A familiaridade do Brasil com biocombustíveis faz com que o País seja cotado para ser um polo produtivo relevante de SAF, combustível sustentável de aviação, feito de óleos vegetais ou animais. Apesar dos projetos brasileiros ainda estarem em fase inicial, a expectativa é que atinjam um pico a partir do final desta década, segundo o diretor-executivo de estratégia e operações comerciais da Airbus na América Latina, Guillaume Gressin.
O assunto será um dos temas do evento “Neoindustrialização apoiada pela transição energética - Como unir a política industrial e a política de sustentabilidade”, uma realização do Estadão, com apoio institucional da Fiesp, do Ciesp, da Firjan e da CNI. O evento ocorre sexta-feira, 20, no salão nobre da Fiesp. As inscrições podem ser feitas aqui.
Para o executivo da Airbus, entre os principais estímulos para acelerar a produção de SAF no Brasil está a legislação voltada para o tema. No início deste mês, o Congresso aprovou o projeto “combustível do futuro”, que prevê a criação de programas nacionais de SAF, além de diesel verde e biometano. O texto agora depende da sanção presidencial.
“Há interesse global em investir na produção de SAF no Brasil. Além de expertise, o principal motivo é o quadro regulatório, que traz muita confiança para os investidores”, afirma Gressin em entrevista ao Estadão/Broadcast. Ele explica que, por se tratarem de projetos bilionários, é importante ter regras claras para evitar ruídos em meio a mudanças políticas, já que o combustível tem certificações rigorosas.
Segundo o diretor da Airbus, mesmo antes da medida ser promulgada, o número de projetos relacionados ao combustível sustentável de aviação triplicou no País desde o início das discussões. “Embora a produção não seja uma realidade hoje, estamos confiantes de que se tornará muito em breve. Devemos começar a ver um pico produtivo no Brasil entre 2028 e 2030″, projeta.
Gressin avalia que, com a aprovação do combustível do futuro, o Brasil saiu na frente dos países vizinhos. Contudo, cita que Chile e Colômbia, por exemplo, também têm se mobilizado para estimular a produção de SAF. Ainda assim, a América Latina está distante do cenário visto na Europa e Estados Unidos, que já produzem o combustível.
Oferta x demanda
Com os projetos brasileiros ainda no papel, atender às determinações da legislação não será uma tarefa fácil para as aéreas. A regulação determina que as companhias precisarão incluir 1% de SAF nos tanques a partir de 2027. A proporção aumentará 1 ponto porcentual a cada ano, alcançando 10% de SAF na mistura do combustível em 2036.
Gressin espera que, até 2027, já existam iniciativas produtivas em andamento. No entanto, ressalta que o texto do Combustível do Futuro oferece alguma flexibilidade. Caso não haja a quantidade de SAF necessária disponível, a ideia inicial é que haja uma redução da emissão de carbono com outras alternativas. “Precisamos de demanda e também de oferta. Tudo está ligado. É uma situação de ovo e galinha. Se não fizermos nada, então nada se move”, afirma.
Leia também
O crescimento gradual da oferta deve ajudar a minimizar os custos, uma das principais preocupações em relação ao novo combustível, segundo o executivo. Contudo, ele pondera que ainda faltam dados concretos para avaliar, de fato, os impactos financeiros do uso do SAF.
“Há uma diferença de preço sim, porque é uma tecnologia nova e matérias-primas diferentes, mas ao invés de especular, precisamos ter os pés no chão e estudar”, afirma. De olho nisso, a Airbus trabalha em um estudo sobre o custo do SAF em parceria com a Latam e o Massachusetts Institute of Technology (MIT). A expectativa é que os resultados sejam divulgados em outubro.
Para além do SAF
A Associação Internacional de Transportes Aéreos (Iata, na sigla em inglês) projeta que 65% da meta de descarbonização até 2050, assinada em 2021, será obtida por meio do SAF. Apesar do combustível sustentável ser a principal aposta para descarbonizar a aviação, o setor não espera de braços cruzados pela escalada de produção.
“O SAF é a medida mais impactante, mas não é a única. Precisamos de uma combinação de iniciativas operacionais, tecnológicas e de design, por exemplo“, diz o diretor da Airbus, destacando que o novo combustível representa apenas 0,1% do querosene global ao redor do mundo atualmente.
Enquanto isso, as medidas auxiliares incluem a troca de aeronaves e medidas de eficiência, podendo eliminar 16% das emissões até 2050, segundo a Iata. O restante deve ser resolvido por meio de projetos ambientais, com 11% em captura e armazenamento de CO2 e 8% em compensação. Se os desafios forem superados, o setor aéreo será, sozinho, responsável pela redução de 2% da emissão de toda a atividade humana no planeta.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.