BRASÍLIA - O governo brasileiro concluiu os debates internos sobre a contraproposta a ser enviada à União Europeia, na negociação do acordo comercial do bloco com o Mercosul. Agora, os negociadores brasileiros aguardam apenas o aval do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para submeter aos países sócios do Mercosul - Argentina, Paraguai e Uruguai - sua proposta de resposta aos europeus.
Apesar do racha interno de visões sobre o tema, que opunha ministérios sobretudo em relação à necessidade de reabrir a discussão sobre compras governamentais, o texto base foi concluído em nível técnico, segundo o embaixador Philip Fox Gough, diretor do Departamento de Polícia Econômica, Financeira e de Serviços do Itamaraty. O documento vai incluir tanto a questão das compras públicas quanto as discussões sobre normais e metas ambientais.
“Tivemos intensas negociações coordenadas pela Casa Civil nos últimos meses, com vários ministérios e órgãos do governo, sobre esse assunto. Como resultado dessas discussões elaboramos uma sugestão brasileira de resposta aos europeus. Essa sugestão de resposta está pronta tecnicamente e a intenção é enviar esse documento nos próximos dias”, disse o embaixador Fox. “Nossa resposta tem foco muito forte no conceito de desenvolvimento sustentável. Vamos fazer diversas elaborações sobre isso e passar primeiro para os sócios do Mercosul e depois pra os europeus examinarem. Em Bruxelas serão feitos contatos e haverá um discussão sobre os próximos passo desses processo.”
Segundo o diplomata, o trabalho técnico foi concluído e após aval da Presidência o texto será enviado ao Mercosul “em curto prazo”. “Não temos controle sobre o processo, porque depende dos outros, mas nossa expectativa é que nas próximas semanas, poucas, a gente possa passar esse documento para o lado europeu”, ponderou o embaixador. “As compras governamentais são um elemento importante do pacote enviado.”
O embaixador não detalhou o conteúdo da resposta, mas disse que uma das áreas consideradas foram as compras em insumos de saúde do SUS, que precisa de proteção da indústria nacional, conforme o governo, a exemplo das necessidades de estabelecer uma cadeia produtiva efetiva no País, exposta durante a pandemia da covid-19.
Os demais países sul-americanos já possuem uma ideia geral dos temas que a resposta costurada pelo Brasil aborda, mas não o texto completo. O embaixador afirma que as conversas serão retomadas no âmbito do Mercosul, imediatamente após a remessa do documento. Ele afirmou nesta quinta-feira, dia 13, esperar que uma posição comum do Mercosul possa ser entregue a Bruxelas dentro algumas semanas.
Caso o conteúdo seja enviado nas próximas horas ou dias, poderá haver uma primeira conversa mais breve, sem entrar em detalhes, já em Bruxelas, além da combinação de prazos para chegar a um documento de consenso.
Embora a negociação do Acordo Mercosul-UE esteja presente, não deverá avançar na próxima reunião de cúpula entre chefes de Estado e de governo da Comunidade de Países Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) e a União Europeia, da qual Lula participa nos próximos dias 17 e 18 de julho. Isso porque não haverá tempo hábil, segundo diplomatas brasileiros, de os sócios do Mercosul concluírem a análise e formalizarem suas propostas para adoção de um texto consensual.
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Agora, os negociadores brasileiros aguardam apenas o aval do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para submeter aos países sócios do Mercosul
O Brasil ocupa a presidência temporária do Mercosul e vai liderar as negociações do acordo, travadas há quatro anos, enquanto a Espanha assumiu a posição na União Europeia.
Em vez de uma resposta comentada, alterando o texto focado em clima e meio ambiente entregue em março pelos europeus, o Brasil optou por colocar outro documento sobre a mesa. Esse novo texto inclui as questões ambientais, mas envolve também a necessidade de se renegociar a maior abertura aos estrangeiros para participarem de licitações públicas federais.
Divisão do Acordo
O embaixador da União Europeia em Brasília, Ignácio Ybáñez, disse que ainda existe a opção de dividir o acordo em duas partes para votação mais célere. Segundo ele, trata-se de uma técnica legislativa, com componente e justificativa política. O Parlamento Europeu e o Conselho Europeu têm competência exclusiva sobre assuntos comerciais. Portanto, poderiam aprovar essa parte do acordo sem a necessidade de submetê-la aos parlamentos nacionais dos 27 países. Isso não pode ser feito com os termos políticos do acordo.
Segundo o embaixador, essa divisão - o split, no jargão diplomático - não está necessariamente ligada à aceitação ou não da contraproposta brasileira e do Mercosul, mas pode ser um caminho para avançar os capítulos comerciais do acordo entre os blocos. “Podemos decidir ao fim ir para uma divisão, mas buscaríamos, mantendo a unidade do acordo, o que é muito importante porque ele é comercial e político também, mas deixar que a parte comercial possa ser adotada e entre em vigor. Mas precisaríamos de um acordo entre as partes”, disse o embaixador.
Janela e limite
Segundo Ybáñez, a União Europeia tem a vontade política de finalizar a negociação até o fim do ano, sem colocar pressão de prazo, porque ocorreria a assinatura dos texto completo antes da eleição para formação do novo Parlamento Europeu, no início do ano que vem. Essa agenda eleitoral da UE, segundo ele, pode atrapalhar a dedicação que os parlamentares dão no momento ao tema. É a janela de oportunidade, com Brasil e Espanha na presidência temporária dos blocos até o fim de 2023.
“Aproveitemos esse tempo. Quanto mais tempo dermos aos negociadores, sempre melhor. Vamos receber a resposta do Mercosul com olhar aberto”, disse Ybáñez. “Queremos compreender as coisas que o Mercosul não gostou na nossa proposta e por isso estão apresentando uma alternativa. Temos esse limite, insisto muito nele, o conceito de não reabrir a negociação (de todo o acordo). Pensamos que isso complica de forma bem grave a negociação. É o limite que temos. Mas queremos ser flexíveis e buscar fórmulas, encontrar respostas aos pedidos de países do Mercosul.”
Segundo o embaixador, a mensagem da cúpula da UE é a flexibilidade para tentar encontrar um ponto comum, o quanto antes. E a reunião da Celac-UE será um momento para reforçar o desejo político de conclusão do acordo: “Buscamos nos dias 17 e 18 o compromisso político, dizer claramente que estamos todos engajados e usar o tempo que temos frente a nós e que vamos fazer todo o possível para chegar lá”.
O embaixador afirmou que as discussões sobre as exigências ambientais europeias demoraram - a resposta do Mercosul ainda não chegou, quatro meses depois de a proposta ter sido enviada. Ele ressaltou que a equipe negociadora europeia segue disponível e gostaria de ter mais tempo para discutir. Porém, segundo o diplomata, não se pode “perder o norte”- é preciso garantir que o conjunto do acordo seja aprovado e assinado.
“O acordo entre Mercosul e União Europeia está pendente há tempo demais e precisamos de um esforço. A cúpula de Bruxelas não é o foro para se retomar as negociações propriamente ditas, mas gostaríamos muito que nela se possa reconfirmar o impulso político a favor do acordo”, disse Ybáñez.
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