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Casa Civil, comandada pelo Centrão, passará a decidir sobre Orçamento; economistas veem piora

Equipe econômica minimiza mudança e fala que medida vai ajudar a 'dividir o desgaste' trazido por cortes de recursos

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BRASÍLIA - O presidente Jair Bolsonaro editou um decreto determinando que atos relacionados à gestão do Orçamento público terão de ter aval prévio da Casa Civil, em mais um movimento para empoderar o Centrão às vésperas da campanha eleitoral em que pretende se reeleger. O ato representa uma mudança em relação aos últimos 25 anos em que a equipe econômica sempre deu a última palavra em relação ao Orçamento. Segundo o Ministério da Economia, é a primeira vez que ocorre essa delegação à Casa Civil.

Jair Bolsonaro;Nos anos anteriores, a delegação de competência era feita exclusivamente ao Ministério da Economia, que tinha a palavra final sobre o assunto Foto: Dida Sampaio / Estadão

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O texto, publicado no Diário Oficial da União desta quinta-feira, 11, prevê que ações como remanejamento de verbas, alterações de despesas, abertura ou reabertura de créditos extraordinários e abertura de créditos especiais serão feitas pelo Ministério da Economia, mas condicionadas "à manifestação prévia favorável do Ministro de Estado Chefe da Casa Civil da Presidência da República". 

A mudança ocorre às vésperas da sanção do Orçamento de 2022, que ainda não foi feita. Pela legislação, o presidente tem até o dia 21 para sancionar o texto. O Orçamento 2022 teve receitas superestimadas. Com isso, o Ministério da Economia terá que "tesourar" gastos e remanejar recursos.  A inclusão da Casa Civil, chefiada pelo ministro Ciro Nogueira (PP), do Centrão, vem em um momento em que há grande disputa por recursos, com Guedes tentando manter o “cofre fechado” de um lado e a ala política defendendo mais gastos.

Além disso, coincide com uma menor transparência no uso de emendas parlamentares, como revelado pelo Estadão/Broadcast, em esquemas como o orçamento secreto - que destinou bilhões de reais de emendas de relator que foram divididas como forma de angariar apoio político no Congresso Nacional - e o “cheque em branco” - transferências especiais feitas com emendas parlamentares que vão para Estados e municípios sem destinação pré-definida e sem fiscalização. 

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Palavra final

O consultor de Orçamentos da Câmara Ricardo Volpe explicou que ao menos desde 1996, a palavra final da execução orçamentária era do Ministério da Economia. Ele explicou que, antes disso, houve momentos nos quais a palavra final pertencia à Presidência da República, como durante a Ditadura Militar, antes da criação do Ministério do Planejamento. Posteriormente, de 1992 a 1996, a palavra final também foi do Palácio do Planalto, já que a Secretaria de Orçamento ficou vinculada à Presidência nesse período

A procuradora do Ministério Público de Contas de São Paulo, Élida Graziane, diz que a submissão dos atos do Ministério da Economia à avaliação política da Casa Civil "politiza" ainda mais o debate orçamentário. Para ela, não necessariamente haverá prejuízos à gestão da contas públicas, mas "efetivamente reduz o poder do Ministério da Economia". "O contexto parece ser de fortalecimento da agenda de curto prazo eleitoral. Se somarmos essa subordinação decisória em matéria orçamentária ao fato de que o Congresso reduziu à metade considerável volume de verbas do Ministério da Economia, percebemos a perda real de poder dessa pasta na definição dos rumos do Orçamento".

Para o coordenador do Observatório de Política Fiscal do FGV/IBRE, Manoel Carlos Pires, o decreto põe mais peso na Casa Civil para decidir os gastos e, assim, a política terá mais peso na execução orçamentária. "Normalmente, a alocação de recursos envolvia um acordo entre a economia e a política. Agora, a instituição política está acima das orçamentárias", considerou.

