BC terá ‘cabeças brancas’ para atuar na análise da compra do Master pelo BRB; leia bastidores

Servidores que acompanharam outros casos, como o do Bamerindus, Nacional e Cruzeiro do Sul, foram chamados para avaliar se o banco estatal é capaz de comprar parte do Master em todos os cenários de risco; preocupação é com a estabilidade do sistema financeiro

Foto do author Alvaro Gribel
Atualização:

BRASÍLIA - O Banco Central já se prepara para começar a análise técnica da proposta feita pelo BRB, banco estatal do Distrito Federal, para comprar uma fatia do banco Master. Internamente, alguns dos chamados ‘cabeças brancas’ do órgão regulador do sistema financeiro — servidores com experiência e que já acompanharam outros casos de fusão, intervenção e saneamento no setor — já foram avisados de que irão participar dos testes de estresse que serão rodados sobre o BRB.

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Esses servidores acompanharam casos como liquidações do Econômico, Bamerindus, Nacional e Cruzeiro do Sul, que enfrentaram crise no passado. O objetivo agora é tentar antecipar problemas que possam impactar o sistema financeiro.

Diretores e servidores que passaram pelo mercado financeiro também vão participar do processo de análise, para compor um olhar mais amplo, que incorpore também a expertise da Faria Lima.

A análise seguirá critérios estritamente técnicos, ou “by the book”. A preocupação do Banco Central é com a estabilidade do sistema financeiro, e, por isso, o olhar tem como objetivo final captar se o BRB é capaz de comprar o Master em todos os cenários de risco.

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Sede do Banco Central, responsável pela fiscalização do sistema financeiro  Foto: Foto: Dida Sampaio

Por isso, o BC não faz (em casos desse tipo) uma análise sobre a qualidade do negócio, mesmo que envolva o BRB, um banco público, controlado pelo governo do Distrito Federal, atualmente sob o comando de Ibaneis Rocha (MDB). Órgãos como o Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF) e o Ministério Público é que poderiam se posicionar sobre o ponto de vista do contribuinte.

Uma das preocupações que rondam o mercado financeiro é sobre ativos do Master ligados a precatórios, por exemplo. Precatórios são ordens de pagamento — é quando a Justiça obriga o município, o Estado ou a União a pagar, ao fim de uma ação judicial, uma dívida que tem com uma pessoa física ou jurídica. O BC fará vários tipos de simulações com essas aplicações, aplicando descontos nos papéis e seus impactos sobre o que aconteceria no balanço do BRB.

Parte importante do patrimônio que garantia a solidez do banco era composto por precatórios, que são de difícil recebimento. Por se tratar de um negócio de “balcão”, ou seja, fechado entre o Master e um outro vendedor, a análise será mais criteriosa, por não se tratar de um ativo negociado em bolsa, com liquidez (possibilidade de venda rápida) e cotações diárias, como câmbio, ações e títulos públicos e privados.

Em linhas gerais, as primeiras impressões dentro do BC são de que o processo não pode ser contaminado pelas pressões que virão do mundo político e das redes sociais. O entendimento é de que se a compra fosse feita por um banco privado, a pressão seria menor.

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A operação do Master, porém, está envolvida em polêmicas. O banco multiplicou por dez seu patrimônio e quintuplicou sua carteira de crédito desde 2021. Um dos motores desse crescimento foi a oferta de Certificados de Depósito Bancário (CDB) que pagam ao investidor taxas muito acima dos concorrentes, de até 140% do CDI.

Os CDBs são garantidos pelo Fundo Garantidor de Crédito (FGC). No ano passado, o volume de CDBs emitidos pelo Master e seus coligados equivalia a um terço do que o FGC tinha disponível em seu fundo, para ressarcir investidores em até R$ 250 mil, caso haja quebra de alguma instituição do sistema.

O Banco Central reajustou normas que tocavam nesses dois pontos, o que obrigou o Master a adequar suas operações.

Sem acesso a recursos de investidores institucionais e gestoras, o Master passou a captar recursos em fundos de pensão de Estados e municípios (RPPS), sendo o maior deles na cidade do Rio de Janeiro. O total chegou a R$ 800 milhões.

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O Master ficou dependente do aporte dos acionistas, que colocaram R$ 1,6 bilhão no primeiro semestre do ano passado para fortalecer o capital.

O banco tentou fazer captações internacionais, com títulos de dívida chamados bonds, no valor de US$ 500 milhões. Não foi bem sucedido.

O Master também tinha uma carteira grande de empréstimos corporativos feitos a empresas classificadas como em “situações especiais”, ou seja, dificuldades financeiras. Esses empréstimos são feitos diretamente ou via fundos ligados a investidores como Nelson Tanure. Os riscos dessas operações era carregado para o banco, sem que houvesse clareza de seu peso.

Formalmente, a análise da compra do Master pelo BRB ficará sob o guarda-chuva de duas diretorias do Banco Central. A de Fiscalização (Difis), a cargo do diretor Ailton de Aquino dos Santos, e a Diretoria de Organização dos Sistema Financeiro e de Resolução (Diorf), sob Renato Dias de Brito Gomes. O presidente Gabriel Galípolo se envolve também diretamente no processo, que ao final é submetido a toda diretoria

Legalmente, o Banco Central não tem prazo para concluir a análise, que poderá levar semanas ou meses. Até a noite de sexta-feira, o pedido de compra ainda não havia sido formalizado ao órgão controlador.