banco e terá papel “preponderante” para que a inflação volte para a meta.

“A inflação de serviços seguiu sendo um tema de muito escrutínio, analisando-se suas diferentes dimensões, defasagens e perspectivas. Parte do debate se concentrou na trajetória mais recente da inflação, em que a inflação de bens industriais e de alimentação no domicílio deixa de contribuir para a desinflação nesse estágio do processo desinflacionário. Concomitante a isso, a inflação de serviços, que tem maior inércia, assume papel preponderante na dinâmica desinflacionária no estágio atual.”

Reação política

O fim dos cortes abriu novas frentes de críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Lula vem apontando Campos Neto como um adversário político, e a presença do presidente do BC em um jantar oferecido pelo governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, em sua homenagem, contribuiu para elevar a temperatura política.

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A decisão unânime, contudo, jogou a favor de Campos Neto, já que os quatro diretores já indicados por Lula acompanharam a decisão. Entre eles, o diretor de Política Monetária, Gabriel Galípolo, cotado para presidir o banco ao término do mandato de Campos Neto, em dezembro.

Lula, contudo, ainda não bateu o martelo sobre o novo nome. Aliados próximos ao presidente confirmam que Galípolo ainda é o principal cotado, mas que sua irritação com o fim dos cortes da Selic poderiam mudar essa percepção. Galípolo, por sua vez, precisa demonstrar independência em relação ao governo e seguir critérios técnicos para o seu voto. Do contrário, as expectativas de inflação teriam uma piora adicional à frente.

Enquanto Lula não definir o novo nome, o mercado financeiro ainda colocará esse fator de risco sobre as suas projeções.

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Análise por Alvaro Gribel

Repórter especial e colunista do Estadão em Brasília. Há mais de 15 anos acompanha os principais assuntos macroeconômicos no Brasil e no mundo. Foi colunista e coordenador de economia no Globo.

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