RIO - O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) abriu nesta segunda-feira, 22, a nova fase do Programa Emergencial de Acesso a Crédito (Peac), linha de garantia de crédito para empresas de menor porte, principal medida da instituição de fomento contra a crise causada pela covid-19, em 2020. AAnunciada em junho, a segunda fase terá duração até dezembro de 2023, com potencial de garantir até R$ 22 bilhões em empréstimos, concedidos por bancos comerciais. A novidade da nova fase é que o programa aceitará também microempreendedores individuais (MEIs), além de pequenas empresas. Serão admitidos empréstimos a partir de R$ 1 mil.
Na última quinta-feira, 18, o presidente do BNDES, Gustavo Montezano, disse que a experiência do Peac mostrou que a figura do “fiador de crédito” para o “herói nacional”, numa referência aos pequenos empresários, é “muito eficiente”. Em meio à uma acirrada disputa para a presidência da República, Montezano também admitiu que a ampliação do programa para pequenos negócios guarda um caráter eleitoral.
“A classe política entendeu que, em vez de dar R$ 10 bilhões para uma empresa grande ficar com o subsídio para ela, dar R$ 1 bilhão para mil empresas pequenas é mais desenvolvimento social, mais desenvolvimento econômico, e mais voto no final do dia”, disse Montezano, durante um evento promovido pelo banco BTG Pactual.
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Nesta segunda-feira, 22, o diretor de Participações, Mercado de Capitais e Crédito Indireto do BNDES, Bruno Laskowsky, negou ao Estadão, porém, qualquer intenção eleitoral na reabertura do Peac. Segundo o executivo, a nova fase do programa de garantia de crédito já vinha em gestação há tempos, incluindo aí discussões com os bancos comerciais que operam no programa.
“Estávamos conversando há muito tempo, não é conjuntural. Quando definimos que a nossa estratégia no BNDES é ampliar a acessibilidade de crédito para as PMEs (pequenas e médias empresas), há três anos, tivemos conversas com o sistema (bancário) todo”, afirmou Laskowsky.
De acordo com o executivo, a experiência com a primeira fase do Peac, principal medida do BNDES para mitigar a crise causada pela covid-19, serviu para desenvolver o sistema de integração com os bancos comerciais que concedem os empréstimos garantidos e para calibrar modelos de análise de risco. Só que os cenários econômicos de 2020 e de agora são diferentes.
Na nova fase iniciada nesta segunda-feira, 22, o foco está na “força empreendedora” dos pequenos negócios, incluindo os MEIs, que precisam de financiamentos como “combustível” para crescer. “Na rodada emergencial, o tema era uma crise de risco. Havia liquidez, mas ela ficou represada. A engenharia foi dar um seguro para os agentes (financeiros, ou seja, os bancos comerciais integrantes do programa) se sentirem mais confortáveis para distribuir crédito”, disse o diretor do BNDES.
Agora, a ação é mais focada nos negócios realmente pequenos. “É mais segmentado. O MEI, com os juros mais altos, a crise geopolítica (como a guerra na Ucrânia), questões objetivas do Brasil (como a campanha eleitoral), tem mais dificuldade de pegar crédito no mercado”, afirmou Laskowsky.
Na primeira fase, o Peac garantiu, até 31 de dezembro de 2020, 135.720 empréstimos, tomados por 114.355 empresas, no valor total de R$ 92,1 bilhões. Os financiamentos foram concedidos por cerca de 40 bancos. . Itaú (com R$ 15,657 bilhões), Bradesco (15,484 bilhões) e Caixa (R$ 15,094 bilhões) se destacaram na concessão dos empréstimos.
Embora emergencial, a medida atacou um problema estrutural do Brasil, as dificuldades enfrentadas pelos pequenos negócios para tomar empréstimos. A falta de garantias a oferecer aos bancos - imóveis, fábricas ou fianças corporativas, entre outros - sempre foi apontada como um dos fatores por trás desse gargalo. Como resultado, as empresas pequenas têm empréstimos negados ou, quando recebem sinal verde, os juros são elevados. Na pandemia, o problema poderia tornar inócuas outras medidas de facilitação de financiamentos, causando o que economistas chamam de empoçamento.
Fundos de aval
O Peac lança mão de um fundo de aval, o Fundo Garantidor de Investimentos (FGI), que o BNDES já operava. Fundos de aval, ou de garantia, funcionam como um seguro-fiança para o aluguel imobiliário. Sob determinadas regras, e cobrando uma taxa, esses fundos oferecem ao tomador do empréstimo a garantia, assim como o seguro-fiança permite o inquilino firmar o contrato de aluguel da moradia sem fiador. Se o cliente do banco que ofereceu o empréstimo dá um calote, o aval oferecido pelo fundo cobre a perda da instituição financeira.
Em 2020, o primeiro passo do Peac foi a capitalização do FGI. No segundo semestre daquele ano, o Tesouro aportou R$ 20 bilhões. Além disso, as regras do FGI foram alteradas, flexibilizando a concessão de garantias para que os bancos participantes do Peac pudessem garantir um valor maior de financiamentos. Na nova fase, não haverá novas injeções do Tesouro. A ideia é que os novos empréstimos a serem avalizados no Peac sejam garantidos por uma “reciclagem” de capital do fundo. As alterações nas regras foram feitas para estimular os empréstimos para os MEIs.
Laskowsky não vê nem a elevação nas taxas básicas de juros, na comparação de 2020 com agora, nem as incertezas sobre a demanda agregada na economia como entraves para a nova rodada do Peac.
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