Uma greve de funcionários. Outra questão de segurança envolvendo seu problemático avião mais vendido. Uma queda no preço das ações.
O ano de 2024 já estava sendo desanimador para a Boeing, a gigante americana da aviação. Mas quando um dos jatos da empresa bateu contra um muro na Coreia do Sul no domingo, 29, matando 179 das 181 pessoas a bordo, encerrou-se um ano especialmente infeliz para a companhia.
A causa do acidente continua sendo investigada, e os especialistas em aviação foram rápidos em distinguir o incidente de domingo dos problemas de segurança anteriores da empresa.
Alan Price, ex-piloto-chefe da Delta Air Lines e que agora é consultor, disse que seria inadequado vincular o incidente de domingo a dois acidentes fatais envolvendo o problemático jato 737 Max da Boeing em 2018 e 2019. Em janeiro deste ano, um plugue de porta explodiu em um 737 Max enquanto ele estava em voo, levantando mais questões sobre o avião.
O Boeing 737-800 que caiu na Coreia, observou Price, é “um avião muito testado e aprovado”. É diferente do Max... É um avião muito seguro”.
Durante décadas, a Boeing manteve o papel de um dos gigantes da manufatura americana. Mas os repetidos problemas dos últimos anos foram prejudiciais. O valor das ações da empresa caiu mais de 30% em 2024.
A reputação de segurança foi especialmente manchada pelos acidentes com o 737 Max, que ocorreram na costa da Indonésia e na Etiópia com menos de cinco meses de diferença em 2018 e 2019 e deixaram um total de 346 pessoas mortas.
Nos cinco anos desde então, a Boeing perdeu mais de US$ 23 bilhões. E ficou atrás de sua rival europeia, a Airbus, na venda e entrega de novos aviões.
No último outono, 33 mil funcionários da Boeing entraram em greve, prejudicando a produção do 737 Max, o best-seller da empresa, do 777 e do 767. A greve durou sete semanas, até que os membros da Associação Internacional de Mecânicos e Trabalhadores Aeroespaciais concordaram com uma oferta que incluía 38% de aumento salarial em quatro anos.
Em janeiro, um plugue de porta explodiu em um 737 Max durante um voo da Alaska Airlines. Os órgãos reguladores federais reagiram impondo limites à produção de aeronaves da Boeing que, segundo eles, permaneceriam em vigor até que se sentissem confiantes quanto à segurança da fabricação na empresa.
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Em julho, a Boeing concordou em se declarar culpada de conspiração para cometer fraude por enganar os reguladores da Administração Federal de Aviação (FAA, na sigla em inglês) que aprovaram o 737 Max.
Agindo com base nas divulgações incompletas da Boeing, a FAA aprovou um treinamento mínimo, baseado em computador, em vez de um treinamento mais intensivo em simuladores de voo.
O treinamento em simulador teria aumentado o custo para as companhias aéreas operarem o Max e poderia ter levado algumas a comprar aviões da Airbus. (Os promotores disseram que não tinham provas para argumentar que a fraude da Boeing havia desempenhado um papel decisivo nos acidentes).
Mas a ação foi rejeitada neste mês por um juiz federal do Texas, Reed O’Connor, que decidiu que as políticas de diversidade, inclusão e equidade (DEI) no governo e na Boeing poderiam fazer com que a raça fosse um fator na escolha de um funcionário para supervisionar o cumprimento do acordo pela Boeing.
A Boeing procurou mudar sua cultura. Sob intensa pressão por questões de segurança, David Calhoun deixou o cargo de CEO em agosto. Desde janeiro, 70 mil funcionários da Boeing participaram de reuniões para discutir formas de melhorar a segurança.
Inspeção
O Ministério dos Transportes da Coreia do Sul afirmou nesta segunda-feira, 30, que planeja inspecionar as 101 aeronaves Boeing 737-800 operadas pelas companhias aéreas do país por questões de segurança, após o acidente aéreo que matou 179 pessoas na cidade de Muan.
Os padrões de segurança da Jeju Air, responsável por operar 39 desses aviões, também serão revisados e, segundo o funcionário do ministério, Joo Jong-wan, representantes do Conselho Nacional de Segurança nos Transportes dos Estados Unidos e da Boeing participarão das investigações.
O desastre com o avião da Jeju Air levantou preocupações de como seria a eficácia do governo do país, que passa por uma crise política desde a imposição de lei marcial pelo então presidente, Yoon Suk Yeol.
Hoje, o presidente em exercício, Choi Sang-mok, realizou uma reunião de força-tarefa sobre o acidente e instruiu as autoridades a conduzir uma revisão de emergência dos sistemas de operação de aeronaves do país.
“Uma resposta responsável seria renovar os sistemas de segurança da aviação como um todo para evitar a recorrência de incidentes semelhantes e construir uma República da Coreia do Sul mais segura”, defendeu.
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