O Programa Emergencial de Acesso a Crédito (Peac), linha de garantia de crédito do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para empresas de menor porte, terá uma nova fase, com duração até dezembro de 2023. Principal medida do BNDES contra a crise causada pela covid-19, em 2020, o Peac poderá, na nova fase, avalizar mais R$ 20 bilhões em empréstimos. Agora, o programa aceitará também microempreendedores individuais (MEIs), além de pequenas empresas.
Lançado em meio à emergência da pandemia – o Estadão antecipou os planos sobre a medida em abril de 2020 –, o programa atacou um problema estrutural do Brasil, as dificuldades enfrentadas pelos pequenos negócios para tomar empréstimos.
A falta de garantias a oferecer aos bancos (como imóveis, fábricas ou fianças corporativas, entre outros) sempre foi apontada como um dos fatores por trás desse gargalo.
No auge da pandemia, isso poderia, inclusive, tornar inócuas outras medidas de facilitação de financiamentos, causando o que economistas chamam de “empoçamento de crédito”.
O Peac atacou o problema lançando mão de um fundo de aval, o Fundo Garantidor de Investimentos (FGI), que o BNDES já operava. Fundos de aval, ou de garantia, funcionam como um seguro-fiança para o aluguel imobiliário.
Sob determinadas regras, e cobrando uma taxa, esses fundos oferecem ao tomador do empréstimo a garantia, assim como o seguro-fiança permite ao inquilino firmar o contrato de aluguel da moradia sem fiador. Se o cliente do banco que ofereceu o empréstimo dá um calote, o aval oferecido pelo fundo cobre a perda da instituição financeira.
Em 2020, o primeiro passo do Peac foi a capitalização do FGI. No segundo semestre daquele ano, para aumentar o poder de fogo do fundo de aval, o Tesouro aportou R$ 20 bilhões. Além disso, as regras do FGI foram alteradas, flexibilizando a concessão de garantias para que os bancos participantes do Peac pudessem garantir um valor maior de financiamentos.
Com isso, o Peac garantiu, até 31 de dezembro de 2020, 135.720 empréstimos, tomados por 114.355 empresas, somando um valor total de R$ 92,1 bilhões. Os financiamentos foram concedidos por cerca de 40 bancos. Itaú (com R$ 15,657 bilhões), Bradesco (15,484 bilhões) e Caixa (R$ 15,094 bilhões) se destacaram na concessão dos empréstimos.
Terminado 2020, o Peac não aceitou novas operações. Até que, mais de um ano depois, teve a reabertura autorizada pela medida provisória (MP) 1.114, de abril passado. Conforme a MP, a nova rodada do Peac poderá garantir empréstimos firmados até 31 de dezembro de 2023. A portaria com as diretrizes para a reabertura foi assinada nesta segunda-feira, 20, pelo Ministério da Economia.
Dessa vez, não haverá novas injeções do Tesouro no FGI, informou o presidente do BNDES, Gustavo Montezano. A ideia é que os novos empréstimos a serem avalizados no Peac sejam garantidos por uma “reciclagem” de capital do fundo.
Ou seja, à medida que os financiamentos garantidos até dezembro de 2020 sejam pagos pelas empresas, retornando aos bancos comerciais, os valores comprometidos nos avais vão sendo liberados. Nas contas do BNDES, R$ 2,5 bilhões poderão ser liberados para avalizar novos empréstimos, considerando o prazo até o fim de 2023.
Esse valor poderá avalizar até R$ 20 bilhões porque haverá nova flexibilização nas regras do Peac – 30% dos recursos serão destinados para as empresas de menor porte. No fim das contas, a alavancagem passará de 1 para 8, ou seja, cada R$ 1 do FGI poderá garantir até R$ 8 em empréstimos concedidos pelos bancos comerciais participantes do Peac. Outra mudança, informou o BNDES, é que microempreendedores individuais (MEIs) poderão recorrer aos empréstimos garantidos pelo Peac.
Segundo Montezano, a reabertura até o fim de 2023, é “o primeiro passo no sentido de perenizar o Peac”. Para o presidente do BNDES, isso sinaliza uma nova forma de atuar do banco de fomento.
Em vez de oferecer crédito a juros subsidiados, abaixo das taxas cobradas pelo mercado, em títulos de dívida ou empréstimos de bancos comerciais, a estratégia é usar os recursos públicos para garantir os financiamentos oferecidos pelo sistema financeiro, aumentando, assim, o alcance da atuação do BNDES.
“Se estamos falando de orçamento público, para apoiar crédito, ficou claro que fazer equalização ou subsídio de taxa para grandes empresas é um recurso não tão bem utilizado. Se pegarmos esses recursos e dermos garantias para o pequeninho, o efeito na ponta é muito maior, é amplificado”, disse Montezano.
No caso dos pequenos negócios, isso seria ainda mais importante, porque a falta de garantias eleva os juros independentemente da taxa básica. Quando analisa o risco de um empréstimo para uma firma pequena, com garantias ruins e sem avais, o banco tende a classificar a operação como de alto risco, cobrando juros mais altos como forma de compensar a alta chance de levar calote, ou de perder o dinheiro de vez caso leve o calote.
É um dos motivos para elevar o “spread” entre o custo de captação para os bancos – próximo da taxa básica – e a taxa final que as instituições cobram dos clientes.
“O problema para o pequeno empresário não é a taxa básica, é a taxa final. O ‘spread’ de crédito é muito alto. Então, você comprime o ‘spread’ de crédito (ao oferecer garantias)”, afirmou Montezano.
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