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De acordo com ele, o texto de hoje reflete que o equilíbrio político está cada vez maior, demonstrado nas emendas parlamentares, quando comparado aos demais gastos de interesse do governo, que vem sendo comprimidos. "Nos últimos anos, com as despesas discricionárias se reduzindo bastante, há um vácuo para o Congresso ocupar o espaço e decidir ainda mais sobre os gastos públicos."

Na visão do economista Leonardo Ribeiro, analista do Senado e ex-servidor da Secretaria de Orçamento Federal (SOF), o texto demonstra que "claramente há uma insatisfação em relação ao poder duplo do Ministério da Economia, de concentrar tesouro e planejamento".

Ele destaca que, até então, na Junta de Execução Orçamentária, eram Fazenda, Planejamento e Casa Civil decidindo, mas o Ministério da Economia tinha um voto que representava dois, tendo em vista que concentrava Fazenda e Planejamento. "A estrutura causava um certo desequilíbrio. Então surge esse decreto, com objetivo de reduzir o poder da Economia", avaliou Ribeiro.

"Do ponto de vista econômico, dar força para o Centrão escolher como gastar em um ano eleitoral é o pior que pode existir", diz o economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale. "Isso vai piorar a qualidade do gasto público. É uma volta ao passado, quando existia um gerenciamento muito político da esfera fiscal, e que estamos vendo se alastrar com muita intensidade agora." Para Vale, a ação marca uma nova rodada de concessões de Bolsonaro ao bloco do Centrão, em uma tentativa de afastar o conjunto dos partidos da esfera de influência do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que tem aparecido com mais força nas pesquisas de intenção de voto. "Isso é tão ruim quanto têm sido as outras coisas, é a consolidação da deterioração do marco fiscal do País, que vem sendo construída a quatro mãos pelo Planalto e pelo Congresso", afirma o economista. "O principal problema é a sinalização que se dá para a frente, é como desmontar isso depois de ser integrada essa disfuncionalidade. Isso é uma bomba relógio que o governo está construindo a quatro mãos com o Congresso, e que tende a estourar nos próximos anos."

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Economia minimiza e fala em 'dividir desgaste'

Questionado, o Ministério da Economia disse que a medida não se configura perda de autonomia da pasta e resulta de um consenso entre os ministérios envolvidos, "visando melhorar a coordenação para o alcance dos objetivos e prioridades do governo". "Destaque-se que a Casa Civil e o Ministério da Economia integram a Junta de Execução Orçamentária (JEO), que é a instância em que as decisões relevantes com relação à matéria orçamentária são tomadas", diz a nota. Entretanto, o ministério confirmou que é a primeira vez que ocorre essa delegação à Casa Civil. 

Fontes da equipe econômica ouvidas pelo Estadão/Broadcast também minimizaram a perda de poder com a decisão de Bolsonaro de dar a palavra final sobre a execução orçamentária para a Casa Civil e avaliaram que medida vai ajudar a "dividir o desgaste" trazido por cortes de recursos. De acordo com essas fontes, o assunto foi debatido com a pasta e a ideia é que a Casa Civil fique responsável pelos acordos políticos que são feitos no Congresso Nacional e que "não cabem no Orçamento".

Integrantes da Economia disseram que o decreto foi feito conjuntamente com a Casa Civil. Uma fonte reclamou que tanto a pasta de Paulo Guedes quanto a Casa Civil são "dribladas" por outros ministros, que vão diretamente ao relator do Orçamento e a outros parlamentares e fazem acordos para despesas que extrapolam os recursos previstos. A avaliação de uma fonte é que, ao ter que cortar despesas, o desgaste ficava apenas com a Economia, e agora será "dividido" com a Casa Civil, que se responsabilizará pelos acordos políticos.

Apesar de o núcleo político - que pressiona por mais gastos - ter mais poder, outra fonte da Economia disse que isso não deverá contribuir para aumento de despesas. Isso porque qualquer gasto só pode ser feito com a indicação de receita correspondente e tem que caber no teto de gastos - que já está apertado. A avaliação é que essas regras fiscais manterão o Orçamento sob controle e impedirão o avanço das despesas. /COLABOROU CÍCERO COTRIM

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