RIO - A Embraer vislumbra expansão sólida do seu braço de inovação, a Embraer-X, com a chegada do seu “carro voador” ao mercado, previsto para o fim de 2026 ou início de 2027, segundo o presidente da unidade, Daniel Moczydlower. Nesse meio tempo, as encomendas do eVTOL, uma aeronave elétrica de decolagem e aterrissagem vertical, devem aumentar.
Hoje, segundo Moczydlower, já são 2.770 veículos do tipo encomendados por meio de cartas de intenção de 26 clientes espalhados em 12 países, o que significa receita de US$ 8,3 bilhões a ser realizada.
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O executivo fez palestra rápida nesta terça-feira, 2, no Web Summit Rio, evento de tecnologia e inovação que acontece essa semana na capital fluminense. Na saída, ele falou a jornalistas sobre a estratégia da Embraer-X para os próximos anos, que tem o eVTOL como um dos elementos centrais.
Segundo Moczydlower, a Embraer desenvolve o veículo, mas, diferente do que faz no mercado de aviação, deve fornecer e manter participação relevante em sua aplicação para um serviço de “mobilidade aérea urbana”, ao menos em uma primeira fase. A ideia, disse mais de uma vez, não será competir com a aviação comercial, mas complementá-la no raio de grandes cidades marcadas por problemas de tráfego.
“Por ser um negócio disruptivo, no Brasil e nos EUA, vamos de alguma forma participar da operação. Vai haver uma parceria mais forte com o cliente, porque teremos um know how operacional que vai faltar para quem vai operar [o serviço]”, disse. Em sua visão, empresas de aplicativos de transporte terão grande interesse na aplicação do eVTOL, o que estaria claro, inclusive pelas conversas que a Embraer mantém com empresas do setor no sudeste asiático.
“Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte são possibilidades claras para nós no Brasil”, disse o executivo. Ele se reuniu hoje com o prefeito do Rio, Eduardo Paes (PSD), a quem descreveu como empolgado para ter a cidade como palco de lançamento da máquina. Esse seria, inclusive, um passo natural, após estudos empreendidos em dezembro de 2020, quando a Embraer propôs e teve aprovada pela Aeronáutica uma rota inédita ligando um ponto na Barra da Tijuca, bairro na zona Oeste da cidade, ao Aeroporto Internacional do Galeão, na zona Norte.
Esse tipo de trajeto, entre pontos específicos da cidade e aeroportos, devem estar na gênese do novo negócio, disse Moczydlower. Os pontos de decolagem, chamados “vertiportos”, devem ser providos de carregadores elétricos e uma possibilidade inicial para sua criação está em estacionamentos de shoppings centers, disse o executivo.
Foco na classe média
O mais provável até o momento, disse o executivo, é a venda de trajetos avulsos para viagens compartilhadas por até quatro pessoas, acompanhadas de um piloto que, em uma segunda etapa do negócio, em até 10 anos, pode ser dispensado graças ao grau de tecnologia que se pretende embarcar no eVTOL.
O objetivo, segundo Moczydlower, é mirar a classe média em vez de restringir o serviço a um público de executivos ou às classes mais altas. A Embraer-X ainda estuda um preço acessível para os trajetos, o que, até o momento, pode ficar entre US$ 50 e US$ 100. “Não chega a ser barato para o mercado brasileiro, mas também não fica tão distante”, afirmou.
“Se essa massificação for alcançada, poderemos transportar 2 bilhões de passageiros por ano até 2035. Estamos falando de um novo mercado de US$ 1 trilhão”, definiu.
Movido a bateria, o veículo voador elétrico terá uma autonomia de 10 a 15 minutos, o que lhe permitirá percorrer distâncias entre 60 e 80 quilômetros sem dificuldade. Essa é a distância mais comum para demanda do eVTOL nas maiores cidades do planeta hoje, conforme estudo desenvolvido pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) para a Embraer.
O presidente da Embraer-X disse que em uma cidade do porte do Rio de Janeiro, a fabricante enxerga espaço para a operação simultânea de 200 a 300 eVTOLs, mas que isso deve ser alcançado gradativamente em função de uma curva de aprendizado que envolve fatores como seguranças da operação, acúmulo de dados sobre essa operação, investimentos em infraestrutura e redução da poluição sonora - um dos alvos de momento da Embraer.
Processo de inovação
Questionado sobre o processo de inovação por trás do projeto, ele disse que o eVTOL nasceu de forma incubada dentro da própria Embraer-X após o consenso de que mercados tradicionais estavam sendo reconfigurados por invenções disruptivas, no que citou a fabricante automotiva Tesla e a aeroespacial SpaceX. “Isso poderia acontecer conosco e resolvemos tomar a dianteira do processo de inovação, pensar em um novo produto, para um novo mercado, assumindo os riscos envolvidos”, disse.
Moczydlower definiu o grupo Embraer hoje como uma empresa “ambidestra”, que conduz em paralelo a cultura de uma empresa construída em torno do negócio de fabricação de aviões e a cultura de inovação.
No caso específico do eVTOL, o projeto da Embraer-X foi direto para um Ipo e está hoje listado na Bolsa de Nova York, contando com participação acionária de grandes empresas dos setores de aviação, como a United Airlines, mas também energia, infraestrutura, tecnologia e finanças.
Apesar desse caminho orgânico, Moczydlower disse que o investimento e aquisições de startups estão no radar. A estratégia é entrar com participação minoritária em fundos de venture capital, que hoje são quatro, sendo dois no Brasil e dois no Vale do Silício (EUA). Isso, porém, não é impeditivo para posições majoritárias, caso da Tempest, empresa de cibersegurança em que a Embraer começou a investir em 2017 e alcançou maioria acionária em 2020. “Não é o padrão, mas se a paixão for forte, pode dar em casamento”, disse o presidente da Embraer-X em referência à Tempest, que presta serviço para os grandes bancos do País e para a B3.
Com relação a fundos de venture capital, a investida mais recente da Embraer está sob administração da gestora MSW e também tem como cotistas a fabricante de baterias Moura e o Banco do Brasil, disse o executivo.
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