BRASÍLIA - O governo pretende tirar do papel ainda neste ano o programa que dá aos alunos de baixa renda acesso a uma poupança quando concluírem o ensino médio. Segundo apurou o Estadão, a avaliação preliminar é de que o orçamento poderá chegar a R$ 4 bilhões por ano, a depender do alcance do benefício e das restrições fiscais. A ideia inicial da medida, que tem o objetivo de combater o abandono escolar, é garantir cerca de R$ 1 mil por ano aos estudantes, mas o valor ainda está sob análise.
O Palácio do Planalto avalia o melhor momento para enviar o projeto de lei ao Congresso, mas o benefício é considerado de baixo custo para os efeitos já testados em experiências em outros países e também em alguns locais do Brasil, como o Estado do Rio de Janeiro.
O programa é uma promessa de campanha eleitoral, após o presidente Luiz Inácio Lula da Silva encampar o compromisso da então candidata e hoje ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, em troca de apoio no segundo turno das eleições presidenciais. Na época, Tebet nomeou o programa de “Poupança Jovem” e se inspirou no “Projeto de Lei de Responsabilidade Social”, proposto pelo então senador Tasso Jereissati (PSDB-CE).
O benefício, segundo fontes, será concedido a estudantes de escolas públicas inseridos no Cadastro Único (CadÚnico). O foco deve ser nos três anos do ensino médio, mas há uma discussão a respeito da inserção do 9º ano do ensino fundamental, já que a passagem de uma etapa para outra é um dos momentos críticos da evasão escolar.
O custo de R$ 4 bilhões só seria alcançado num desenho completo, no qual o valor de R$ 1 mil fosse oferecido aos alunos desses quatro anos: do 9º do fundamental ao terceiro do médio. O governo, porém, avalia uma implementação em fases, com valor e escopo reduzidos para se ajustar às restrições orçamentárias atuais.
O desenho do projeto está em fase avançada e vem sendo liderado por três ministérios: Educação, Casa Civil e Fazenda. A área econômica está envolvida para análise do custo fiscal e do impacto em produtividade, desigualdade e crescimento econômico. A educação é um assunto caro para Fernando Haddad, que já foi ministro da área nos governos Lula 1 e 2.
Poupança com aportes anuais
Fontes a par do assunto afirmam que a proposta é criar uma conta poupança no nome do estudante, a qual receberá aportes anuais da União, sempre no início do período letivo. Ao final do ano, caso tenha comparecido às aulas e realizado a rematrícula, o jovem ganha o direito de sacar uma parte do dinheiro, enquanto a outra fica retida.
Novos depósitos serão realizados nos anos seguintes, com a mesma sistemática, até a conclusão do ensino médio - quando o estudante terá acesso à maior fatia dos aportes do governo e poderá usá-la para começar a pagar a faculdade, mudar de cidade ou iniciar um negócio. Ou seja, o aluno terá liberdade para escolher como gastar o dinheiro, sem a necessidade de prestação de contas.
Outro desenho avaliado prevê que os pagamentos sejam progressivos, ou seja, que os valores dos depósitos aumentem à medida que o aluno se aproxima da conclusão do ensino médio. Também discute-se a possibilidade de que os depósitos sejam feitos mensalmente, ainda que o estudante só possa sacar ao final de cada ano.
Além do foco social e econômico, o governo quer aproveitar o programa para estimular a educação financeira nos alunos de baixa renda.
A ideia é permitir que eles apliquem o valor retido nas poupanças em títulos do Tesouro Direto, que podem ser atrelados à Selic (a taxa básica de juros da economia) ou à inflação. O governo lançou, por exemplo, o Educa+, cujo objetivo é criar uma renda complementar que ajude a bancar os estudos.
Impacto no PIB
O programa busca atacar um dos maiores problemas do sistema educacional no Brasil, que é o abandono da escola.
O economista Ricardo Paes de Barros, em estudo do Insper, calculou que o Brasil perde por ano com a evasão escolar 3,3% do Produto Interno Bruto (PIB), o que equivale a dois terços do gasto anual com a educação básica.
O levantamento alerta que, a cada ano, meio milhão de jovens passam à fase adulta sem concluir a educação básica - com consequências na empregabilidade, remuneração, longevidade e qualidade de vida.
Dados empíricos mostram, ainda, que a evasão escolar é inversamente proporcional à renda: quanto menor o rendimento familiar, maior a evasão.
Números compilados pela Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), apontam que apenas 46% dos jovens do quinto mais pobre da população concluem o ensino médio até os 24 anos. Entre os jovens do quinto mais rico, a taxa é de 94%, mais que o dobro.
No caso dos meninos, a saída do sistema educacional deve-se, principalmente, à necessidade de começar a trabalhar e contribuir com a renda da família. Já no caso das meninas, a vida escolar, muitas vezes, é interrompida pela gravidez precoce.
Os dados mais recentes do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), referentes a 2020, mostram que a taxa de evasão no ensino médio era de 6,9%. O porcentual varia de acordo com a série escolar analisada. No primeiro ano o índice chega a seu maior nível, com 8,2% dos estudantes deixando a escola. No segundo ano, a taxa cai para 7,9%. E, no terceiro, para 4,1%.
Durante a pandemia, alguns Estados do País, preocupados com a possibilidade de evasão, lançaram iniciativas próprias para reter os estudantes na escola, foi o caso de Alagoas, Bahia e São Paulo, entre outros. As iniciativas também se concentravam na disponibilização de incentivos financeiros aos estudantes.
Questionado sobre o programa, o Ministério da Fazenda sugeriu que a reportagem procurasse o Ministério da Educação. Já o MEC, afirmou ao Estadão que finaliza últimos ajustes para lançar o programa em breve.
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