Nem só com alarde é feita a saída de investimentos do mercado brasileiro, como ocorreu com o anúncio do fechamento da fábrica da Ford em São Bernardo do Campo (SP), feito no mês passado. Uma fuga discreta, à francesa, tem ocorrido entre as marcas internacionais de luxo com operações no País.
Estima-se que o número de marcas estrangeiras do segmento tenha diminuído em 25% no Brasil nos últimos três anos – no auge, o número passou de uma centena. A despedida silenciosa é resumida pelo movimento da Versace, que funcionou normalmente até o último Natal. Depois da data, ela baixou as portas de sua última loja ainda em operação no Brasil, localizada no Shopping Iguatemi, em São Paulo, e não as levantou mais. Sua partida teve algo de emblemático não apenas pelo silêncio, mas também porque, em uma longevidade rara, a marca estava no Brasil havia cerca de duas décadas.
A despedida de marcas como Lanvin (roupas), Kate Spade (bolsas) e Vacheron Constantin (relógios) tem, claro, relação com as perdas causadas pelos anos de recessão ou crescimento fraco registrados a partir de 2014, mas não é só isso: boa parte das que deixaram o País são operações próprias dos grupos estrangeiros, que optaram por voo solo em vez de trabalharem com um parceiro local, modelo que era a regra até meados da década passada. Nem todos estavam preparados para esse movimento.
“No Brasil, com exceção de uma pequena parcela de consumidores argentinos e, mais recentemente, angolanos, as marcas de luxo vendem basicamente para brasileiros. Nós não somos como o México, que vende muito para americanos, e muito menos como os europeus, que vendem para gente do mundo todo, em particular os chineses”, diz Claudio Diniz, coordenador executivo no Brasil do Núcleo de Luxo da Université de Paris e da Université d’Angers. “Além da carga tributária, que é um dos principais problemas do setor, o mercado brasileiro tem características muito próprias, com as quais eles não estão habituados, como as compras parceladas ou as diferenças regionais. Vender luxo em São Paulo é completamente diferente de vender no Rio, em Brasília ou Curitiba.”
A retração do mercado de luxo brasileiro – pano de fundo da decisão do grupo suíço Richemont de encerrar ainda neste ano as operações no País das marcas de relojoaria IWC, Jaeger-LeCoultre, Panerai e Van Cleef, está na contramão do que ocorre no mundo. No fim do ano passado, a consultoria Bain & Company reportou um crescimento global de 5% da indústria em 2018, quando o faturamento chegou a € 1,2 trilhão.
Nas Américas, informa a consultoria, Canadá e México tiveram desempenho forte, “enquanto as incertezas políticas prejudicaram o desempenho do Brasil”, aponta a Bain. Em 2015, o Brasil já havia perdido para o México o primeiro lugar no ranking da indústria do luxo, segundo a consultoria Euromonitor – e não recuperou. Em 2016 e 2017, o setor encolheu 14,6% e 8,5%, respectivamente.
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