WASHINGTON POST - Juan David Ramirez sabe que seu Nissan Juke SL 2012 está nas últimas. Mas comprar um carro novo na área de Orlando, hoje em dia, o faz lembrar de seu país natal, a Colômbia, onde apenas os ricos têm condições de comprar carros novos.
Ramirez, de 33 anos, e sua esposa Angelica Castro-Calle realmente querem um novo SUV, pequeno, mas com espaço para equipamentos de camping e de remo. Mas, apesar dos bons empregos no setor financeiro, o casal teria de desembolsar cerca de US$ 700 ao mês pelo financiamento dos modelos que estão procurando, na faixa dos US$ 35 mil.
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Por isso, o que eles planejam agora é consertar o Nissan, que está pago. Ramirez culpa as montadoras e as concessionárias por cobrarem tanto pelos carros novos. “Mas isso é algo com o qual eles provavelmente estão bem”, diz.
Mesmo com a redução da inflação e a escassez global de chips começando a diminuir, mais americanos estão sendo excluídos do mercado de carros novos no país, apontam dados da indústria e do governo. Os gastos com carros novos pelos 20% mais pobres da população caíram para o nível mais baixo em 11 anos. Enquanto isso, os gastos com carros novos dos 20% mais ricos atingiram seu nível mais alto registrado desde 1984, segundo os dados mais recentes da Pesquisa de Despesas do Consumidor de 2021.
“Os veículos novos talvez nunca tenham sido um produto comum nos Estados Unidos”, disse Charles Chesbrough, economista sênior da Cox Automotive, em uma conferência automotiva no início deste ano. “Queremos acreditar que eram, mas provavelmente não são há muito tempo. E, certamente, são ainda menos hoje.”
Os problemas que empurram os carros novos para fora do alcance dos mais pobres são duplos. Do lado da demanda, o aumento das taxas de juros tornou os empréstimos para carros muito mais caros — o pagamento mensal médio chegou a US$ 686, em meados de 2022, segundo dados da consultoria Edmunds. No mês passado, chegou a US$ 730.
Mas, mesmo que os compradores consigam obter uma taxa de juros decente, a oferta de carros disponíveis para compra tem se tornado muito mais cara, em parte porque os fabricantes têm canalizado recursos para versões aprimoradas de modelos caros e reduzindo opções mais baratas.
No final de abril, a General Motors anunciou que descartaria a produção de seu veículo elétrico mais vendido, o Chevy Bolt, eliminando um dos modelos mais acessíveis dos Estados Unidos desse segmento até o final do ano. É uma tendência de longa data: em 2017, por exemplo, havia 11 modelos disponíveis no mercado americano por menos de US$ 20 mil, de acordo com dados da Cox. No final de 2022, eram quatro. Este ano, até março, eram apenas dois.
O resultado é um fosso crescente entre os que podem comprar carros novos e os que não podem. O preço médio de um carro novo nos Estados Unidos atingiu US$ 48 mil em março, um aumento de 30% em relação a março de 2020, segundo a consultoria Kelley Blue Book.
As montadoras estão vendendo menos veículos novos nos EUA do que antes da pandemia — cerca de 13,9 milhões no ano passado, ante 17 milhões em 2019. Mas sua receita em 2022 ainda foi US$ 15 bilhões maior do que em 2019, porque estão vendendo produtos mais caros, de acordo com a Cox Automotive.
Uma grande razão pela qual os fabricantes de automóveis se apoiaram fortemente em veículos mais caros é a escassez global de chips. A escassez dos minúsculos componentes eletrônicos, causada por oscilações de oferta e demanda relacionadas à pandemia, forçou as montadoras a reduzir a produção, elevando os preços de veículos novos e usados. A escassez forçou as montadoras a racionar seus componentes, reservando-os para seus veículos mais lucrativos e sofisticados.
As montadoras também enfrentaram custos de produção mais altos, por conta do fechamento de fábricas na China durante a pandemia e da contínua escassez de mão de obra. Alguns desses problemas estão diminuindo. Mas os fabricantes começaram a manter mais peças em estoque para se proteger contra alguma escassez futura, uma estratégia que aumenta seus custos, disse Ambrose Conroy, especialista automotivo da consultoria Seraph.
