Magistrados de três Estados brasileiros receberam em 2019 um vale-refeição em valor superior até mesmo ao piso salarial do magistério. Os professores trabalham 40 horas semanais para garantir ao menos R$ 2.557 mensais, enquanto juízes e desembargadores de Pernambuco, Amapá e Acre colocaram no bolso um auxílio-alimentação que passou de R$ 3 mil por mês.
O benefício pago pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco chegou a ser o maior do País de maio a julho deste ano, com valores de R$ 4.320 a R$ 4.787. A partir de agosto, o benefício foi reduzido a R$ 1.068 mensais. Procurado, o TJPE não respondeu aos questionamentos da reportagem. O Tribunal de Justiça do Amapá (TJAP) paga a seus membros um vale-refeição que vai de R$ 3.200 a R$ 3.546 mensais. O órgão também não respondeu.
No Acre, o Tribunal de Justiça chegou a elevar o auxílio-alimentação para valores entre R$ 3.840 e R$ 4.255 em janeiro deste ano. A seccional local da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), porém, ingressou com um pedido de providências junto ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), alegando que o órgão federal não havia autorizado o aumento, que acabou sendo suspenso. Nos meses seguintes, o repasse foi de R$ 1.600 a 1.773.
O TJAC informou que o aumento havia sido “amparado em lei formal”, mas foi suspenso em fevereiro de 2019, “mantendo-se o pagamento da aludida verba (auxílio-alimentação) no porcentual anterior de 5% do subsídio”.
Em Roraima, os magistrados começaram o ano ganhando R$ 2 mil mensais em auxílio-alimentação, mas o valor caiu a R$ 1.424 a partir de março. Segundo o TJRR, “a redução ocorreu por uma decisão da presidência que, em razão do congelamento do Orçamento de 2019, instituiu o plano de contingenciamento”. O tribunal não informou se o corte permanecerá em 2020.
Em Goiás, Estado que enfrenta grave crise financeira e tenta acessar o programa de socorro federal, o Tribunal de Justiça aumentou em fevereiro o valor do vale-refeição de R$ 1 mil para R$ 1.160 mensais. O órgão informou que a alta de 16% se trata de um “pequeno reajuste” para “correção dos índices inflacionários do período”. O aumento anterior havia sido concedido em outubro de 2017. De lá até o início deste ano de, a inflação acumulada foi de 5,72%.
O TJ de Alagoas disse que o benefício mensal de R$ 1.520 está na média do que é pago pelos tribunais estaduais e, “a princípio”, não será ampliado em 2020. No Amazonas, o TJ informou que o reajuste do auxílio-alimentação em fevereiro, de R$ 1.669 para R$ 1.761, foi concedido para repor a inflação. O TJ do Ceará, onde o vale-refeição chega a R$ 1.188, afirmou que efetua o pagamento conforme os parâmetros definidos em uma resolução do CNJ de 2006.
O TJ do Maranhão tinha no início do ano o menor auxílio: R$ 726 mensais. A partir de novembro, porém, houve reajuste de 34%, para R$ 974. O TJMA não justificou o aumento. Os demais tribunais não responderam.
Reação
No Congresso, os altos valores do auxílio-alimentação dos juízes provocam reações fortes. “O Poder Judiciário se distanciou demais da realidade brasileira. Há um fosso muito grande entre o povo e a Justiça. Passou da hora de a sociedade reagir e de o Judiciário começar a dar sua cota de sacrifício”, disse o líder do Podemos, José Nelto (GO).
“Mais um absurdo, um puxadinho salarial injustificável. Em 2020, vamos rever todos esses excessos em uma reforma administrativa que atinja todos os Poderes em todos os Estados e municípios”, afirmou o líder do Novo, Marcel Van Hattem (RS).
Para a deputada Renata Abreu (Pode-SP), membro da Comissão de Educação da Câmara, “os dados mostram que estamos no caminho errado e que precisamos urgentemente colocar a educação como prioridade. Veja a completa inversão de valores no Estado brasileiro: o responsável por julgar e punir tem no Brasil muito mais valor do que aquele que é responsável por educar e prevenir. Com certeza, deveria ser o contrário”.
Tiago Mitraud (Novo-MG), também membro da Comissão de Educação da Câmara, diz que esses valores deveriam ser revistos. “Sou a favor da PEC dos Penduricalhos, de autoria do deputado Pedro Cunha Lima (PSDB-PB), que prevê que salários acima de um quarto do teto constitucional (cerca de R$ 10 mil) não devem receber auxílios.”
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