Caminhoneiro autônomo desde os 20 anos, Adeilton Batista da Silva perdeu vários contratos de entrega de carga por causa da elevada idade do seu caminhão fabricado em 1990. Adquirido há 6 anos, o veículo teve motor, bomba injetora e outras peças substituídas seis meses após a compra, o que exigiu “um gasto enorme”, conta ele.
Atualmente Silva, de 50 anos, só aceitava entregas em viagens de até 100 quilômetros com receio de ficar parado na estrada por causa de eventuais problemas. No mês passado, ele recebeu uma proposta de R$ 45 mil pelo veículo. Aceitou e agora pretende comprar um modelo 2001, com o qual poderá voltar a fazer viagens mais longas que costumam dar melhor retorno financeiro. Além disso, gastos com manutenção e combustível também devem diminuir.
“Praticamente estava pegando entregas só para a capital paulista ou Grande São Paulo”, afirma Silva, que mora em Guarulhos (SP). Ele negocia o novo caminhão com a proprietária da empresa para quem presta serviços de transporte de vários produtos, como alimentícios. “Será o caminhão mais novo que eu já tive.”
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“É um caminhão velho a menos nas ruas”, diz Gilson de Resende, de 49 anos, que faz entregas com caminhão desde 2004. Ele também vendeu seu veículo de 39 anos, e já adquiriu outro apenas quatro anos mais novo. Morador de Mogi das Cruzes (SP), ele diz que, se o governo “der outra oportunidade”, ele vai vender o caminhão atual mais à frente.
A compra dos caminhões foi feita pela Vamos, do grupo Simpar, que vai mandá-los para reciclagem junto com outros 98 veículos de mais de 20 anos que está adquirindo no mercado. Com a medida, a empresa, que atua na revenda e na locação de caminhões com idade média de 2 anos, terá direito a bônus que varia de R$ 33,6 mil a R$ 80,3 mil na compra de modelos zero, conforme prevê o programa de renovação da frota do governo federal.
O programa foi lançado pelo Ministério do Desenvolvimento Indústria Comércio e Serviços (Mdic) em 5 de junho e tem R$ 1 bilhão em recursos, sendo R$ 700 milhões para caminhões e R$ 300 milhões para ônibus. Segundo o Ministério, até o momento apenas R$ 100 milhões haviam sido requisitados pelas fabricantes de caminhões como bônus a serem repassados aos clientes que comprarem modelos zero.
Para os ônibus, foram R$ 150 milhões pedidos até o momento, e outros R$ 10 milhões aguardam aprovação do Mdic. Nesse segmento, os descontos na compra de modelos Euro 6, com a tecnologia mais avançada disponível no mercado, variam de R$ 33,6 mil a R$ 99,4 mil. O programa tem validade até início de outubro.
Segundo a área técnica do Mdic, a baixa procura até o momento é em razão de entraves relativos à quantidade e capacidade das recicladoras para receberem os veículos velhos. Também havia dificuldades para a baixa dos documentos pelos Detrans, mas na segunda-feira, 31, o Conselho Nacional de Trânsito (Contran) divulgou deliberação simplificando o processo.
“O Brasil tem uma frota de cerca de 3,5 milhões de caminhões em circulação, sendo que 40% dos veículos pertencem a autônomos e a maioria tem mais de 20 anos”, informa o CEO da Vamos, Gustavo Couto. Ele ressalta que a renovação da frota beneficia toda a sociedade, pois os veículos mais velhos poluem mais, gastam mais combustível, exigem mais gastos com manutenção e geram mais acidentes.
Os caminhões já adquiridos pela Vamos têm entre 28 e 53 anos, pelos quais foram pagos de R$ 30 mil a R$ 50 mil, informa Couto. A empresa precisa dar baixa dos registros nos órgãos de trânsito e depois enviá-los para desmanches cadastradas pelos Detrans. Esses, por sua vez, têm de entregar ao grupo um relatório da destinação correta de cada tipo de componente reaproveitado na reciclagem.
Com o “atestado de óbito” do caminhão em mãos, a Vamos poderá receber os bônus da montadora que fornecer o veículo novo. Segundo Couto, os veículos Euro 6 poluem 30% menos e consomem 30% menos combustível em relação a modelos na faixa de 20 anos.
“Não foi difícil encontrar os caminhões velhos para a compra”, diz o CEO da Vamos. “Focamos a busca em locais de aglomeração desse tipo de veículo, como portos de São Paulo e do Rio de Janeiro.” O caminhão de 53 anos, um modelo Scania, por exemplo, operava no Porto de Santos no transporte interno de mercadorias entre os armazéns.
A Vamos já tinha feito, por iniciativa própria, um programa de renovação há pouco mais de um ano com a aquisição de 50 caminhões velhos para testar o mercado. Couto informa que a empresa acompanhou os caminhoneiros por algum tempo após a venda e constatou que 56% usaram o dinheiro recebido pelo velho como parte do pagamento de um mais novo. “Todos relataram que conseguiram aumentar a renda após a troca”, diz.
Ônibus
Outra grande aquisição, neste caso de ônibus velhos, está sendo feita pela Suzantur, empresa que atua no transporte rodoviário em cidades do ABC paulista e no rodoviário para a Itapemirim, com rotas para vários Estados.
Segundo Claudinei Brogliato, presidente da Suzantur, já foram adquiridos 40 ônibus com idades entre 20 e 25 anos que não tinham mais condições de transportar passageiros. Eles estavam encostados ou operando em pequenas cidades no interior de vários Estados, principalmente em transporte escolar e de trabalhadores. “Vamos chegar a 150 veículos que serão retirados de circulação”, informa o empresário.
O número equivale aos pedidos de ônibus novos já encaminhados às montadoras Mercedes-Benz (110), Scania (20) e Volvo (20). “Vários estavam com documentação vencida ou multas atrasadas e nós estamos providenciando a regularização para depois dar baixa e mandar para reciclagem”, informa Brogliato.
Menos poluentes
A Suzantur tem frota de 510 ônibus com idade média de cinco anos. Desse total, 90 serão substituídos após a compra do novo lote e 60 farão parte da ampliação da frota. “O programa é absolutamente necessário para renovar a frota e deveria ser permanente”, diz Brogliato.
De acordo com a Mercedes-Benz, um ônibus fabricado na década de 90 emite óxidos de nitrogênio equivalente a 55 veículos mais modernos. Já em material particulado, corresponde a 135 ônibus antigos.
O programa para renovação de caminhões e ônibus está no mesmo pacote que concedia descontos de R$ 2 mil a R$ 8 mil na compra de automóveis novos de até R$ 120 mil. A verba divulgada para os automóveis era de R$ 800 milhões, mas quase 20% ficaram nos cofres do governo para compensar a perda de arrecadação com o incentivo. A verba acabou em um mês com vendas de 125 mil automóveis.
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