Enquanto isso, a indústria automobilística está investindo muito dinheiro para reformar as fábricas para produzir veículos elétricos, uma grande despesa que também contribui para o aumento dos preços, acrescentou Conroy.
Essas mudanças aceleraram uma tendência de anos que já estava expulsando os carros acessíveis do mercado americano, à medida que as montadoras passaram a produzir mais SUVs e picapes, de margem mais alta. Por mais de uma década, as montadoras aumentaram a produção e a propaganda nos EUA de picapes e SUVs, cuja venda era mais lucrativa porque uma tarifa de importação de 25% protegia muitos deles da concorrência estrangeira. “Todo mundo parece ter sido condicionado a dirigir um SUV hoje em dia”, disse Conroy.
Entre os carros descontinuados no ano passado estava o Chevy Spark, o mais barato, custando a partir de US$ 13,6 mil. A Chevy vendeu mais de 24,4 mil desses carros em 2021 — número maior do que a maioria dos modelos de luxo pode reivindicar. Agora, os modelos mais baratos da Chevy custam mais de US$ 20 mil.
Ao mesmo tempo, o número de modelos vendidos por mais de US$ 60 mil continua aumentando: eram 61 em 2017, depois 76 em 2021, e 90 em 2022. Em março, a categoria cresceu para 94 modelos.
Em Austin, Johnny Loredo e sua esposa pagaram US$ 38 mil por uma Nissan Frontier há dois anos. “Fiquei em estado de choque... e era um modelo básico”, disse. Se não tivessem um Suburban usado para negociar, não teriam como pagar, disse ele.
“Acho que eles ultrapassaram o que as pessoas recebem”, disse Loredo, gerente de hotel. “Quando estamos fazendo aumentos aqui, estamos dando o aumento básico de dois, três, quatro por cento, mas isso não dá para um carro novo. É por isso que você está vendo muitos carros usados e as pessoas estão apenas consertando seus carros.”
Os fabricantes determinam quais carros são enviados para as concessionárias e normalmente não enviam novos estoques até que o estoque atual seja vendido. Mas os revendedores dizem que os fabricantes estão elevando os preços além do que os clientes podem pagar, em alguns casos deixando os revendedores presos com modelos que não podem vender.
No início desta primavera, Andrea White tinha 76 veículos novos no estacionamento de sua concessionária de carros em Annapolis, Maryland. Na época, ela não tinha compradores para o Jeep Wagoneer, de US$ 88 mil. O Grand Wagoneer, de US$ 115 mil, também não se mexeu. Muitos de seus carros custam entre US$ 50 mil e US$ 60 mil. “Estou tão desesperado para me desfazer dessas coisas caras, porque isso está nos prejudicando”, diz.
A incompatibilidade também decorre da resposta das montadoras à forma como os consumidores se comportaram no auge da pandemia, quando muitos americanos tinham mais dinheiro para gastar em mercadorias e encomendavam novos veículos com muitos recursos extras.
“Esses grandes Suburbans, Yukons e Expeditions estavam carregados. Então, quando você olha para alguns desses números, parte disso foi autoinfligido pelo consumidor”, disse Pete DeLongchamps, vice-presidente sênior do Group 1 Automotive, dono de 150 concessionárias de automóveis nos EUA, em uma recente conferência automotiva. “Mas acho que agora que os juros subiram e estamos vendo a alta das prestações mensais, há alguma moderação acontecendo.”
Funcionários da indústria automobilística discordam que estejam produzindo carros fora de alcance, acrescentando que os modelos à venda refletem os interesses dos clientes e a demanda por SUVs e picapes. Em uma declaração, John Bozzella, presidente e executivo-chefe da Alliance for Automotive Innovation, disse que “a beleza da indústria automobilística — e isso sempre foi verdade — é que há literalmente algo para todos”.
“Mais de 400 modelos de diferentes fabricantes, configurações, preços e agora uma escolha de motores — a combustão ou elétrico”, disse ele. “Por que há tantos modelos de picapes e veículos utilitários à venda? Porque os clientes realmente gostam dessa categoria de veículos.”
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